Para um conceito sociológico de alienação política
Simon Schwartzman
Trabalho de Curso de Sociologia e Política - Faculdade
de Ciências Econômicas da UMG, 1961
Sumário
Introdução 1
1ª Parte - Conceito de Alienação
I - A alienação do Espírito (Hegel)
II - A alienação da consciência
III - A inversão marxista
IV - conceito sociológico ou filosófico?
V - Conceito Psicológico
2ª parte: alienação política - o coronelismo
I - Estado político e alienação
II - Alienação política: coronelismo
III - O coronelismo e o poder
IV - Manipulação política do coronelismo
3ª Parte - coronelismo e alienação
I - alienação em Oliveira Viana
II - Coronelismo e subdesenvolvimento
III - desenvolvimento econômico e democracia
IV - perspectivas políticas do desenvolvimento econômico no
Brasil
V - alteração do processo de manipulação política e alienação
4ª Parte: conclusões metodológicas
I - alienação e totalidade
II - categoria de negação: a dialética
III - experimentação e previsibilidade
IV - uma ciência radical
V - determinismo e explicação
VI - normal e patológico
Notas
Para um conceito sociológico de
alienação política
Introdução
A importância do conceito de alienação, objeto de grandes debates contemporaneamente,
prende-se a que sua efetiva incorporação à ciência social implicaria toda uma
reformulação de sua metodologia, como de seu alcance. A delimitação das fronteiras
entre o conhecimento "puro" e a "escatologia", o problema
do normal e do anormal, a efetiva caracterização da ciência humana como engajada,
a natureza de seu objeto, etc., tomam sentido na medida em que um tratamento
adequado seja dado a esta categoria.
Além do mais, a preocupação com a categoria de alienação se vincula a uma retomada
da problemática marxista, da qual grandes virtualidades estiveram por longe
tempo inexploradas, pela forte coloração partidária a que foram submetidos os
debates a seu respeito. Não pretendemos, como se evidenciará durante o trabalho,
reduzir o marxismo às dimensões de uma ciência "neutra", mas acreditamos
que isso nada tenha a haver com sua vinculação a quaisquer organizações politico-partidárias
existentes, que podem pretender utiliza-lo, mas nunca seu monopólio e o monopólio
de sua verdade. É dentro desta perspectiva - que poderá devolver ao marxismo
toda sua potencialidade de pensamento científico e revolucionário - que julgamos
importante, a' luz das modernas aquisições da sociologia. um reexame e uma explicitação
de seus fundamentos e metodologia, que possa contribuir para a sistematização
de uma ciência social efetivamente radical, no sentido de humana.
O objetivo deste trabalho, limitado, é testar, diante de um problema concreto,
a possibilidade de utilização do conceito de alienação, a partir de perspectivas
desenvolvidas por vários autores. Partimos do plano mais geral, a idéia de alienação
em Hegel, que particularizamos até ao conceito de alienação politica, já em
Marx. Procuramos aplica'-lo a uma realidade Política específica e, a partir
dai, voltamos às generalizações que parecem se impor. É um trabalho experimental,
objetivando sair do plano meramente especulativo para o empírico, mas seu objetivo
não reside no conteúdo do objeto analisado, e sim nas perspectivas da metodologia
utilizada. Por isso, e também pelas limitações materiais, suas fontes são sempre
secundárias, baseando-se em análises concretas que o roteiro metodológico nos
fez interligar. Acreditamos que, se algum mérito tem, reside exatamente nesta
interligação de diversos problemas, desde o coronelismo até o subdesenvolvimento,
englobados em uma perspectiva que, exatamente por conseguir ìnterligá-los lógica
e necessariamente, parece se impor. O que dará validade, também, às conclusões
metodológicas finais.
Belo Horizonte, 7 de novembro de 1961
1ª Parte - Conceito de Alienação
I - A alienação do Espírito (Hegel)
O conceito de "alienação" corresponde, em Hegel(1), em sua forma mais geral, ao processo pelo qual
o Espírito se projeta para fora de si para, em seguida, por etapas sucessivas,
retomar, no absoluto, a identidade consigo mesmo. A alienação corresponde ao
segundo termo da tríade dialética em que o Espírito se projeta para fora de
si mesmo como natureza, toda sua evolução fenomenológica consistindo no processo
de negação da negação, da reassunção final da identidade do "em si"
é do "por si", que se realiza através das várias etapas da história
humana.
Na "Fenomenologia", a alienação surge para a consciência como sua
dimensão essencial quando, para atingir a consciência de si, exige o reconhecimento
de si pelo outro. A dialética de senhor e do escravo descreve o processo pele
qual a luta das consciências polo reconhecimento mútuo conduz 'a dominação de
uma por outra. O senhor, que para obter o reconhecimento de si pelo outro arrisca
a vida, adquire a consciência de si como ser humano através do escravo que domina.
O escravo, que teme a morte, realiza a mediação entre o senhor e o mundo, e
a mediação do senhor consigo mesmo. A superioridade do escravo ante o senhor
reside em primeiro lugar em que o escravo experimenta o medo, e como tal, em
todo o seu ser, a dimensão da negatividade que, realizando a "fluidificação
dê toda subsistência", forma dentro de si mesmo o puro ser-por-si(2);
ou seja, dentro de uma linguagem não-hegeliana, sente a possibilidade especificamente
humana de transcendência. Em segundo lugar o escravo trabalha para o senhor,
e pelo trabalho adquire a cultura que só pertence ao senhor de forma mediatizada,
mas pertence ao escravo de forma imediata e definitiva. Pela potência da negatividade
e a cultura que lhe traz o trabalho, o escravo percebe sua possibilidade de
ser livre, de atingir a liberdade que reside em ordenar sua existência a partir
da idéia que faça de si mesmo.
Sem condições de efetivar esta liberdade que sabe possuidora, a consciência
do escravo se transforma em consciência infeliz, que busca a liberdade dentro
de si mesma, sem efetivá-la concretamente. Torna-se estóica, cética, e finalmente
religiosa, projetando para fora de si a liberdade que sabe possuir mas não assume.
Pela religião, a consciência infeliz projeta no deus sua liberdade, e consola-se
com a esperança da felicidade em outra vida.
II - A alienação da consciência
A dialética do senhor e do escravo vai conduzir à consciência infeliz que,
ao projetar fora de si parte de seu eu, surge como consciência alienada. Não
é agora o Espírito que se aliena na natureza, mas especificamente a alienação
que se dá na consciência do sujeito. Esta análise hegeliana da consciência infeliz
de certa forma ganha autonomia em relação à totalidade do sistema, de forma
tal que será retomada por Marx e pelo existencialismo. É uma dialética que busca
atingir, conforme a perspectiva de Hyppolite, uma dimensão ontológica, como
fenomenologia de um problema universal "que é o da consciência de si humana
que, incapaz de se pensar como um Cogito separado, não se encontra senão no
mundo que edifica, nos outros eu que ela reconhece ou em que, por vezes, se
desconhece"(3).
Mas a ontologia hegeliana não admite esta limitação à abstração genérica, exigindo
uma dimensão concreta. No Mundo ético da Cidade Grega, o indivíduo é confundido
com a coletividade, e assim é livre e universal de forma imediata, sem a consciência
de sua individualidade como "em si". À dissolução da Cidade Grega
corresponde a cisão entre o eu e sua essência imediata, e é ai então que se
opera a alienação que coloca, de um lado, a sociedade e a cultura como exterior
ao eu, e de outro o eu como um "em si" que inicia a dialética histórica
da desalienação.
Separado de si mesmo, e separado do outro, separado do mundo humano da cultura,
o Espirito, a consciência atravessa as fases de estoicismo, ceticismo e cristianismo
no Império Romano, projeta-se em uma série de essências objetivadas, o Poder
do Estado, a riqueza, procura superar a alienação de forma abstrata, pela fé
e pela intelecção, sem entretanto consegui-lo. No fim da história o Espírito
se reconcilia consigo mesmo no Absoluto, e o ciclo recomeça novamente.
Importa-nos ressaltar que a alienação, correspondendo no sistema de Hegel à
objetivação do Espírito, surge na consciência infeliz como alienação da consciência,
que se manifesta historicamente, e não mais do Espírito. Isto vai permitir aos
sucessores dê Hegel despir a categoria de sua dimensão idealista e atribuir-lhe
um porte existencial, ligando-a à natureza essencial da consciência intencional,
ou histórica, ligando-a à concreção da sociedade burguesa, a qual o próprio
Hegel já profundamente analizara nesta perspectiva(4).
Feuerbach, já nesta linha, coloca a alienação religiosa como uma projeção das
relações entre os homens para um mundo transnatural, a projeção do próprio homem
na figura do deus, construído à sua imagem e semelhança. Ao invés de um ato
de criação e retomada do mundo, a alienação para Feuerbach é a perda do homem
de si mesmo, a perda da essência humana que, projetada no deus, torna o homem
estranho a si mesmo. Só o amor entre os homens seria capaz de devolver-lhes
a essência, trazendo para o seio dos homens a perfeição que fora alienada no
deus(5).
III - A inversão marxista
Enquanto para Hegel o Espírito se aliena objetivando-se na natureza em um ato
em que ele sai de si mesmo, para depois reassumir em si a natureza, para Marx
a alienação não consiste senão eu um processo de abstração que o homem realiza
a partir de suas determinações naturais(6)
Em si mesma, a objetivação não constitui uma alienação(7), a não ser quando ligada a um processo de abstração,
de perda do mundo conquistado, e assim de perda do próprio homem que se constitui
no diálogo com o mundo. Mas esta essência do homem não é algo abstrato, como
a entende Feuerbach. "Feuerbach resolve a essência religiosa na essência
humana. Mas a essência humana não é uma abstração inerente ao indivíduo tomado
isoladamente. Na realidade ela é o conjunto das relações sociais"(8)
Hegel teve o mérito de assinalar o caráter de alienação da abstração mas, colocando
a intuição como forma de superá-la(9), permanece ele mesmo abstrato, e assim alienado.
Se o homem não é "sujeito humano e natural provido de olhos, orelhas, etc.,
vivendo em sociedade, no mundo e na natureza(10),
também a manifestação de seu ser não pode ser humana. Hegel considera, efetivamente,
que o trabalho e o ato pelo qual o homem se produz a si mesmo, mas o faz "no
interior da abstração"(11).
Mas os sentimentos, as paixões, etc. do homem não são apenas determinações
antropológicas do espirito, mas também afirmações do ser natural do homem, para
o qual o objeto é sensível e determinado(12).
Assim o processo de objetivação e conseqüentemente de humanização se dá de forma
particular para cada existência particular, e não é senão na época da indústria
desenvolvida, ou seja, por intermédio da propriedade privada, que o ser ontológico
da paixão humana surge em sua totalidade, tanto quanto sua humanidade. A ciência
relativa ao homem será pois ela mesma um produto da manifestação prática do
homem por ele mesmo. Será então uma ciência total, por referir-se ao homem enquanto
capaz de universalidade; radical, tomando pela raiz o próprio homem; e moderna,
só tendo condições de aparecimento na sociedade industrial.
Em síntese, vê-se que e inversão marxista do conceito hegeliano de alienação
consiste, em primeiro lugar, em situá-lo no homem concreto e histórico, e não
no Espirito, caracterizando-a como uma perda da abstração que realiza. Em segundo
lugar, reside em considerar que a idéia de alienação só surge a partir da época
em que, através do desenvolvimento da indústria e da propriedade privada, o
homem se vê na qualidade de ser genérico que entretanto é alienado na particularização
pela propriedade privada. É o desenvolvimento da indústria e de sua expressão
racional, a economia política, que permite a Adam Smith reconhecer o trabalho
como a essência da riqueza de uma forma genérica, ainda que colocando a propriedade
privada, dimensão objetiva da riqueza, como essencial ao homem(13).
É o desenvolvimento do Estado político, fruto da sociedade burguesa, por sua
vez, que permite denunciar a alienação política ao Estado como processo de "oposição
abstrata refletida"(14). É a possibilidade de reassunção da essência
humana, feitichisada na mercadoria, pela supressão da propriedade privada, que
permite a critica teórica e prática da alienação religiosa(15)
e filosófica. É a época atual enfim, com todas estas perspectivas, que permite
vislumbrar o comunismo como volta "completa, consciente, realizada no interior
de toda a riqueza do desenvolvimento passado, do homem por si enquanto homem
social, quer dizer, enquanto homem humano"(16).
IV - conceito sociológico ou filosófico?
De inspiração visivelmente comum, atribui-se geralmente à concepção marxista
de alienação o mesmo sentido filosófico que em Hegel, o mesmo pressuposto metafísico
de uma natureza humana que se desenvolveria pela história através de um processo
determinado. Contra esta perspectiva, que conduziria a uma cristianização do
marxismo, insurge-se Claude Lefort(17), procurando para a categoria de alienação uma
fundamentação empírica
Enquanto a alienação para Hegel é um pressuposto filosófico - o que, projetado
em Marx, dá' ensejo a se falar de uma metafísica marxista -, Marx encontra a
alienação na própria realidade contemporânea; e é esta realidade que permite
a critica à alienação filosófica, a aplicação da categoria a períodos históricos
anteriores, e abre as portas à luta revolucionária pela desalienação. Existiria
então em K. Marx, distinto de Hegel, um conceito radicalmente novo de alienação,
que cumpre compreender. "É no quadro estrito da descrição sociológica que
se ressalta uma estrutura de alienação, ou ainda, é se situando no interior
da sociedade que devemos descobrir o fenômeno da alienação"(18).
Lefort vai buscar a raiz do conceito de alienação não na análise clássica do
feitichismo da mercadoria, como quer Lefebvre, mas na análise da própria sociedade
industrial, que ao mesmo tempo universaliza e particulariza o homem, ao mesmo
tempo estabelece a unidade de todos os atos produtivos - uma sociedade universal
- e é ao mesmo tempo o movimento pelo qual se constituem as esferas estanques
das atividades do trabalho(19). A alienação estaria não em uma "irrealidade"
do mundo das mercadorias, oposta à "realidade" do trabalho natural
- pois o real não pode ser nada além da que as relações sociais concretas entre
os homens -; mas na contradição entre a particularização e a universalidade,
que se expressaria em diversas formas, no dinheiro e na mercadoria como forma
geral da alienação na sociedade capitalista.
A questão sobre a origem sociológica ou metafísica do conceito marxista de
alienação pode ser considerada, ao menos para os nossos propósitos, como um
falso problema, se partirmos do fato de que o conceito de alienação como compreensível
em processo histórico é próprio da época moderna(20),
que vê com agudeza o homem buscar a universalidade que lhe é tão próxima e não
alcançá-la, lançado na particularidade a que o destina a sociedade da propriedade
privada. Mesmo Marx a deixa para traz, ao afirmar que "a querela sobre
a realidade ou não realidade do pensamento isolado da prática é uma questão
puramente escolástica"(21).
Partindo da existência efetiva do fenômeno da alienação, caracterizado como
uma cisão que, mercê das contradições da estrutura social capitalista, se opera
no interior do próprio homem, pela oposição entre uma possibilidade concreta
de generalidade e uma condição de particularidade, que se fixa em sucessivas
abstrações na incapacidade de resolvê-la efetivamente, cabe-nos averiguar até
que ponto esta categoria é passível de uma utilização científica, e o que isto
implica, prática e metodologicamente, para a ciência que a utiliza.
V - Conceito Psicológico
Determinada sociologicamente, como um dado da realidade histórica contemporânea,
a categoria da alienação admite, ademais, uma determinação de ordem microcósmica.
De fato, se a alienação socialmente é alienação do homem, cabe uma fenomenologia,
ou uma psicologia da alienação. Ainda que não enveredemos por este caminho,
é importante indicar que a alienação individual e grupal pode ressaltar da análise
minuciosa da quotidianeidade como indicador existencial de uma formação social
analisável a partir da categoria de alienação.
Neste sentido são importantes as indicações de Lefebvre, procurando determinar,
na quotidianeidade da vida humana, a presença de alienações. "A alienação
se descobre na vida de cada dia, na do proletário como na do pequeno burguês
ou dos capitalistas". Esta noção "permite descobrir como o homem (cada
homem) cede às ilusões e crê se encontrar e se possuir através delas, e quais
angústias ele inflige a si mesmo; ou como luta para trazer à luz o seu 'núcleo'
de realidade humana"(22). A determinação
da alienação na quotidianeidade se realiza através do conhecimento crítico da
vida quotidiana, em que se estabelece o contraste entre o que os homens são
e o que crêem ser, entre o que vivem e o que crêem viver(23)
. "Na vida social como na vida individual, o viver e o vivido não coincidem
". "Entre as pessoas e elas mesmas se intercalam imagens, 'modelos'
". "O conhecimento da vida tenta eliminar o que separa o viver do
vivido, tornando então consciente a vida. O que implica na superação dos dois
termos"(24).
Tão ou mais importante, igualmente, a sociologia do trabalho de Pierre Naville(25),
que vê no marxismo a busca dos fundamentos de uma crítica "que esteja inscrita
nas leis da evolução social". "Uma sociedade", prossegue, "um
mundo de trabalho que evoluem se criticam a si mesmos. Elucidar sua estrutura
funcional, é elucidar também o sentido no qual ela evolui, as contradições mais
profundas que encerra, a critica que é o inverso dela mesma(26).
Determinar a quotidianeidade da alienação, determinar a forma especifica que
esta alienação assume, determinar o sentido da critica imanente que a sociedade
realiza de si mesmo, eis a grande tarefa da sociologia.
2ª parte: alienação política - o coronelismo
I - Estado político e alienação
De uma forma sumária, a análise clássica marxista do estado político(27)
o coloca como aquele em que o poder essencialmente politico se destaca das demais
formas de poder como entidade autônoma, realizando uma democracia formal. É
uma categoria essencialmente ligada à sociedade burguesa.
Com efeito, o século contemporâneo é marcado pela ascensão das nassas populares
ao nível das posições de poder, das quais estivera afastado durante toda a história
das sociedades hierarquizadas, estamentais. Até o surgimento do estado liberal
burguês, a sociedade se via como todo hierárquico em que os estamentos superiores
eram considerados como naturalmente detentores do poder político, que se identificava
com o poder econômico e social. É com a Revolução Francesa que, pela primeira
vez, um setor da sociedade, o Terceiro Estado, recusa a se considerar como parte
de um todo, para reivindicar os seus direitos como toda a sociedade(28)
. É proclamada a igualdade universal.
O estado liberal não realiza, não obstante, a eliminação das distinções entre
grupos dominantes e dominados, mas apenas elimina a regulamentação jurídica
da dominação, deixando-a ao livre jogo dos interesses e forças particulares.
O estado liberal realiza a eliminação política das diferenças estamentais, mas
o faz em oposição à existência real destas diferenças, transformando-as em diferenças
de classe, de caráter econômico-social(29).
Ao declarar a igualdade de todos, desinteressando-se pelas diferenças de nascimento,
estado social, cultura, ocupação, etc, consideradas não-políticas, o estado
liberal deixa que estas diferenças atuem a seu modo, livres de qualquer regulamentação
que não sejam as do livre jogo de interesses. Longe de acabar com as diferenças
de fato, o estado político só existe sobre estas premissas, só se sente como
tal e só faz valer sua generalidade em contraposição a estes seus elementos(30).
O estado politico realiza desta forma a divisão do homem em duas partes, enquanto
indivíduo e enquanto cidadão. Se enquanto cidadão ele é chamado para as decisões
relativas ao poder, votar e ser eleito - e então se comportaria como membro
da coletividade, dentro das preocupações do bem comum -, enquanto indivíduo
ele se interessa apenas pela sua vida na sociedade civil, como consciência privada,
patrão ou operário, dentro de um campo que, conforme a ideologia do estado liberal,
é estranho à órbita política, que nele só intervém para garantir os"direitos
essenciais do homem", entre eles, principalmente, a propriedade privada.
Com esta garantia o estado se coloca, com seus instrumentos de coação, como
fiador das diferenças de fato.
Confrontada com o estado político, a vida política da sociedade feudal é vista
como sendo diretamente a própria vida privada, a detenção do poder politico
sendo simultânea à detenção do poder econômico e social. "Na Idade Média
a vida do povo e a vida do Estado são idênticas. O homem é o principio real
do Estado, mas o homem não-livre. É pois a democracia da não-liberdade. A oposição
abstrata refletida não pertence senão ao mundo moderno"(31).
Já o estado politico é a realização da liberdade, mas por abstração. A alienação
política vai se configurar, assim, como "alienação-reflexo", busca
de superação das contradições da situação humana, de realização genérica do
homem, por via abstrata, por oposição a sua vida material, através de uma forma
política que não participa do conteúdo efetivo da vida social.
No estado liberal a alienação política só deixa de existir, conseqüentemente,
para os membros do poder governamental, para os quais o aparelho estatal surge
como dotado de um conteúdo real, distinto pois da feição abstrata em que se
constitui para a coletividade em geral. Os membros do poder governamental tendem
desta maneira a se constituírem como burocracia, definida como "o formalismo
do estado"(32), pela consideração da administração como um
fim em si. A burocracia é desta maneira interessada na perpetuação da forma
política que é seu conteúdo, valendo-se para isso da generalização imaginária
de seu conteúdo concreto particular.
Apresentando-se o estado politico como eliminação ilusória das desigualdades,
mas tendo como pressuposto a sociedade civil, a supressão da alienação política
só é realizável pela supressão do estado, através da eliminação de sua base
real, eu última análise a propriedade privada. Da luta "política"
passa-se à luta de classes, cujo fim, no plano político, é a supressão do estado..
A possibilidade de uma abordagem sociológica da alienação política reside em
considerar a supressão do estado politico não como um salto brusco e definitivo,
mas como um processo de transição que toma sentido a partir da supressão total
encarada como limite. Este processo, obviamente, assume uma infinidade de momentos
que podem ser considerados relativamente alienados ou desalienantes, em função
da perspectiva adotada. A idéia-limite transforma-se, metodologicamente, em
"hipótese-guia", a da insustentabilidade do estado classista, e da
validade das tendências de evolução que a ele se opõem(33)
No processo de transição o poder político é instrumento de seu próprio desaparecimento,
e isso permite-nos examinar, a cada momento histórico, a relação que se estabelece
entre a vida quotidiana dos diversos grupos e classes e o estado, e esses momentos
de transição constituirão exatamente o objeto da atenção sociológica(34).
É desta maneira que podemos encarar, por exemplo, a fixação messiânica(35) como uma alienação política, em relação às possibilidades
de utilização positiva do poder politico em cada fase, o que significaria a
capacitação, da maioria do povo, em orientar em causa própria o seu destino
político,
II - Alienação política: coronelismo.
A análise do fenômeno do "coronelismo", de fundamental importância
para a perfeita compreensão da estrutura política brasileira, permite-nos verificar
em que medida a categoria de alienação é ou não propicia a uma utilização sociológica
fértil.
A tese de Victor Nunes Leal , O município e o regime representativo no
Brasil(36), fornece-nos uma análise minuciosa
e profunda do fenômeno do coronelismo, que logo de início é conceituado como
"resultado da superposição de formas desenvolvidas de regime representativo
a uma estrutura econômica e social inadequada". Assim, o coronelismo não
é visto como uma simples forma de manifestação do poder privado, incompatível
com o estabelecimento relativamente eficaz do sistema representativo, mas como
uma "adaptação em virtude da qual resíduos de nosso antigo poder privado
têm conseguido coexistir com um regime politico de extensa base representativa"(37).
Desde as Instituições Políticas Brasileiras(38) torna-se clássica a distinção que se
estabelece entre a organização formal do Estado brasileiro e sua organização
de fato, entre o "direito-lei", elaborado pelas elites, e o "direito-costume"
do "povo-massa", conforme a terminologia peculiar de Oliveira Viana.
A organização politica em moldes democráticos seria um apanágio exclusivo dos
povos anglo-saxões, e sua adoção por outros povos, entre eles o brasileiro,
decorreria de um espírito de imitação absolutamente incompatível com suas próprias
realidades. Países como o Brasil jamais poderiam atingir uma forma de organização
política que incluísse "o hábito anglo-saxão de acorrer às urnas, o exercício
espontâneo do direito de sufrágio, a tradição das propagandas preparatórias
às eleições, o interesse vivo e profundo por todas estas formalidades democráticas,
e entusiasmo único com que os saxões animam e inflamam todo o eleitorado, a
massa popular"(39).
Estes hábitos e costumes decorreriam de um sentimento-base, o sentimento nacional,
que sendo traço exclusivo da raça e da cultura anglo-saxã, jamais poderia ser
encontrado em povos dominados, culturalmente, pelo "regime de clã".
E Oliveira Viana conclui: "Por um paradoxo realmente surpreendente, estes
povos de clã assim carecentes de espírito público e de educação democrática
vivem todos, por sua infelicidade, perdidamente enamorados pelos povos anglo-saxônicos,
que possuem, de formação social, este espírito, e pela beleza dos regimes constitucionais
e políticos que eles organizaram para si mesmo, para seu uso, assentando-os
justamente sobre este "complexo de espírito público" que é a força
motriz das suas instituições e a inspiração e a alma que as anima"(40).
Sem os prejuízos racistas e culturalistas de O. Viana, os estudos sobre a realidade
política brasileira têm desenvolvido bastante a análise deste dualismo, buscando
suas razões na própria estrutura econômico da sociedade brasileira.
Desde a época de sua descoberta, assinala Caio Prado Jr.(41) , a colonização portuguesa no Brasil "toma
o aspecto de uma vasta empresa comercial, destinada a explorar os recursos naturais
de um território virgem em proveito do comércio europeu. É este o verdadeiro
sentido da colonização tropical, de que o Brasil é uma das resultantes, e ele
explicará os elementos fundamentais, tanto no social como no econômico, da formação
e evolução histórica dos trópicos americanos. Decorre daí a estrutura dual da
sociedade brasileira, que se manifesta em todos os setores. No plano econômico,
particularmente em relação à unidade agrária, em que "a fazenda se relaciona
com as outras unidades da economia nacional como se fosse uma empresa capitalista;
mas no interior, entre o latifundiário e os agregados, essas relações são, em
essência, relações de enfiteuse", impossibilitando qualquer comparação
contábil de preços internos e externos da unidade econômica. No plano das relações
sociais, então, capitalistas externamente às unidades agrárias e semi-feudais
internamente. No direito, com o direito privado opondo-se às formas novas de
direito comercial(42). No plano político enfim, pela dualidade já
assinalada da organização liberal do Estado superposta à existência, em diversos
graus, de formas de poder patriarcal e local.
No Brasil colonial, ao predomínio do campo que se organiza localmente através
das câmaras Municipais, corresponde um Estado praticamente inatuante, que só
cresce em presença quando as perspectivas fiscais são promissoras, como no período
do ouro em Minas Gerais.(43), Com a transladação
da família real portuguesa para o Brasil se superpõe, de forma totalmente inadequada(44),
a estrutura burocratizada do Estado português sobre a sociedade brasileira.
O problema da independência política do Brasil se manifesta exatamente quando
o poder real se vê diminuído pela burocracia e burguesia comercial portuguesa,
que se valem da máquina administrativa para a obtenção e manutenção de privilégios,
quer pela monopolização do comercio, quer pelo controle dos postos governamentais,
com o que isto implica de posição social. O surgimento de uma classe rural que
vive de rendas e se estabelece nas cidades possibilita a luta efetiva pelo governo
central, que anteriormente não estava ao alcance das classes rurais(45).
A independência consagra a supremacia do "partido brasileiro", que
ainda durante o primeiro reinado enfrenta os portugueses através da luta contra
o absolutismo de Pedro I. O Segundo Império estabiliza o domínio político dos
grupos de base latifundiária, o que é expresso pela calmaria política do período.
Á proclamação da República caracterizará a transferência do poder do antigo
latifúndio escravocrata para a lavoura cafeeira ascendente, assim como o crescimento
da importância do grupo burocrático-militar; mas permanecem as mesmas estruturas
de dominação locais, que se organizam para a participação nos governos centrais
através dos processos do Coronelismo.
III - O coronelismo e o poder
É dentro deste quadro geral que vai se inserir o fenômeno do coronelismo. Corresponde
à fase em que o sistema de poder oligárquico de tipo patrimonialista entra em
decadência, e é substituído por um sistema de compromisso que supõe, de um lado,
a manutenção de poderes locais por grupos oligárquicos, mas por outro o crescimento
da participação do governo central, ou estadual, na vida dos municípios(46)
. Se o governo central necessita do apoio das situações estaduais, e estas dos
chefes locais, estes dependem dos governos para uma série de benefícios, utilização
em causa própria do funcionalismo, de erário público, polícia e demais instrumentos
governamentais(47). Colocando-se ao lado des
governos, os chefes locais se asseguram liberdade total de movimentos e instrumentos
de coação contra opositores. O coronelismo é assim essencialmente governista(48), realizando a manipulação eleitoral das populações
rurais em função de compromissos de governo, traduzindo siglas e programas políticos
partidários em denominações locais ou individuais que expressam grupos oligárquicos
locais em oposição.(49)
A estrutura de poder no Brasil, desde o Império até recentemente, tem se caracterizado
pela centralização de poder e predomínio de grupos rurais. Na República Velha
"a concentração de poder continua a processar-se na órbita estadual exatamente
como sucedia na esfera provincial durante o Império" (50).
E esta concentração de poder tem sempre a mesma base: após as perturbações do
período regencial, "reestabelecida a ordem, que significava principalmente
centralização política, e abafadas as pretensões das categorias inferiores da
população, a paz interna vai assentar na solidez da estrutura agrária, fundada
na escravidão, e as contendas política. passarão a travar-se no plano nacional
e no seio da poderosa classe dos senhores rurais"(51).
Variando o eixo político segundo o itinerário da riqueza agrícola, a mesma linha
de centralização é mantida. "A concentração de poder em nosso país, tanto
na ordem nacional como na provincial ou estadual, processou-se através do enfraquecimento
do município. Não existe a menor contradição no processo".
A classe dos proprietários rurais como senhora indiscutível do poder político,
nem por isso o sistema do coronelismo pode deixar de ser considerado como "uma
relação de compromisso entre o poder privado decadente e o poder público fortalecido';
nem por isso a estrutura política brasileira deixa de apresentar o paradoxo
aparente do amesquinhamento do poder municipal exatamente onde se manifesta
a força dos "coronéis" ante o governo central, por eles mantido e
apoiado.
Duas ordens de fatos explicam o paradoxo aparente, a primeira relativa às próprias
classes rurais, a outra à composição do Estado brasileiro em relação a outros
grupos sociais.
No que se refere às classes rurais, já assinalamos que o amesquinhamento formal
da autonomia municipal é compensado pela ampla autonomia que lhe é concedida
de fato, quando seu controle político é exercido pela facção situacionista,
ou que a ela adere. " É justamente nessa autonomia extra-legal que consiste
a carta-branca que o governo estadual outorga aos correligionários locais, em
cumprimento de sua prestação no compromisso típico do 'coronelismo' "(52)
. Além do mais, dentro da própria classe dos proprietários rurais existem diferenciações
acentuadas que determinam que, enquanto umas participam diretamente do poder
central, outras dependem do compromisso mútuo para a simples manutenção da hegemonia
local; ao desenvolvimento da lavoura do café, que coloca seus representantes
na execução direta da política financeira do governo, corresponde de outra parte
uma decadência da lavoura açucareira, que passa, em muitas regiões, a consistir
apenas em hegemonias locais. incapazes de subsistir sem apoio governamental,
sem o compromisso do coronelismo.
Por outra parte, o Estado brasileiro não é composto exclusivamente dos representantes
rurais, mas assume configuração peculiar: consolida-se como "estamento
burocrático"(53) que, realizando a politica
das classes latifundiárias e dos demais grupos de pressão que se lhe apresentam
historicamente, adquire relativa autonomia e institucionalização. As origens
da constituição estamental do Estado brasileiro se prendem a peculiaridades
próprias do Estado português ao término do período colonial. E mesmo liberto
da administração portuguesa, vai se configurando como "estado cartorial",
cuja estrutura administrativa tem seu fim em si mesma, dentro de uma politica
clientelistica que une o campo à cidade; as classes rurais, base do poder político,
obtém o apoio das classes médias mantendo-as na administração.
Além destes fatos, a concentração do poder político se impõe, de início, corno
indispensável à própria manutenção da estrutura rural: o surgimento das formas
de trabalho livre, com o inicio do desenvolvimento urbano e industrial, colocava
em cheque o estatuto da escravidão. "E como não seria possível a coexistência
no mesmo país, de dois regimes de trabalho antagônicos, os escravocratas, que
dominavam o cenário político nacional, não poderiam deixar de recorrer a centralização
para resguardar, em todo o Império, a continuação da escravatura"(54).
Unindo-se esta necessidade da lavoura escravocrata com os interesses do setor
burocrático, o processo de centralização tende a se desenvolver de forma irreversível.
O grupo burocrático desenvolve-se grandemente com a estruturação do exército
a partir da Guerra do Paraguai, com o crescimento progressivo do funcionalismo
público, e inclusive com o desenvolvimento de uma elite política que, de origem
rural, radica-se nas capitais valendo-se de suas origens como "bases"
políticas, às quais satisfazem em reivindicações específicas, mas nas quais
não voltam a submergir. O crescimento das funções do Estado, o desenvolvimento
industrial e urbano, a necessidade de uma politica econômica complexa e integrada
em relação ao café, e tantos outros fatos de dispensável enumeração, fazem com
que a participação dos municípios e regiões rurais na vida politica seja cada
vez mais através do processo de manipulação politica que é o coronelismo, em
que apoiar o governo é a única forma de conservação de hegemonias locais; e
em que este apoio é indispensável para o governo que, assim, jamais tocará na
estrutura social do campo que dá ensejo ao coronelismo.
IV - Manipulação política do coronelismo.
Não nos deteremos, propriamente, no processo de manipulação política realizado
pelo coronelismo, conhecido como o sistema de "votos de cabresto",
pelo qual os chefes políticos locais dominam grande quantidade de eleitores.
Primitivamente, este votos eram garantidos por uma série de procedimentos extra-legais
("atas falsas", "currais eleitorais", etc)(55)
, mas baseados na real ascendência dos "coronéis", corno atesta a
sobrevivência do sistema após o aperfeiçoamento da legislação eleitoral(56).
E as razões desta ascendência não são difíceis de encontrar: "completamente
analfabeto, ou quase, sem assistência médica, não lendo jornais nem revistas,
nas quais se limitam a ver as figuras, o trabalhador rural, a não ser em casos
esporádicos, tem o patrão na conta de benfeitor. É dele, na verdade, que recebe
os únicos favores que sua obscura existência conhece. Eu tal situação, seria
ilusório pretender que esse novo pária tivesse consciência do seu direito a
uma vida melhor e lutasse por ele com independência cívica. O lógico é o que
presenciamos: no plano político ele luta com o "coronel" e pelo "coronel".
Aí estão os votos de cabresto, que resultam, em grande parte, de nossa organização
econômica rural(57).
3ª Parte - coronelismo e alienação
I - alienação em Oliveira Viana.
Em que medida e possível falarmos, em relação ao coronelismo, em alienação?
Cremos não ter sentido, ao menos de imediato, utilizarmos esta categoria apenas
pela comparação das estruturas de manipulação política do coronelismo com formas
de participação política consideradas ideais, como as vigentes nos países economicamente
desenvolvidos. De fato, pela análise intrínseca da estrutura do coronelismo,
considerada como realidade sui-generis, nada permitirá dizer que o apoio do
eleitorado interiorano ao "coronel" resida em uma "ilusão"
qualquer, em uma fixação em qualquer "irrealidade", como a de que
o "coronel" seja um protetor do homem do campo, e que nos permita
dizer que este homem esteja politicamente alienado. As dificuldades que deparamos
ao tentar uma aplicação mais rigorosa da categoria de alienação ao coronelismo
são semelhantes às assinaladas por Lefort, em relação à participação da vaca
na vida do povo Nuar. "O caso Nuar, porque é um caso limite, nos apresenta
de forma ampliada as dificuldades que necessariamente são encontradas quando
se pretende falar no absoluto de uma forma de alienação humana, determinar na
sociedade, encarada como um todo, um momento de atividade humana alienada"(58)
Entretanto, Oliveira Viana denuncia o "espírito de imitação" - uma
fuga à própria realidade, uma alienação portanto - de nossas elites políticas,
que teimam em copiar as formas constitucionais anglo-saxãs, quando o povo brasileiro
é congenitamente incapaz de maioridade política. Não se poderia dizer, inversamente,
que o próprio Oliveira Viana assume uma atitude alienada, na medida em que lança
mão de um ideal externo à realidade brasileira para analisá-la, e concluir pela
incapacidade política do polo brasileiro? Mas não obstante este fato, e inclusive
apesar das deformações trazidas pela utilização insólita de categorias pseudo-cientificas,
a obra de Oliveira Viana apresenta um interesse que seria inadmissível se a
considerássemos como definitivamente "alienada".
Pois Oliveira Viana denuncia, com grande propriedade, o "idealismo utópico"
de nossas elites dirigentes que, efetivamente em contato com outras sociedades
(pelo caráter dual da sociedade brasileira, cujas raízes o autor não soube ver),
tentam transpor para o Brasil suas estruturas políticas formais. Criticando
os legisladores brasileiros, O. Viana mostra que "eles como que estão ainda
nesta fase da filosofia politica em que o Estado é concebido como urna estrutura
estranha à sociedade, ajustada a ela, vinda de cima, como que por direito divino"(59)
Constatando de forma quase genial a discrepância entre a organização formal
do Estado e sua composição de fato, no ano longínquo para o Brasil, de 1918(60)
e a forma de ligação entre estes dois polos que realizam as manifestações de
poder privado, que vão resultar no coronelismo, Oliveira Viana busca em estigmas
raciais ou "culturológicos" do povo brasileiro sua inadaptação às
formas consideradas ideais. Constata a existência das elites, selecionadas por
critérios congênitos(61), e conclui inevitavelmente;
"o sufrágio universal e o sufrágio igual é anti-científico quando aplicado
sistematicamente ao nosso povo"(62); "o
erro fundamental de nossos constitucionalistas tem sido dar à autonomia local
um conteúdo maior do que é aconselhável em nosso meio", quando ela deveria
"trazer o carisma de urna autoridade mais alta e mais imparcial, que não
pode ser outra senão a Nação"(63), dirigida
por sua elite, os "homens de 1.000".
As análises de Oliveira Viana podem ser consideradas "alienadas"
na medida em que procuram fixar os traços do comportamento político em características
raciais e culturais rígidas, transmissíveis hereditariamente, e portanto intemporais.
Cremos, entretanto, que esta perspectiva não é fortuita, vinculada apenas a
uma "incompreensão, eu má formação sociológica do autor. Impossibilitado,
pela própria força da realidade política que estuda, a aceitar a idéia abstrata
de uma democracia política no Brasil nos moldes europeus; não vendo, pela diferenciação
gritante entre o processo político que se desenrola no Brasil e o europeu em
um período em que não se utilizava ainda a categoria comparativa de "sub-desenvolvimento"
-. perspectiva de aproximação de formas de comportamento politico tão distantes;
possuindo ainda, pela própria situação pessoal, perspectiva eminentemente conservadora,
a busca de traços culturais rígidos se impõe de forma inelutável em sua linha
de preocupação.
A alienação da obra de Oliveira Viana lembra extraordinariamente a reificação
que Marx denuncia na economia política clássica. "As categorias da economia
burguesa são formas do intelecto que têm uma realidade objetiva, na medida em
que refletem relações sociais reais, mas essas relações não pertencem senão
a esta época determinada, em que a produção mercantil é o modo de produção social"(64). Para o economista clássico, entretanto, "formas
que manifestam, ao primeiro olhar, pertencer a um período social no qual a produção
e suas relações comandam o homem, em vez de serem comandadas por ele, parecem,
para sua consciência burguesa, uma necessidade tão natural quanto o próprio
trabalho produtivo"(65).
Da mesma forma, Oliveira Viana fixa realidades históricas em categorias que
pretendem à intemporalidade: "Entre esses usos e costumes de nossa vida
pública, a maior parte deles são, entretanto, gerais e pertencem a essência
mesma de nossa política de clã, com suas agitações de campanário"(66), "Entretanto estes usos, estes costumes,
estes tipos, estas instituições, formando o complexo de nossa culturologia política,
'penetram' a psique de nossos 'cidadãos', principalmente nos campos, e constituem-se
em motivos determinantes de sua conduta quotidiana na vida pública"(67)
E tudo isso explicaria porquê "nada mudou, com efeito, neles (na estrutura
e no espírito do povo) nessa evolução de quatro séculos"(68).
Investindo contra a alienação das classes conservadoras dentro de uma perspectiva
também conservadora, Oliveira Viana não foi ouvido por estes, nem por aqueles
que, interessados na superação das condições de dominação e inferioridade do
povo brasileiro, só podiam desejá-la de forma romântica, e apenas indignar-se
ante o racismo sem dúvida retrógrado do sociólogo. A importância que sua obra
cobra hoje, e cada vez mais, reside em que atualmente é possível superar esta
sua alienação, e compreender o real sentido das grandes realidades que revela.
II - Coronelismo e subdesenvolvimento
Acresce, a todas estas considerações, que as formas de participação politica
dos países desenvolvidos não podem ser consideradas sem maior exame como não-alienadas.
Na medida em que a organização politica liberal encobre uma manipulação do poder
por grupos econômicos, burocráticos ou tecnocratas, existe uma estrutura alienada
que se manifesta com violência quando, em situações de crise, saídas irreais,
personalistas na maioria das vezes, são buscadas, conduzindo a formas de poder
fascistizantes. É aí, com maior rigor que em qualquer outro momento, que se
evidencia a alienação política, quando a manipulação direta e eficaz do poder
político pelas organizações populares é possível e nem per isso realizada.
Cremos só ser licito falar em alienação política como realidade sociológica
no Brasil rural na medida em que vão se evidenciando, em seu processo, condições
de livre exercício de poder que, entretanto, não se atualizam. É evidente que
a simples comparação entre o padrão de vida do camponês brasileiro e dos habitantes
de países e regiões desenvolvidas permite-nos dizer de uma situação sub-humana,
de alienação biológica, por assim dizer, que nasce pelo confronto com outros
padrões biológicos, situação esta que dá fundamento a toda sorte de dependência.
É esta visão que permite a V. N. Leal lembrar, a respeito dos debates sobre
a legislação eleitoral: "Mas não faltou também quem pusesse a alternativa
verdadeira: ou legalizemos o 'coronelismo' ou procuremos criar condições sociais
diferentes daquelas que o geram e alimentam"(69).
Diante do mesmo problema de Oliveira Viana, da incapacitação politica do homem
do campo, aponta com a necessidade de superação da estrutura rural por uma intervenção
consciente, cioso de que o processo de decomposição desta estrutura, já em marcha,"é
um processo lento, descompassado, por vezes contraditório, que não oferece solução
satisfatória para o impasse"(70) .
De inicio fato considerado irremediável, depois problema a ser encarado pelas
elites dirigentes do país, a manipulação do eleitorado rural do Brasil só vai
se constituindo efetivo problema social nos dias de hoje, quando se instala
como tal no seio da própria sociedade, e não mais apenas nas preocupações de
alguns intelectuais mais lúcidos. É nessa medida que se constitui, de forma
sociologicamente determinável, em "alienação política", que aponta
necessariamente as perspectivas históricas de sua negação.
Esta constatação, entretanto, para completa análise e previsão de suas perspectivas,
precisa ser inserida em uma compreensão mais englobante do processo de desenvolvimento
econômico-social do Brasil, e mais ainda, do próprio problema contemporâneo
do subdesenvolvimento, encarado particularmente no que concerne aos seus aspectos
políticos.
III - desenvolvimento econômico e democracia.
O problema do desenvolvimento econômico deixou há muito de ser considerado
como questão meramente técnica, para se transformar em questão política fundamental.
O lento processo de desenvolvimento dos países atualmente industrializados é
inadmissível para os países que sofrem violenta pressão no sentido de imediata
elevação dos níveis de vida. "A existência de um esforço político visando
ao desenvolvimento econômico é um fenômeno novo que distingue o período atual
do anterior. A aspiração ao desenvolvimento econômico nos países subdesenvolvidos
não é, de modo algum, vã quimera de economistas mal orientados; é uma força
política de enorme e irresistível poder, no mundo contemporâneo"(71).
Além de constituir uma reivindicação política, o desenvolvimento econômico
não admite um equacionamento puramente técnico inclusive por razões de ordem
técnica. Com efeito, a carência de bens de capital exige a utilização de "investimento-trabalho"(72)
em que seja obtido o máximo de produtividade com a mão de obra disponível, pela
eliminação do sub-emprego ostensivo ou disfarçado. Mas este processo não pode
ser dirigido por mecanismos de preço, e muito menos por meios coercitivos. "O
investimento em trabalho de uma população inteira não pode, afinal de contas,
ser a conseqüência de uma coerção estatal. Implica no cumprimento espontâneo
de atos de produção , sem idéia de lucro pessoal direto"(73)
. "Tais ações, que necessitam da adesão individual, só podem ter origem
na medida em que se integram no movimento da população inteira e em que este
é organizado"(74). Finalmente, "o campo de aplicação deste
labor coletivo deve ser organizado de tal forma que cada trabalhador tenha consciência
de que opera no sentido de seu interesse pessoal, longínquo ou imediato"(75).
A participação das massas populacionais no esforço de desenvolvimento exige,
como corolário, a ativa participação do Estado como elemento de decisão e planificação.
Desta maneira,"o volume de produção não estará determinado pelo resultado
fortuito de um número de decisões não-coordenadas, dos empresários individuais,
e das grandes empresas, mas por um plano racional que exprimirá o que a sociedade
deseja produzir, consumir, poupar e investir em um tempo dado"(76).
Pelas características do esforço desenvolvimentista, a direção do Estado não
pode ser por oposição às massas populacionais, mas deve, "para poder realizar
sua ação, estar integrado realmente na população, e não constituir uma burocracia"(77).
Tudo isso significa que o desenvolvimento econômico exige uma nova forma de
democracia, diferente da democracia liberal, em moldes clássicos. Onde o Estado
cresça de importância, mas onde a participação das grandes massas populacionais
na vida pública não se dê apenas no plano político, mas também no econômico
e social. "Esta propensão a realizar, tanto na prática como na teoria,
uma conciliação entre os princípios da espontaneidade e do dirigismo, quebrando
o radicalismo anterior, representa a tendência, em nosso tempo, a conceber as
condições institucionais do desenvolvimento, como algo que deve ser organizado
na forma de um planejamento democrático, Planejamento que não só induza os cidadãos
a se auto-determinarem, reservando-lhes certa área de privacidade no âmbito
da qual funcionem, com espontaneidade, os móveis psicológicos e sociais correntes,
mas também organize condições e estímulos diretos e indiretos que levem o desenvolvimento
a se processar de acordo com a perspectiva contida no plano"(78).
A democracia entendida semelhantemente, exigência técnica para o progresso inevitável
do desenvolvimento, parece ser o sentido geral de negação da alienação política
e social nos países subdesenvolvidos.
IV - perspectivas políticas do desenvolvimento econômico
no Brasil.
O problema político que o impacto do desenvolvimento econômico provoca no Brasil
se liga à contradição entre a necessidade de organização funcional do Estado
brasileiro, que o torne capaz de efetivar um planejamento global do desenvolvimento,
e a estrutura cartorial e clientelística que lhe imprime sua base política,
o coronelismo em primeiro lugar (79). Uma possibilidade teórica de solução é que
a burguesia nacional consiga desembaraçar-se desta antiga estrutura política,
pela "rápida liquidação de todas as formas de privilégios e parasitismo
que mantêm vigentes a política de clientela e o Estado Cartorial", tornando-se
capaz, desta forma, de atender à crescente demanda de alto padrão de vida de
todas as classes sociais. Caso isso se torne impossível, pelos próprios compromissos
políticos e econômicos a que a burguesia nacional se vê prisioneira, dificilmente
será tranqüila esta transição estrutural. Fracassada a burguesia, "a comunidade
brasileira, sob o imperativo de realizar, a qualquer preço e de qualquer forma,
seu desenvolvimento econômico-social, será conduzida a optar pelo socialismo,
de uma forma tanto mais radical e revolucionária quanto maiores hajam sido o
tempo perdido e o malogro da burguesia no cumprimento de sua tarefa"(80).
De uma forma ou de outra, a necessidade de utilização do Estado numa política
de desenvolvimento econômico é evidente, no sistema socialista por razões óbvias,
no sistema de livre empresa pela necessidade de "definir uma política de
orientação dos investimentos no setor industrial e nos serviços básicos",
e de"orientar recursos e assistência técnica para o campo afim de estimular
a oferta de alimentos e matéria prima agrícola"(81).
Não está ausente ainda, como perspectiva de encaminhamento político, a solução
dos atuais conflitos fora de formas democráticas, por via ditatorial, o que
implicaria uma compressão coercitiva dos níveis de renda dos grupos não participantes
do poder, sendo as necessidades de investimento supridas por esta compressão
e por remersas externas de capital. Basta perspectiva, politicamente viável,
parece não o sê-lo economicamente, visto impedir as transformações estruturais
necessárias para a simples ampliação do mercado interno, sem o qual qualquer
desenvolvimento econômico é impossível. Tal solução política parece conter em
si contradições que não permitiriam sua manutenção por largo tempo, é o que
parecem indicar as experiências históricas neste sentido.
V - alteração do processo de manipulação política e alienação
O processo de desenvolvimento econômico brasileiro tende a quebrar os antigos
quadros de manipulação política, o rural como os urbanos, o assistencialismo
paternalista e o clientelismo. O antagonismo entre os grupos detentores do poder
ou beneficiários de sua política econômica e paternalista e as massas urbanas
e rurais tende a se acentuar pela progressiva insolubilidade financeira de um
sistema baseado na conquista política de rendas. As últimas eleições presidenciais,
ainda que o candidato vitorioso tenha se valido também dos mecanismos tradicionais
de manipulação rural, significam o início da falência do sistema. Ao poder das
coligações rurais se sobrepõe, freqüentemente absorvendo-o, o poder financeiro
urbano; aos sistemas de manipulação do coronelismo, paternalismo assistencialista
e clientelismo, se substitui de maneira violenta os sistemas de manipulação
demagógicos, personalistas e moralistas. O fenômeno da alienação política, entendido
como incapacitação das massas para decisões políticas de acordo com seus interesses,
se acentua progressivamente. Com efeito, não se pode falar de alienação política
em uma sociedade em que o Estado se detém diante dos sistemas locais de dominação.
A alienação surge nas zonas urbanas, e também nas zonas rurais, à medida em
que evoluem as relações de produção de tipo capitalista, o sistema se torna
permeável à propaganda política e as massas interessadas vitalmente na orientação
governamental.
A decomposição da estrutura política rural se dá, em primeiro lugar, pela introdução
das relações capitalistas de produção no campo, em processo lento. As contradições
entre a economia semi-feudal e a industrialização(82)
, entretanto, exigem uma intervenção externa naquela economia, o que é dificultado
pelo poder político que o campo ainda detém(83).
Mais rápida que esta alteração das relações de produção se afigura a alteração
das próprias relações políticas. A potencialidade dos instrumentos modernos
de divulgação, notadamente, têm eliminado em grande parte o controle político
do coronelismo, que cada da vez mais depende da intermediação que realiza entre
o governo central e a região para a obtenção de benefícios locais, melhorias
e postos governamentais. Sistema que parece desmoronar-se de vez com, de um
lado, a intervenção federal nos municípios por orgãos como o SENAM, e, de outro
, a organização camponesa em órgãos de reivindicações.
As grandes massas populacionais, de inicio indiferentes às alterações políticas,
no máximo atentas às disputas locais, começam a dar importância ao governo central,
cuja política passa a atingi-los diretamente. A definição oposicionista do eleitorado
brasileiro parece indicar uma tentativa de revolucionar as estruturas de poder
político por parte das camadas populares, e sua capacidade de fazê-lo. Mas a
velocidade de decomposição dos sistemas de manipulação, a ausência de experiência
política das massas, coloca-as como presa fácil de manipulações demagógicas
que possam atingir sua sensibilidade. As possibilidades de vitória eleitoral
passam a residir não tanto mais em acordos políticos bem sucedidos, quando pela
capacidade demagógica dos candidatos e potencialidade de seus recursos de propaganda.
As contradições regionais desenvolvidas no decurso da industrialização, expressa
na descapitalização progressiva de estados periféricos em beneficio da região
de S. Paulo, repercutem violentamente na órbita política. Os problemas de queda
do nível de vida, diminuição das possibilidades de trabalho, etc., são traduzidos
politicamente por regionalismos de coloração nacionalista. Para as classes rurais,
o campesinato, a única saída é a imigração para o sul, ou a organização para
lutas de caráter radical. Nas zonas industrializadas o proletariado tende à
radicalização política, mas a ausência de organizações partidárias de tipo ideológico
com maiores perspectivas impede qualquer oposição eficaz ao personalismo crescente.
Nas regiões industrialmente desenvolvidas, a deterioração progressiva da moeda
tende também a lançar grandes camadas operárias e de pequena burguesia na busca
de soluções políticas, sem maior explicitação de programas e objetivos.
Em síntese, o momento de decisão política cresce de importância para todas
as camadas da população brasileira, se afirmando diferentemente para cada classe
estudada. O distanciamento entre o eleitorado e os centros de decisão, pela
ausência de uma institucionalização que os ligue, com a quebra das estruturas
tradicionais de dominação, permite toda gama de mistificações e demagogia para
a conquista de votos. Os critérios de escolha eleitoral, dado este distanciamento,
tornam-se contingentes, determinando um alto coeficiente aleatório para tentativas
de previsão. As estruturas de dominação se desmoronando, seu reestabelecimento
é impossível pelo desaparecimento das condições que a permitiam, impondo-se
assim novas formas de participação política, em um nível superior, ou a permanência
da demagogia e do personalismo como instrumentos de dominação, formas de alienação
política.
Pela visão do processo político brasileiro tal como a esboçamos, podemos indicar
a conclusão de que a manifestação aguda de alienação política no Brasil significa
o fim daquelas formas que poderíamos chamar, em comparação com as formas contemporâneas,
de alienação direta, social(84), recoberta externamente
por um Estado político atrofiado.(85) A fase atual parece corresponder ao apogeu do
Estado político brasileiro, que passa cada vez mais a penetrar em todas as estruturas
locais de dominação. Para o futuro, teríamos ou a perspectiva de uma acentuação
da alienação política, através de governos capazes de levar à frente a galvanização
demagógica das massas, ou o caos político que pode redundar em solução de força.
As perspectivas de desalienação, em vista do processo de desenvolvimento econômico,
se situam no surgimento de novas instituições de massa, partidárias, sindicais
e camponesas, fundamentalmente, que possam efetivar a ligação entre as massas
e o poder. As transformações políticas que o desenvolvimento destas instituições
acarretariam já escapam às possibilidades de previsão clara.
Cabe uma referência final às formas ideológicas de participação política. As
formas de ação ideológica visam à organização e ação de massas em função de
projetos políticos explicitamente definidos, e buscam romper com as estruturas
tradicionais de manipulação política. Pela sua fundamentação de tipo racional,
têm prestigio junto à intelectualidade, mas ainda que correspondam a problemáticas
sociais efetivas, apóiam-se antes em ideologias exógenas ou elaborações intelectualistas
do que na realidade social e política à qual buscam corresponder. Apesar das
pretensões, raramente conseguem superar o âmbito restrito em que são elaboradas,
ou se o conseguem é pela substituição de sua fundamentação racional por técnicas
tipicamente demagógicas. Assim, ainda que os grupos ideológicos tenham crescido
e ampliado sua influência, não parecem ter, em suas manifestações principais,
movimento nacionalista e Partido Comunista, perspectivas de definir o quadro
político.
4ª Parte: conclusões metodológicas
I - alienação e totalidade.
Metodologicamente, a abordagem do problema político através da categoria de
alienação permite-nos uma série de indicações quanto a natureza do método e
do objeto da ciência assim encarada Procuraremos indicar rapidamente as conclusões
que podemos inferir a termo médio, e relaciona-las com algumas concepções mais
gerais sobre a metodologia das ciências sociais comumente entendidas.
A primeira constatação que fazemos é de que, se pretendemos uma utilização
válida da categoria de alienação, o fenômeno estudado deve ser inserido em um
quadro mais amplo diante do qual a alienação se caracterize. Se a alienação,
como conceito sociológico, é não apenas uma categoria operatória, mas também
um fato sociologicamente observável - e é ai que julgamos mais fértil sua caracterização
- o fenômeno deve ser inserido em um quadro que tenha em si mesmo a contradição,
que vai se constituir em seu elemento dinâmico. Temos pois que inserir a estrutura
do coronelismo em uma caracterização geral da estrutura social brasileira, que
é vista como subdesenvolvida, isto é, em processo de desenvolvimento, para depois
afirmarmos da existência de alienação política. Mais ainda, a própria estrutura
social brasileira como de país subdesenvolvido deve ser enfocada a partir de
uma concepção mais geral da sociedade capitalista, a própria estrutura política
brasileira dentro de uma concepção mais geral de estado político.
Em síntese, é necessário introduzir o fenômeno na totalidade concreta em que
se manifesta. No sentido em que deve ser visto como momento de atividade humana
total, que é a atividade de produção do homem por ele mesmo; assim, o coronelismo
é vinculado às condições gerais de produção (econômica, artística, moral, intelectual...)
de uma sociedade de transição, sob o prisma político, entre a manutenção de
poderes oligárquicos e a decomposição das estruturas tradicionais de dominação.
E no sentido, também, de que deve ser compreendido como parte do processo global
de superação da estrutura subdesenvolvida, fenômeno integrado na evolução da
sociedade contemporânea.
A análise do coronelismo como momento de uma totalidade mais ampla indica que
seu estudo deva se dar, ou participar de uma série de planos de abstração. Deve
partir de uma teoria geral da sociedade contemporânea, que sirva de fundamento
a uma teorização sobre o problema do subdesenvolvimento, que dê sentido ao processo
social brasileiro, que por sua vez explique o processo político, etc. Em outro
nível, exigirá uma caracterização tipológica da estrutura do coronelismo.
Esta perspectiva de totalidade, que resulta na necessidade de elaboração de
uma série de teorizações - poderíamos dizer "modelos" - referenciais,
implica que estes modelos deverão permanecer, não só durante o estudo, mas inclusive
após sua conclusão, em forma hipotética. Ao considerarmos, como fizemos, formas
de participação política como alienadas, estamos supondo a variabilidade total
da estrutura social, através de uma "hipótese-guia"(86)
de imediato indemonstrável, a de sua transformação no sentido da desalienação.
A necessidade de adoção desta hipótese-guia, no caso particular da estrutura
política como em geral, deriva de que qualquer juízo sobre um fenômeno social,
enquanto realidade dotada de sentido, implica considerações sobre um "poder
de vontade" como formador de futuro(87). Se dissemos que determinada forma de democracia
"parece ser o sentido geral de negação da alienação política e social nos
países subdesenvolvidos"(88), esta afirmação
é hipotética e só demonstrável historicamente, embora seja de utilização indispensável
por dar sentido a toda a análise que realizamos. Caracterizamos o processo em
função desta hipótese, e a totalidade considerada será necessariamente uma totalidade
aberta, fazendo com que o objeto elaborado pela ciência social seja relativamente
impreciso em relação ao construído pelas ciências naturais. O que não impede,
mas pelo contrário exige, a construção de instrumentos precisos para o tratamento
de conceitos, definição de questões, elaboração de modelos, verificações, pesquisas,
etc.
II - categoria de negação: a dialética
A categoria de negação, correlata à alienação constatada, implica a consideração
do objeto de conhecimento como em processo, não um objeto da ordem do ser, mas
da ordem do vir a ser. Na realidade, estas duas formas de conhecimento coexistem,
uma na elaboração do modelo do coronelismo, por exemplo, outra na consideração
de sua dinâmica.
A constatação, por parte da sociologia acadêmica, da impossibilidade de um
aprisionamento do fenômeno social em modelos rígidos e necessários tem conduzido,
ou a um empobrecimento do objeto, ou a busca de um hiper-empirismo que, através
de categorias ambíguas e fluidas, consiga apreender em toda sua riqueza fenômenos
que parecem escapar à conceitualização. A necessidade de apreender o ser no
interior do vir a ser, "uma estrutura no devenir ", como coloca Heller(89),
conduz à necessidade de categorias ambíguas que possam captar, simultaneamente,
dois momentos de um processo. É o que leva, pela consideração da incompatibilidade
entre esta exigência e o método analítico, ao apelo à "relação dialética",
caracterizada como aquela em que "duas afirmações, que não podem referir-se
uma à outra nem ambas a uma raiz lógica comum aparecem, não obstante, unidas
em um objeto real em que, junto a uma, se encontra sempre a outra".(90)
Um refinamento na elaboração do modelo do coronelismo poderia conduzir a uma
utilização sem dúvida válida destas "relações dialéticas" em que,
por exemplo, a atitude do camponês em relação ao "coronel", muitas
vezes de apoio eleitoral e ressentimento local, venha a ser caracterizada como
"relação de ambigüidade". Mas a validez deste tipo de utilização do
método dialético não esgota seu conteúdo, deixando de lado toda sua utilização
enquanto método de análise de processo como e utilizado nas análises hegeliano-marxistas.
O desconhecimento desta distinção fundamental é que vai permitir, em alguns
sociólogos, a condenação da perspectiva da contradição dialética como "solução
sublimada" ou como "dogmatismo", condenação que surge quando
se busca projetar a perspectiva do ser para os que operam com a perspectiva
do devenir, do processo(91).
O "modelo" que elaborarmos do processo político brasileiro, no qual
o fenômeno do coronelismo se insere, será metodologicamente distinto do modelo
que se propuser para a estrutura do coronelismo, ou do comportamento político
de tal ou qual grupo social. Será um modelo do processo, disposto no tempo,
que contenha uma representação do processo político passado, uma caracterização
da problemática que seus participantes enfrentam - não apenas conpreensivamente,
mas pela inserção no "modelo" do subdesenvolvimento, etc. - cujas
antinomias sejam vistas como em vias de negação, e não apenas como relações
antinômicas. Como coroamento, buscará a "negação da negação", que
será exatamente o elemento de previsibilidade em que reside, afinal de contas,
o interesse da análise científica. Enquanto que o modelo do coronelismo deverá
aproximar-se da idéia usual de "estrutura-tipo", com o estabelecimento
das correlações e relações dialéticas que o aperfeiçoamento da analise exigir.
III - experimentação e previsibilidade
O problema da verificação das hipóteses de uma ciência de tão amplos quadros
parece por em cheque a própria possibilidade de uma ciência acadêmica que enfoque
problemas como o da estrutura da dominação política. Parece-nos evidente que
a delimitação do objeto de preocupação do cientista social é função, antes de
mais nada, da problemática que o preocupa, e se a ampliação do campo de análise
a ponto de perder a possibilidade de comprovações empíricas pode significar
a eliminação de sua validade científica, restringir a dimensão do objeto aos
instrumentos técnicos disponíveis poderá conduzir à inexpressividade e inutilidade
dos resultados adquiridos. Quando a perspectiva do estudioso é tomada no interior
de uma ordem social dada, e a partir dela, ampliam-se os parâmetros pressupostos
e é possível orientar-se de forma rigorosa para hipóteses com numero restrito
e controlável de variáveis. Quando esta perspectiva, no entanto, considera como
variável toda uma sociedade, com suas formas de produção e apropriação, estruturas
políticas, quadros valorativos, etc., a possibilidade de verificação empírica
das conceituações hipotéticas só será possível historicamente. Por isto mesmo
este tipo de sociologia tem se desenvolvido predominantemente no campo do pensamento
partidariamente comprometido, único capaz de realizar comprovações de tal magnitude,
em que cada experimentação implica verdadeira opção existencial.
A partir destas considerações, alteram-se os conceitos tradicionais de experimentação
e previsibilidade. A experimentação macro-sociológica, realizada pelo homem
em sociedade, implica uma opção de caráter irreversível, pois altera de forma
definitiva as condições iniciais em função da qual esta opção foi executada.
Neste ponto, mais que em qualquer outro, se evidencia a impossibilidade de uma
separação rígida entre a ciência social e a prática, reservando-se à ciência,
em última análise, o papel de determinar de forma mais precisa possível o campo
dentro do qual se realizarão as opções, que virão comprovar ou refutar as hipóteses
por ela estabelecidas.
A necessidade desta vinculação entre a ciência e a prática social, não apenas
no plano da utilização de conhecimentos adquiridos, mas inclusive no próprio
momento cognitivo, quando da formulação de hipóteses, deriva do fato de que
o devenir social se concreta em cada momento como um ente atual, "mas este
ente apresenta um caráter singular, uma vez que é querer humano-social, uma
realidade social, por ser atividade humana". Mesmo na perspectiva de conhecimento
do ser, que é a de Heller, esta vinculação se impõe: "Nesta realidade da
ordem do ser, que sempre transcende o presente e se projeta no futuro, nos encontramos
existencialmente incluídos, quer dizer, com nossa existência total, com nosso
sentir, querer e pensar; nela ocupamos um lugar, grato ou adverso; por meio
dele mantemos relação com dita realidade e temos dela uma certa imagem; e sobretudo,
intervimos de determinada maneira em sua evolução. Não podemos conhecer uma
realidade se não participamos, ao mesmo tempo, em sua formação"(92).
A perspectiva metodológica que esboçamos, lançando mão de hipóteses-guia, fazendo
ressaltar alienações e negações correlatas, permite determinar, com um mínimo
de arbítrio, o sentido mais correto das opções, embora se baseie, ela mesma,
em uma opção determinada. .
IV - uma ciência radical
Intimamente vinculada à ação social, ainda que momento distinto dela, o objeto
de conhecimento da ciência social consistirá na análise do fenômeno social enquanto
fenômeno humano, quer pelo sentido que tem dentro da estruturação da sociedade,
dentro de uma análise funcional, quer pela sua determinação enquanto obra humana,
objetivação ou alienação do homem.
Em outros termos, significa dar à ciência social um status de ciência radical.
"Ser radical é tomar as coisas pela raiz. Ora, para o homem, a raiz é o
próprio homem"(93). Da mesma forma que na análise do fenômeno econômico
procura-se ressaltar a natureza humana da mercadoria feitichisada, e denunciar
o nível de reificação a que atinge a economia política burguesa, na ciência
política caberá determinar o processo de feitichisação e reificação a que atinge
a estrutura politica e a ciência política burguesa, que a coloca como pairando
acima dos homens. Não pela simples denúncia de"irrealizações", mas
pela determinação das categorias objetivamente surgidas em processo histórico
- capital, Estado, religião - , e as categorias que objetivamente as negam:
alienação, mais valia, trabalho social, etc.
Formula-se com perspectivas de racionalidade, a partir daí, o problema do determinismo
e da explicação social.
V - determinismo e explicação
A tentativa de desvincular o determinismo social da necessidade metafísica
ou lógica, correlata a uma concepção da liberdade humana como supra-racional,
leva autores como G. Gurvitch a fundá-lo tão somente, enquanto processo cognitivo,
na suposição de que"existem conjuntos ou quadros reais, ou mais largamente,
universos reais e concretos aos quais podemos atribuir certa coerência cujo
grau é muito relativo e variável"(94),
e dar-lhe fundamento puramente empiricista, em que os relacionamentos obedeceriam
a necessidades meramente factuais, contingentes.
Trata-se, dentro desta concepção, do estabelecimento de graus mais ou menos
constantes de relações empiricamente observadas, sem o sentido de necessidade
ou causalidade interna. Os fenômenos sociais apresentariam diversos graus de
coerência, penetrados de diversas maneiras pela liberdade, que consiste exatamente
no não coerente, no irracional, insinuando-se nos interstícios dos quadros,
modificando-os e os alterando. O grau de previsibilidade dos fenômenos e de
sua apreensão conceitual, será inversamente proporcional à presença do elemento
essencialmente contingente que é a liberdade, o humano. A utilização do método
compreensivo será antagônica à análise empírica, permanecendo ou no plano da
mera descrição ou no plano da elaboração de tipos puros. A história, considerada
como explicativa por excelência, não permitiria senão uma descrição a posteriori
sem qualquer possibilidade de explicações que não a de "causalidade singular".
A noção de explicação na ciência social, entretanto, não se atém apenas ao
aspecto meramente factual do fenômeno, tal como fazem crer os procedimentos
técnicos de determinação indicados nesta perspectiva, com suas origens nas ciências
naturais. A permanecer neste nível, a tarefa explicativa só teria sentido se
permitisse a previsão de outros fenômenos semelhantes, a tomada de posse da
realidade e a manipulação de causas para a obtenção de efeitos. O critério de
validade de uma sociologia, neste plano, seria o de sua eficácia, de sua utilidade
prática. A sociologia de G. Gurvitch,liberdade especificamente, enfatizando
a irracionalidade da humana, parece não conduzir por este caminho(95).
Julgaríamos, não obstante, que se a sociedade, com suas organizações e demais
obras essencialmente humanas, passam em situações concretas a comandar e a determinar
as ações dos homens, demandando um movimento inverso de superação, haverá ao
menos em tese a possibilidade de se determinar de que maneira o produto se "desgravita"
do produtor, e de como o produtor novamente o assume em outro nível de organização
social. Pois esta alienação do produto, e o movimento de sua negação, ato de
liberdade, se dão de maneira definida e passível de estudo rigoroso. O próprio
método de Gurvitch permite propor um ideal pluralista em que " as subjetividades
individuais e coletivas não se alienem em totalidade transcendente, nem admitem
sua projeção como objeto exterior ou sujeito exterior à multiplicidade de seus
membros" fundado em um "nós" (96); mais explicitamente, permite formular um direito social
que "não se aliene" e permaneça fiel a si mesmo, ou seja, "não
se submeta seja a uma organização dele separada por um abismo, seja a um chefe
carismático cujo poder, ao invés de ter sua força no "nós", atribui
a si mesmo qualidades mágicas". Mas não mostra como esta alienação se produz
concretamente, e como permite ou não sua negação.
Vê-se que não falta a Gurvitch a consciência do conceito de alienação, e a
importância de suas análises fenomenológicas (abandonadas em sua obra atual)
reside precisamente na possibilidade de, a cada momento, fazer ressaltar a alienação
presente. Mas a análise especificamente sociológica parece ser impotente para
dizer como surgiu esta alienação, e como gera ou não o ato de libertação que
a nega, pois sua sociologia não atinge esse nível explicativo, e sua dialética
é meramente relacional.
VI - normal e patológico
A categoria de alienação, como categoria sociologicamente constatada e operacionalmente
utilizada, permite-nos, finalmente, uma colocação sobre o problema do normal
e do patológico na ciência social. Cremos, realmente, que só através dela e
possível um equacionamento válido da questão, que tem oscilado entre os extremos
igualmente inaceitáveis de apelo a uma "natureza humana" anterior
à sociedade e do conservantismo que considera normal e socialmente aceito, e
vice-versa.
A proposição fundamental é de que não existe uma incompatibilidade entre a
tese de que a essência do homem é o próprio homem em sociedade, o conjunto das
relações sociais(97), e a consideração de dadas formações como patológicas,
socialmente negativas. Com efeito, a possibilidade de uma valoração do fenômeno
social parece se extinguir quando se considera que o homem não é nada além do
que ele mesmo enquanto participando da sociedade, e se afasta qualquer perspectiva
de uma definição da essência humana fora das relações sociais concretas. A negação
desta possibilidade, como a-científica, conduz a considerar o patológico como
o excepcional à regra, e assim, socialmente desaprovado. A partir desta perspectiva,
o conservadorismo é inevitável, sendo impossível qualquer sociologia que considere
o fenômeno social como normalmente em transformação.
Se o fenômeno social é considerado em processo, no entanto, dotado de contradições
socialmente manifestadas e superadas ou em vias de superação, o normal e o patológico
- o alienado e o desalienante - serão dados do próprio processo social, que
caberá ao estudioso caracterizar. Os critérios valorativos são um dado da própria
realidade, do próprio objeto de conhecimento, e não apenas pertencentes ao estudioso
como "coeficiente existencial", que cumpriria eliminar. ou que seria
por ele acrescentado ao objeto determinado neutramente.
Onde então, entre as diversas valorações concretamente existentes, o critério
para a escolha? Se a verdade histórica é construída pelos homens, não teremos
senão a posteriori um critério absoluto de escolha, a não ser por uma fuga abstrativa
que, ao se concretizar, recai na mesma imprecisão anterior. Entretanto, critérios
aproximativos existem. Consideramos mais válida, conforme nossa linha de exposição,
a perspectiva que seja a mais racional, o que significa: que opere com as categorias
de totalidade e radicalidade. Assim, consideramos mais válida a perspectiva
que considere o objeto analisado como parte de uma totalidade, em uma época
em que a perspectiva total é fundamento de toda a ciência do homem(98).
Uma perspectiva que veja, em cada fenômeno social, sua característica de ato
ou obra humana, ou alienação do homem, processo de realização e irrealização
da vontade humana. Que consiga situar cada fenômeno valorado negativamente na
totalidade do processo social , e assim explicá-lo em profundidade, explicitando
inclusive as razões que levam a esta valoração, etc., sem recorrer a critérios
externos à própria realidade e social.
Chegamos, neste ponto como nos demais, à mesma postura metodológica. A consideração
do o normal e do patológico implica, ao lado suas exigências de máxima racionalidade,
a inserção do fenômeno dentro de uma hipótese de trabalho que, por ser empiricamente
indemonstrável, pelas implicações que acarreta a toda a atividade intelectual
do estudioso, e pela identificação com um poder de vontade concretamente existente,
equivale, no plano vivido, a uma opção existencial do sociólogo. E nada há que
estranhar nisto, se a própria sociedade é a construção do homem por ele mesmo,
enquanto ser que aspira à liberdade.
Notas:
1. Hegel, La Phénoménologie de L'Esprit, trad.
Jean Hippolite, Aubier, Paris, 1947; Jean Hyppolite, , Genèse et Structure
de la Phénoménologie de L'Esprit, Aubier, Paris, 1946; J. Hyppolite, Études
sur Marx et Hegel, Marcel Rivière, Paris, 1955; K. Marx, Economie Politique
et Philosophie, ed. Costes, Paris, 1953; Guy Caire, L'Aliénation dans
1'oeuvre de jeunesse de K. Marx, Faculté de Lettres Aix-en-Provence, 1957.
2. Phénoménologie, p. 164.
3. Études sur Marx et Hegel, p. 102.
4. G. Luckacs Der Junge Hegel, cit. por Hyppolite,
Études...,p.82 e ss..
5. Guy Caire, L'aliénation... , p. 54.
6. K. Marx, Oeuvres Philosophiques VI ("Économie
Politique..."), p. 93.
7. Hyppolite, Études..., p. 95.
8. Marx, "Thèses sur Feuerbach," 1, in Oeuvres
Philosophiques VI
9. Marx, "Économie Politique...", p. 91.
10. id., ibid., p. 92
11. id., ibid., p. 87
12. id., ibid., p. 107
13. id. ibid., p. 12
14. id, O .P. IV, p. 72
15. id, O. P. I, p. 83
16. id, O. P. VI, p. 22/3.
17. "La aliénation comme concépt sociologique,"
in C.I.B,vol XVIII, 1955.
18. op. cit.,p.57.
19. id. ibid, p. 50.
20. cf. Henry Lefebvre, La Somme et le Reste,
p.116. La Néf, Paris, 1959.
21. "Thèses sur Feuerbach," 2.
22. Critique de la Vie Quotidienne, L'Arche Editeur,
Paris, 1958. (23) .
23. id. ibid., p. 159
24. La Somme et le Reste, p. 605.
25. Pierre Naville, De l'aliénation a la jouissance,
26. op. cit., p. 492.
27. K. Marx, "Critique de la Philosophie de l'État
de Hegel", in Oeuvres Philosophiques, t. IV; "Contribution
à la critique de la Philosophie du Droit de Hegel", ibid., t. I; "La
question juive", ibid, etc.
28. Herman Heller, Teoria del Estado, ed. Fondo
de Cultura Económica, p. 131 (1955).
29. "La question juive," p. 201.
30. id., ibid.
31. Marx, O. P., IV, p.72.
32. id. ibid., p. 100.
33. Heller, op. cit., p. 76.
34. Lefebvre, Critique de la Vie Quotidienne,
p. 76/7.
35. Lefebvre, La Somme et le Reste, p. 183; "Trajetória
da dominação," in Mosáico, no. 4, (DCE. da U M G.)
36. Victor Nunes Leal, Coronelismo, Enxada e Voto:
O município e o regime representativo no Brasil ed. Revista Forense, Rio,
1949.
37. p. 8.
38. Oliveira Viana, Instituições Políticas Brasileiras,
2 vol, ed. José Olímpio. 2a. ed. 1955.
39. op cit., p. 197
40. op. cit., p. 203.
41. Caio Prado Jr. História Econômica do Brasil,
ed. Brasiliense, S. Paulo, 5a. edição 1959, p. 23.
42. Inácio Rangel, Dualidade Básica da Economia Brasileira,
ISEB, 1957, p. 35.
43. Caio Prado Jr., op cit., p.57; Victor Nunes Leal, op.
cit.,p.47.
44. Raymundo Faoro, Os Donos do Poder, ed. Globo,
p.128 e ss.
45. id. ibid., p. 106.
46. V. N. Leal, p. 182
47. id., p. 26
48. Orlando de Carvalho, "Os partidos políticos em
Minas Gerais," Revista Brasileira de Estudos Políticos no. 2,
p. 104.
49. id. ibid.
50. V. N. Leal, op. cit., p. 67/8.
51. V .N. Leal. op. cit., p.46.
52. id. ibid., p. 31
53. Raymundo Faoro, op cit., p. 267.
54. V. N. Leal, op. cit.,p. 50.
55. Cf. V. N. Leal, op. cit, cap. VI; O. Viana, op. cit,
cap. XIX, passim.
56. Cf. V. N. Leal, op. cit., p.176/7.
57. id. ibid., p.12.
58. C .Lefort, art. cit., p. 46/7.
59. Oliveira Viana, op. cit., p. 420
60. "O grande movimento democrático da revolução francesa;
as agitações parlamentares inglesas; o espírito liberal das instituições que
regeu a República Americana, tudo isto exerceu e exerce sobre nossos dirigentes,
políticos, estadistas, legisladores, publicistas, uma fascinação magnética,
que lhes daltoniza completamente a visão nacional dos nossos problemas. Sob
esse fascínio inelutável perdem a noção objetiva do Brasil real e criam para
uso deles um Brasil artificial, e peregrino, um Brasil de manifesto aduaneiro,
made in Europe..." Oliveira Viana, Populações Meridionais do Brasil,
p. XXVIII/XXIX (prefácio de 1918), Brasiliana, 4ª Ed.
61. Instituições Políticas Brasileiras, p. 395.
62. ibid.,p. 613
63. ibid, p, 636
64. K. Marx, Le Capital, t. I, p. 88, Ed. Sociales,
Paris.
65. id. ibid., p.92.
66. Alvine, op. cit., p. 216
67. id. ibid., p.217
68. id ibid., p. 361
69. op cit., p. 183
70. op. cit., p. 188
71. Yves Lacoste, Les Pays Sous-Développés, P.U.F.
(Que sais-je? 853), p. 116; G. Myrdall, Solidaridad o Desintegración,
ed. Fondo de Cultura Económica, 1956, p. 215.
72. Y. Lacoste, op. cit.,p. 114, citando Nurkse.
73. id. ibid., p. 115.
74. id. ibid.,p.117
75. id. ibid., p. 117
76. Paul A. Baran, La Economía Política del Crecimento,
ed . Fondo de Cultura Económica, 1959, p.60.
77. Y, Lacoste, op. cit, p. 116.
78. Hélio Jaguaribe, Condições Institucionais do Desenvolvimento,
ISEB, 1958, p. 41/2.
79. H. Jaguaribe, O Nacionalismo na Atualidade Brasileira,
ISEB, 1958, p. 44
80. id. ibid., p.99.
81. Celso Furtado, Perspectivas da Economia Brasileira.,
ISEB, 1958, p.20/l.
82. Celso Furtado, op. cit., p.19.
83. V. N. Leal, op. cit., p.189
84. cf. p. 10.
85. cf. p. 13.
86. Heller, p. 11
87. Heller, op. cit., p. 72
88. Op. cit., p. 24.
89. Op. cit., p. 67
90. ibid., p. 81.
91. G. Gurvitch, "Hyperempirisme Dialectique,"
Cahiers Internationaux de Sociologie, vol. XV.
92. op. cit., p. 69/70.
93. Marx, O. P.,I, p. 97.
94. (9)G. Gurvitch, Déterminismes Sociaux et Liberté Humaine, p. 29.
95. Cf. G. G. Granger, "Évenement et Structure dans les Sciences de l'Homme," Cahiers de l'ISBA, Paris, n. 55.
96. G. Gurvitch, Déclaratíon des Droits Sociaux, Paris, Vrin, 1946.
97. cf. p. 4.
98. cf. p. 4.
<