SIMON SCHWARTZMAN, HELENA MARIA BOUSQUET BOMENY, VANDA MARIA RIBEIRO COSTA
1ª edição: Editora da Universidade de São Paulo e Editora Paz e Terra, 1984 - 2ª edição, Fundação Getúio Vargas e Editora Paz e Terra, 2000.Uma universidade não é o que os espíritos simplistas imaginam: uma reunião material de diversas faculdades, ou, mesmo, a articulação de diferentes faculdades esparsas, sob esta pomposa denominação, a fim de que continuem, isoladamente, a fornecer diplomas para as profissões normais. Sem um plano de conjunto que vise a investigação, a pesquisa, o estudo, o conhecimento, a cultura, num ambiente propício e materialmente aparelhado para elevar os conhecimentos acima do nível comum e da simples missão de diplomar doutores, não se terá nunca uma universidade. Esta nasce - falo de modo genérico - para criar uma cultura real e direta, haurida no próprio meio, desenvolvida com os elementos que se fornece à livre expressão. Será o centro de preparo técnico, de aparelhamento de elite que vai dirigir a nação, resolver-lhe os problemas, preservar-lhe a saúde, facilitar-lhe o desdobramento e a circulação de riquezas, fortalecer a mentalidade do povo, engrandecer sua civilização.(1)Essas palavras mostram de maneira nítida o grande papel que Capanema atribuía ao projeto universitário, certamente o mais ambicioso segmento do seu programa educacional. Para ele, era mais importante o preparo das elites do que a alfabetização intensiva das massas. Só com verdadeiras elites se resolveria, não somente o problema do ensino primário, mas o da mobilização de elementos capazes de movimentar, desenvolver, dirigir e aperfeiçoar todo o mecanismo de nossa civilização. Não se tratava, simplesmente, de uma elite de escritores e artistas: "A elite que precisamos formar, ao invés de se constituir por essas expressões isoladas da cultura brasileira, índices fragmentários da nossa precária civilização, será o corpo técnico, o bloco formado de especialistas em todos os ramos da atividade humana, com capacidade bastante para assumir, em massa, cada um no seu setor, a direção da vida do Brasil: nos campos, nas escolas, nos laboratórios, nos gabinetes de física e química, nos museus, nas fábricas, nas oficinas, nos estaleiros, no comércio, na indústria, nas universidades, nos múltiplos aspectos da atividade individual, nas letras e nas artes, como nos postos de governo. Elite ativa, eficiente, capaz de organizar, mobilizar, movimentar e comandar a nação."(2)
Não são os dons intelectuais que faltam à sua bela juventude; ao contrário, ela os tem em abundância. Mas a boa fada que lhe preside o nascimento colocou também no berço outros dons além da inteligência: o gosto da imaginação e do sonho, a abundância da vida afetiva. E ainda que não se trate, de nenhuma forma, de combater estas disposições naturais, será muito útil limitá-las, sobretudo nos domínios que lhes convém mais particularmente. O Brasil possui admiráveis líricos, sem dúvida porque o lirismo é inerente à raça e todo brasileiro é, à sua maneira, poeta da alma e da natureza, mas este lirismo pode ter seus inconvenientes quando se manifesta fora das obras de poesia e da imaginação; e as fundações universitárias que o senhor está preparando deverão como resultado canalizá-lo e moderá-lo nas obras da razão, de onde não seria o caso, evidentemente, de exclui-lo totalmente.A carta continua neste tom e afirma, mais adiante, estar o Brasil em um momento histórico onde caberá decidir se ele continuará "um país cheio de charme onde se lê tudo e se produz pouco, ou terá amanhã um lugar adequado entre as nações que colaboram na produção intelectual do mundo." Quanto à faculdade de filosofia propriamente dita, ela deveria formar professores secundários e pesquisadores e havia muito menos a fazer no campo científico do que no campo filosófico, histórico e literário: "É nestes últimos domínios", dizia Dumas, "que o esforço me parece ser mais urgente, e sem dúvida mais difícil."(20) Dumas intermediaria a contratação de professores franceses para a Faculdade Nacional de Filosofia e em 1939 escreveria uma carta a Capanema apoiando a extinção da Universidade do Distrito Federal. Essa carta seria utilizada pelo ministro como resposta às criticas que recebeu da intelectualidade liberal do país.
Projeto da Universidade do Brasil (Lei nº
452, de 5 de julho de 1937) |