FORMAÇÃO DA COMUNIDADE CIENTIFICA NO BRASIL, Simon Schwartzman, Nacional/ Finep, 482 pp. 148,00

"História e sociologia da ciência,", comentário de Paulo Sérgio Pinheiro, Veja, 9 de maio de 1979, p. 81.

"Mas, afinal, o senhor poderia nos dizer qual seu interesse em fazer a história da ciência no Brasil?" Foi essa a pergunta que, num seminário nos EUA, um debatedor fez a Simon Schwartzman, que apresentava uma das partes do estudo agora publicado. Evitando irritar-se com a questão, muito reveladora de uma visão etnocêntrica da escolha de temas de pesquisa, Schwartzman pacientemente respondeu mostrando a inexistência de estudos na área e a sua importância para os debates sobre política científica e tecnológica num país do Terceiro Mundo.

Para nós, obviamente, a pergunta é descabida. Tanto como a relevância do trabalho é evidente. Toques pessoais ou comentários do livro tendem a deslizar para o cabotinismo, mas, no caso, me permito o risco. Durante seis meses, no ano passado, colegas no Wilson Center, em Washington, almoçamos e discutimos praticamente todos os dias em torno da ciência no Brasil. É difícil, portanto, manter um distanciamento faz-de-conta diante do livro que, com entusiasmo, vi surgir. O que me encanta nos trabalhos e no debate intelectual de Schwartzman é essa capacidade, rara na paróquia das ciências sociais, de tentar sempre uma visão mais complexa das questões, escapando ao senso comum e aos esquematismos empobrecedores.

Creio que a pesquisa extensiva de Simon Schwartzman se beneficiou intensamente dessa qualidade. O material fundamental do livro está nos fascinantes depoimentos de membros da comunidade científica brasileira recolhidos por sua equipe. Mas que ninguém se assuste: não se trata de mais um massudo ajuntamento de história oral. O resultado é um relato vivo, imbricado com a história das instituições e com o estudo da sociedade brasileira, especialmente desde o final do século XIX.

Neste momento de debate das estruturas de educação e da universidade em particular, é bom podermos contar com o repasse da história dos movimentos pela educação e pela ciência a partir dos anos 20. Há largos capítulos dedicados á criação da Universidade de São Paulo e ás origens do financiamento externo, providenciais para o atual debate. Justamente, aliás, teria sido impossível uma pesquisa tão ampla sem o apoio de uma das instituições do Estado que mais animaram, nestes tempos recentes, a produção científica inovadora: a Finep - Financiadora de Estudos e Projetos. O livro de Schwartzman é uma prova irrefutável de que essa orientação não pode ser interrompida. <