Lies, damn lies, and statistics

Como ex-presidente do IBGE, não posso subscrever a esta famosa frase que atribuem a Disraeli, e as vezes também a Winston Churchill: “existem três tipos de mentira: mentira, mentiras malditas, e estatísticas!” Também atribuem a Disraeli outra frase: “a única estatística na qual você pode acreditar é a aquela que você mesmo falsificou! ”

Não é verdade. Na área das estatísticas da pobreza, o IBGE vem coordenando desde 1997 um grupo de trabalho das Nações Unidas sobre o tema, e já existe um forte consenso internacional a respeito das diferentes maneiras de medir e avaliar as condições de pobreza de um país, uma região ou um grupo social. Basta percorrer um pouco esta literatura para vermos que não existe uma maneira única e simples de medir a pobreza, mas um leque de alternativas, cada qual com suas qualidades e suas limitações: pobreza absoluta, pobreza relativa, medidas relacionadas à renda, medidas relacinadas ao consumo de alimentos, às condições de saúde…

Isto não significa que não possam haver diferentes maneiras de usar e interpretar os indicadores disponíveis, como revela o debate entre Claudio Considera e Marcelo Neri relatado aqui, mesmo quando todos utilizam a mesma informação, no caso os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE (PNAD). É por isto mesmo, também, que eu não penso que seja uma boa idéia definir uma linha de pobreza oficial para o país. Isto significaria adotar, arbitrariamente, uma das diferentes medidas disponíveis, e usá-la para avaliar políticas e criar direitos para determinadas pessoas e regiões, ao invés de tratar de forma diferenciada as diferentes situações de pobreza que existem no país, na área rural, nas cidades, entre os jovens, os velhos, a população indígena, etc.

Quanto à polêmica em si, minha única observação é que não gosto do uso de percentagens sobre percentagens como medida de evolução ou mudança. Veja por exemplo o que acontecia com a frequência à escola para alunos do quinto mais pobre da população, entre 8 e 13 anos de idade, em relação aos que recebiam ou não a bolsa escola em 2003, conforme a PNAD 2003. Para os que não recebiam a bolsa, a percentagem de ausentes à escola era de 2,7%. Para os que recebiam a bolsa, a percentagem de ausentes era 0,7%. Dividindo um pelo outro, poderíamos concluir que o programa de bolsa escola tinha um fortíssimo impacto neste grupo, já que diminuia a ausência escolar em quase quatro vezes. Olhando pelas diferenças de percentagem, no entanto, a conclusão é oposta: para este grupo, a diferença é de 99.3 para 97.3, ou seja, um aumento de 2% somente, o que significa que o impacto do programa era praticamente nenhum (a análise completa está disponível aqui).

Author: Simon Schwartzman

Simon Schwartzman é sociólogo, falso mineiro e brasileiro. Vive no Rio de Janeiro

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