O local e o universal na educação

Teatro Jose de Alencar
Teatro José de Alencar, Fortaleza

Na abertura do Encontro Cearense de Historiadores e Geógrafos da Educação, em maio de 2009 em Fortaleza, fiz uma apresentação discutindo a questão do local e do universal em educação, a partir de uma releitura do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932.

Na conclusão, argumento que “a educação deveria ser o lugar ideal para criar as pontes entre o mundo local e o universal. Em um país como o Brasil, em que praticamente todos falam a mesma língua, apesar das diferenças regionais e sociais, e em que as raças e culturas se misturam, o que as pessoas têm em comum é seguramente maior, e tão ou mais significativo, do que elas possam ter de próprio e de específico. À primeira vista, uma educação voltada para o fortalecimento e expressão das identidades particulares e impregnada pelos valores da criatividade e do descobrimento, no lugar da cultura universal e das pedagogias dogmáticas e impositivas, seria o melhor caminho para motivar os estudantes e contribuir para o seu desenvolvimento, e o de suas comunidades, em todos os aspectos. Mas, levada ao extremo, esta orientação pode ter resultados negativos, impedindo que as crianças tenham o acesso à cultura mais universal, e não adquiram os conhecimentos e as competências indispensáveis para conhecer, viver, trabalhar e poder fazer suas escolhas nas sociedades contemporâneas. Isto requer, além de motivação, o aprendizado do trabalho ordenado e da disciplina, e a adoção, por parte dos educadores, de métodos e materiais pedagógicos adequados que permitam aos estudantes, sobretudo os menos favorecidos, adquirir estas competências e estes conhecimentos. Assim como é difícil “falar em línguas”, é também difícil encontrar os caminhos para a combinação frutífera e criativa entre o local e o universal, do conhecimento de si e do conhecimento do outro, que buscava Mário de Andrade, e que continua sendo o grande desafio para os que se interessam pela educação no nosso país.”

O texto completo está disponível aqui.

Author: Simon Schwartzman

Simon Schwartzman é sociólogo, falso mineiro e brasileiro. Vive no Rio de Janeiro

7 thoughts on “O local e o universal na educação”

  1. Eu acho que ganhamos sim, até porque a gente tem que poder influenciar esse mundo, e para isso temos que conhece-lo. Mas eu acho que isso nao significa que a gente nao pode ser critico ao mesmo tempo, aprender sobre outras partes do mundo (que alias estao ficando relativamente mais importantes e com mais recursos), e recuperar os recursos que a gente tem. Enfim, essas coisas somam, nao sao exclusivas uma da outra

    1. Luisa:

      Concordo totalmente com sua posição.Para pintar minha aldeia de torná-la universal eu preciso saber situar as especificidades do singular no universal.

  2. Eu colocaria esta pergunta ao revés: será que para fortalecer nossa identidade local tem que ser necessariamente nos desligando do mundo do Norte? Nao teremos nada a ganhar por questionar isto?

  3. Eu tambem nao li o texto todo, mas me parece que a gente deveria discutir o que e’ universal tambem. Ou seja, quando a gente aprendeu “historia do mundo” na escola, a gente estava aprendendo principalmente historias da Europa e dos Estados Unidos. Quase nao aprendemos nada sobre a Asia, a Africa e o resto da
    American Latina. Sera’ que ser universal tem que ser necessariamente nos ligarmos com o mundo do Norte? Nao teremos nada a ganhar por questionar isso?

  4. No texto completo, que precisa ser baixado do “link” para ser lido, eu explico o que estou chamando, de forma simplificada, de “cultura universal”:

    “No fundo, existe uma questao mais ampla, colocada por Mario de Andrade nos
    anos 20, e ate hoje nao respondida, que é a de como, a partir de uma cultura
    local, produzir uma cultura universal. Para muitos, este seria um falso problema. Em uma visao mais radical, nao existiria uma “cultura universal”, mas uma cultura das elites dominantes, e o papel da educacao seria fortalecer as culturas alternativas, populares, que pudessem substitui‐la. Para outros – entre os quais eu incluiria a Mario de Andrade, e tambem me filiaria – esta seria uma falsa dicotomia. Embora nao exista uma “cultura universal” unica, existe um mundo cada vez mais complexo e amplo de alternativas, possibilidades, escolhas e oportunidades de trabalho, lazer e estilos de vida que só estao acessiveis a quem possua os recursos que só a educacao de qualidade pode proporcionar – a capacidade de ler e se comunicar no padrao da lingua culta, se possivel em mais de uma; a capacidade de entender o mundo das quantidades, dos valores e das estatisticas; e o entendimento dos limites, mas tambem das possibilidades que as novas ciencias e tecnologias tem criado e desenvolvido.”

    Me parece claro que a posição do comentarista é, justamente, a que estou chamando de “visão mais radical”, e com a qual não concordo, sem precisar “recorrer à raça” para nada.

  5. Caro Sr. Simon Schwartzman,

    Separei do seu discurso, o trecho abaixo, para, em função de meu assombro, tecer um simples e inofensivo comentário.

    “Em um país como o Brasil, em que praticamente todos falam a mesma língua, apesar das diferenças regionais e sociais, e em que as raças e culturas se misturam, o que as pessoas têm em comum é seguramente maior, e tão ou mais significativo, do que elas possam ter de próprio e de específico. À primeira vista, uma educação voltada para o fortalecimento e expressão das identidades particulares e impregnada pelos valores da criatividade e do descobrimento, no lugar da cultura universal e das pedagogias dogmáticas e impositivas, seria o melhor caminho para motivar os estudantes e contribuir para o seu desenvolvimento, e o de suas comunidades, em todos os aspectos. Mas, levada ao extremo, esta orientação pode ter resultados negativos, impedindo que as crianças tenham o acesso à cultura mais universal, e não adquiram os conhecimentos e as competências indispensáveis para conhecer, viver, trabalhar e poder fazer suas escolhas nas sociedades contemporâneas.”

    Há tempos venho assistindo seu duro embate contra a proposição de cotas para a inserção social e econômica da população negra, envidando em seus inúmeros argumentos que a questão baseada em aspectos inerentes à raça, implica em um imenso retrocesso no processo de construção da igualdade de oportunidades. Então, não consigo conter minha surpresa, quando “vosmicê” recorre a raça para explicitar a mistura bem brasileira, notadamente marcada pela intencionalidade de entronização de um padrão cultural marcadamente racista, posto que se erigiu a partir do pressuposto da destruição e aniquilação das demais manifestações culturais, no caso, negra e indígena. Me restou uma questão: o que é, na sua opinião, “Cultura Universal”?

    Edson Roberto de Jesus

  6. Prezado Simon:

    Seu texto está muito bom, tratando de um tema, ao meu ver, de maior relevância para a discussão contemporânea do lugar da escola na vida do cidadão.

    Foi muito boa a lembrança do suposto esquecimento dos Pioneiros da figura de Macunaima em seu referencial teórico ou da revolução cultural das minorias pela antropofagia.

    Acredito que todos os sistemas de ensino estão vivendo este mesmo problema: como levar os estudantes a se situar no mundo e interagir com ele( a partir de onde estão) em uma sociedade cada vez mais globalizada e complexa.Não acho que a escola está dando conta do recado.

    A cultura universal é um caminho de integração entre mentes, sempre foi, mas acho que a escola está ritualizando o acesso a esta cultura, sem fazer a mediação entre o local e o universal.Ela está cada vez mais escolástica, em um mundo, que cada vez mais busca a participação.

    Engraçado: justamente, quando, na historia da humanidade, o acesso à escola torna-se um valor universal para todos os povos, a instituição escolar entra em uma crise sem precedentes.

    Está instituição está abeira da explosão.Recomendo, além de seu ótimo texto, o filme: Nas Paredes da escolas, versando sobre as contradições da escola fundamental francesa(durante muito tempo, exemplo de qualidade para o mundo).

    Atenciosamente,
    Ana Maria Rezende Pinto

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.

WP Twitter Auto Publish Powered By : XYZScripts.com
Wordpress Social Share Plugin powered by Ultimatelysocial