Reproduzo o artigo publicado na Folha de São Paulo de 12/1/2016, sobre o que pode acontecer ou não com a Base Nacional Curricular Comum elaborada pelo Ministério da Educação:
O Brasil desacostumou-se do debate. A sede de novidades e a ideologia do consenso tiraram da mídia o espaço e a motivação para aprofundar ideias.
O mundo acadêmico, especialmente as universidades brasileiras, também parece ter renunciado definitivamente ao confronto de opiniões. No caso do currículo nacional ,o MEC impôs a “consulta pública”, ou seja, o envio de mensagens eletrônicas para um buraco negro como única forma de manifestação da sociedade civil, sem direito a um confronto direto de posições.
Não sabemos quais são os autores e, mesmo diante das poucas críticas apresentadas aqui e ali em artigos assinados, ninguém ousou defender as propostas. Nem sequer sabemos se são de autoria ou editadas pelo MEC.
Apenas o currículo de história, no qual a proposta oficial exagerou nas aberrações, mereceu um pouco mais de espaço na mídia. Fora disso, houve reuniões aqui e ali, e, segundo noticia a imprensa, mais de 9 milhões de sugestões foram encaminhadas à caixa preta. Não é assim que se faz um currículo em nenhum país do mundo. Resta esperar pelos desdobramentos.
Quanto ao desenrolar dessa novela –ou tragédia–, há três posições majoritárias. Alguns, que preferiram não se mobilizar, garantem que o assunto não vai dar em nada, que o MEC vai mexer e remexer, fazer mais consultas públicas e, se chegar a enviar uma proposta para o CNE (Conselho Nacional de Educação), ela vai ser engavetada.
Outros acreditam que o documento é salvável, que os erros, mesmo sendo graves, são consertáveis, que vale a pena elaborar análises e críticas, na esperança de que, usando de canais privilegiados de acesso, será possível influir no resultado.
Na terceira hipótese, o MEC parece decidido a acreditar que promoveu um debate, que mobilizou a sociedade, que os erros apontados são questões triviais e que irá em frente com a proposta.
Uma quarta posição, que tentei fomentar com outras pessoas, era promover um verdadeiro debate. Não despertamos qualquer interesse.
O Brasil perdeu a oportunidade de travar um debate, oportunidade ímpar quando se trata de elaborar um currículo: para que deve servir a escola? Se for para ensinar, o que ela deve ensinar? Quando? Quem deve definir os conteúdos? Quais critérios usar para elaborar um currículo? Quem deve participar dos diferentes momentos do debate?
Deve-se fazer isso de uma vez ou aos poucos, com focos nas disciplinas mais básicas? Não sabemos ao menos o significado da divisão entre 60% de conteúdo comum e 40% facultativos. O MEC nunca se preocupou em responder.
Não existe uma resposta única nem um caminho único para elaborar um currículo nacional. Mas se examinarmos o que ocorreu nos países que lideram o ranking da educação no mundo, vamos entender que perdemos uma oportunidade para debater questões fundamentais para o futuro da educação.
Ficamos apenas com um currículo cuja principal característica é a uniformidade ideológica, mas sem respeitar os fundamentos básicos de um processo aberto de confronto de ideias. Não falta um currículo, falta vontade para o debate. Não houve disposição para promover, exigir e manter esse debate. Foi assim que caíram todos os impérios.
Boa tarde.
A tentação é a de descer o malho. No entanto, quando não há surpresa , apenas desalento, fica difícil criticar o que fez ou deixou de fazer um dos ministérios .
Desalento pois se trata de repetição de “modus operandi” já visto.
No daso da Educação,é imperioso não permitir-se esquecer que uma das diretrizes político-ideológicas de segmentos do estamento político vem a ser a Revolução Cultural. Que busca alterar a cultura de uma sociedade ou partes dela, visando implantar uma confusa vertente de socialismo dito moderno.
Percam ou ganhem um tempo precioso assistindo o Filme : A que Horas Ela Volta. Ficando atentos à fala da moça que vem do nordeste impregnada do que lhe foi dito por um professor de História.
Cordialmente, AJSCampello
Um debate verdadeiro seria útil, mas não sei se esse documento é o ponto de partida apropriado. O debate pode se politizar e partidarizar, e se prender ao documento, que é um horror. Daí depois do engavetamento (que palpito ser a hipótese mais provável), o debate terá sido esforço perdido.
Gostei muito do artigo! Acho que há sim ausência de debate. Só discordo de que ela se deve apenas a falta de vontade ou a uma desistência espontânea, ainda que isso de fato possa ser um problema.
Há patrulhamento ideológico em nossos campi, afetando professores e estudantes. Há sanções e benesses para os que se posicionam de um modo ou outro. No cálculo de custo e benefício, a comunidade acadêmica tem encontrado muitas razões para se calar que não apenas a preguiça.