Pelo fim do presidencialismo imperial

2192_1A discussão do impeachment, além da decisão que deve ocorrer nos próximos dias, coloca a questão de se o Congresso e o Judiciário têm ou não legitimidade para limitar e, no limite, destituir uma presidente eleita pelo voto direto. No regime imperial absolutista, como nos regimes militares, este poder não existe. No regime democrático, ele existe e deve ser exercido quando necessário.

Um dos argumentos que tem sido apresentados contra o impeachment é que o crime não está claramente tipificado, e que aprovar o impeachment nestas condições significaria um abuso do poder do Congresso. Cada um é livre de aceitar ou não os argumentos dos advogados que propuseram o impeachment ou a defesa do governo. Mas a questão central é que a decisão não é legal, do Judiciário, mas política, do Congresso. A rigor, nem deveria ser necessário tipificar um crime: levar a economia do país ao desastre, mesmo que feito de acordo com a lei e na melhor as intenções, já deveria ser razão suficiente.

A mesma questão se coloca na discussão sobre se a presidente pode ou não ser questionada pela nomeação de um ministro ou por outro ato por “desvio de função”, que não seja a do interesse geral. Aqui o problema é mais complicado, porque, como não existe uma definição objetiva do que seja o interesse geral, aplicável a cada caso, a Presidência ficaria sujeita a questionamentos permanentes, e não poderia funcionar. Por isto mesmo, a apreciação destas situações se dá pelo Judiciário, que pode estabelecer uma jurisprudência definindo com clareza o que é ou não questionável. e não pelo Congresso. Mas o Congresso deveria também ter o poder de confirmar e votar um voto de desconfiança contra ministros específicos, que deveriam sair.

O argumento a favor da presidência imperial é que, como a presidente é eleita pelo voto direto, ela não deveria ser passível de questionamento pelos demais poderes; e isto é reforçado pelos graves problemas e desprestígio que afetam o congresso brasileiro, a começar pelos presidentes das duas casas (como se o executivo estivesse melhor). Mas este é o argumento usado pelas ditaduras para fechar ou castrar os poderes do Legislativo, que foi o que os militares fizeram no Brasil no passado.

Bem ou mal, este é o Congresso que temos. Quando passar a tempestade, vamos ter que rever em profundidade nossas instituições políticas, colocando limites mais claros ao poder de arbítrio do Executivo, e melhorando a representatividade e responsabilidade pública dos membros do Legislativo.

Author: Simon Schwartzman

Simon Schwartzman é sociólogo, falso mineiro e brasileiro. Vive no Rio de Janeiro

5 thoughts on “Pelo fim do presidencialismo imperial”

  1. Sou contra o impeachment. Entretanto, quando encontro alguma análise com algum distanciamento crítico levo em consideração. Aqui, principalmente, gostei do princípio do “presidencialismo imperial”. Seria, então, uma oportunidade para discutirmos o parlamentarismo em nossas terras?

    Outra consideração com base na seguinte afirmação: “A rigor, nem deveria ser necessário tipificar um crime: levar a economia do país ao desastre, mesmo que feito de acordo com a lei e na melhor as intenções, já deveria ser razão suficiente.”

    Acredito que os problemas econômicos não foram apenas gerados pela presidenta e seu governo. E a crise internacional? E a oposição, bem como o próprio PT que não deixaram a Dilma implementar as políticas que propunha? Nem pudemos sequer testá-las. Eram sempre barradas!!!

    Consequência: Economia parada por uma crise política digna de tragédia grega. Não há presidenta que resista a essa febre insana em querê-la fora do governo a todo custo. Inclusive, com alegações de que ela tenha levado a economia ao desastre.

    1. Acredito que a crise atual deveria levar a uma discussão profunda sobre como reorganizar o sistema político e partidário do país. Não me parece que seja o caso de buscar um parlamentarismo puro, mas existem experiências internacionais bem interessantes de semi-parlamentarismo, como o da França, com um presidente eleito com responsabilidades de chefe de estado e um primeiro ministro aprovado pelo Congresso como chefe de governo, que poderíamos adotar.
      Quanto às razões da crise econômica, pelo que entendo ela começou com o rompimento das regras de responsabilidade fiscal e descontrole dos gastos públicos ao final do segundo governo Lula, e se acentuou no primeiro mandato de Dilma, com Guido Mantega. Apesar da crise internacional, as economias de todos os países da America Latina continuaram crescendo nos últimos anos,menos no Brasil e na Venezuela. Não foi culpa da oposição. A campanha de Dilma negou a existência do problema, que foi reconhecido na posse com o convite a Levy para Ministro da Fazenda, que acabou desistindo por falta de apoio dentro do governo. Daí a crise de credibilidade, que alimenta a crise política (e não o inverso, no meu modo de entender).

  2. Seria melhor se o Brasil havia adotado um sistema parlamentar. A votação parlamentar de não-confiança parece ser o que se deseja agora.

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