Escreve Felipe F. Schwartzman:
Se a menor unidade de análise para os físicos são partículas elementares, para os cientistas sociais, são as pessoas e o uso que elas fazem de seu tempo. Uma pesquisa que já vem sendo feita há alguns anos nos EUA, a American Time Use Survey, propõe estudar exatamente isso através do uso de diários nos quais as pessoas colocam o que fazem em cada hora do dia. Depois de muitos estudos e achados interessantes, essa pesquisa teve seu orçamento cortado pelo congresso americano para 2009 pois o preço era considerado alto demais: 6 milhões de dólares.
Enquanto isso, o novo acelerador de partículas custou 8 bilhões. Ou seja, mais de 1300 anos da ATUS. Não é à toa que física tem condições de se proclamar uma “ciência exata”
É verdade que existe menos consenso entre os cientistas sociais do que entre os físicos, e isto talvez ajude a explicar a maior capacidade que têm os físicos de conseguir recursos para seus projetos. Os engenheiros aeronáuticos e militares também são capazes de conseguir grandes recursos para os programas espaciais, mas os geólogos nunca conseguiram mobilizar apoio para um projeto realmente importante de perfuração profunda da crosta terrestre.
Isto nos diz muito da capacidade dos diversos setores de se organizar e conseguir apoio, mas não diz nada da capacidade relativa dos respectivos projetos de conseguir resultados cientifica e tecnologicamene importantes. Por outro lado, na medida em que há mais dinheiro e gente trabalhando, a possibilidade de obter resultados é maior, embora os programas espaciais sejam um óbvio contra-exemplo.
É este o meu ponto.
Simon,
eu não afirmei que “estudos longitudinais de uso do tempo” não são considerados importantes. Minha crítica não foi comparar “estudos longitudinais de uso do tempo” vs “pesquisa em física de partículas”, mas sim este estudo específico vs o caso específico do lhc. O que afirmei, e contínuo afirmando, é que objetivamente, mesmo que seja por intersubjetividade, o lhc contribuirá para o desenvolvimento da Física, enquanto não consigo ver esse mesmo tipo de consenso em relação à essa pesquisa específica sobre o uso do tempo, portanto acho que a comparação não é adequada. Os estados unidos não disseram não às pesquisas sobre o uso do tempo, mas sim a essa pesquisa. Será que realmente todos os cientistas sociais reconheceriam ser ESTA pesquisa específica a merecedora desses 6 milhões como os físicos consideram este acelerador merecedor de todo o dinheiro investido?
E, acerca dos resultados, novamente você muda a escala da minha argumentação. Eu continuo afirmando que um experimento amplo como o do lhc proverá resultados mais importantes que qualquer eventual pesquisa específica em toda e qualquer área. Eu não argumentaria nesse sentido caso, por exemplo, o projeto fosse de não estudar o uso do tempo na sociedade estadunidense, mas um panorama trans-local, entre multiplas culturas. Talvez, nesse caso, poderíamos pensar em comparar ambos os projetos. Antes disso, não há comparação real.
E, apenas mais um detalhe: não há o mesmo nível de consenso entre cientistas sociais de o uso que as pessoas fazem do seu tempo é equivalente ao papel das particulas elementares em física. Todos, sem dúvida alguma, consideraram essa variável importante, mas no mesmo patamar que os físicos consideram as particulas elementares?
Simon, eu já li muita coisa sua e te acho um pensador notável, mas fico triste de ver que ao invés de tentar compreender meu argumento por completo tenha logo taxado o mesmo de preconceituoso. Ao assumir que meu argumento era geral e não específico, você leu coisas que não foram ditas.
Ao contrário do que diz Fábio, acho que todos os cientistas sociais que trabalham com dados reconheceriam a importancia de estudos longitudinais de uso do tempo, e de estudos longitudinais em geral, para entender melhor o comportamento das pessoas e o funcionamento das sociedades. Dizer que os eventuais resultados das pesquisas do LHC serao necessariamente mais importantes do que os eventuais resultados de avanços na pesquisa social me parece puro preconceito.
Enquanto há um consenso entre os físicos acerca de quais são “a(s) menor(es) unidade(s) de análise” em sua disciplina, não me parece que o mesmo acontece com as ciências sociais. 50 de 50 físicos, do mundo inteiro, defenderiam a importância do LHC. Será que 50 de 50 cientistas sociais defenderiam que os 6 milhões seriam bem utilizados? Ademais, será que compreender o que estadunidenses fazem o dia inteiro contribuira em um nível semelhante ao que o LHC pode contribuir? Ou mesmo em escala semelhante, de acordo com seus orçamentos? Não me parece que essa resposta seria afirmativa.