Quando o Walmart chega a uma pequena cidade, a população pode comprar produtos mais baratos e diferentes, mas muitos pequenos negócios fecham, e muita gente perde seu emprego, ou tem que aceitar as condições de trabalho que a grande empresa oferece. Para sobreviver, é preciso oferecer um produto diferenciado, um serviço mais pessoal e de melhor qualidade, mesmo que a a um preço maior, que os grandes supermercados não podem proporcionar. Será que isto está ocorrendo também no ensino superior privado no Brasil, com a entrada das grandes universidades privadas de ensino de massas? Existe ainda espaço para as pequenas faculadades familiares e personalizadas? Veja abaixo o desabafo do diretor de uma pequena instituição familiar no interior Paulista.
Escreve Robinson Ricci, diretor da ESEFAP:
Dirijo uma pequena (três cursos) IES no interior de São Paulo, criada em 1970 por um grupo de jovens profissionais liberais, então em torno de 35 anos. Estes foram, durante décadas, seus mantenedores/diretores, até que a segunda geração assumiu a direção (2007).
Como boa parte das pequenas IES, a que dirijo tem característica societária/familiar – os sócios não têm vínculo sanguíneo, mas, como disse, mantêm seus filhos na direção atualmente. Assim também ocorre com as outras duas instituições de ensino superior existentes na cidade. Tupã, ainda que no estado mais rico, está na segunda região mais pobre de SP, a Alta Paulista, até há bem pouco tempo tratada pelo jornal O Estado de São Paulo como “Corredor da Fome”. Há ainda um campus experimental da UNESP.
Vivenciamos as três IES particulares atualmente crise sem precedentes, que, num mea culpa tacanho, poderia debitar sobre a incompetência de seus dirigentes (com algumas poucas exceções), que insistem em manter, de certa forma, uma gestão quase desconectada do cenário atual da Educação particular brasileira, não fossem as avaliações do MEC. Há diversos outros fatores que explicam esta crise, como a questão cultural no interior, em que o profissional docente não sente diariamente a cobrança e a competição como nas grandes cidades. Ou ainda o perfil dos corpos docentes – que muda lentamente – composto em sua maioria por técnicos e não educadores.
Outra questão que poderia ser abordada é a demográfica (diminuição no nº de filhos) e mesmo o perfil do alunato das IES particulares: trabalhador, de baixa renda familiar, com péssima formação básica e, então, desacostumado a ler, a estudar. Uma última justificativa seria a ampliação das ofertas de escolas técnicas e a absorção desses jovens pelo mercado de trabalho.
Porém, esta crise pesadíssima e muito grave que vivencio hoje não parece ser apenas fruto de tudo isso, muito menos do perfil societário-familiar das pequenas IES da região, mesmo porque outras de maior porte, como universidades e centros universitários, que de alguma forma incrementaram a gestão, hoje um tanto mais profissional, também sofrem com a captação/fidelização de novos alunos e a alta inadimplência.
É, professor, infelizmente, e apesar de nossos esforços (o curso de Enfermagem desta instituição, quando da avaliação de reconhecimento, em 2008, recebeu conceito ótimo (5) ), estamos em um cenário devastador! Não me importa discutir se o ensino, mesmo o superior, também deveria ser unicamente público, mas a real situação das pequenas IES privadas e – ao menos parte de – seus dirigentes que um dia sonharam (e ainda insistem) em gerir sua instituição como um meio de transformar o ser humano (isso, apesar dos pesares, ainda tentamos) e, então, a realidade da região, a consciência do cidadão – de baixíssima auto-estima, e de todos os profissionais e suas famílias envolvidos, ou seja, sem demagogia, embora soe um hino piegas, nosso presente e nosso futuro.
No gabinente docente, coloquei há alguns anos um quadro com foto de Cora Coralina e sua frase: “Feliz aquele que transmite o que sabe e aprende o que ensina”. É triste ver os meios de comunicação discutindo a concentração do ensino superior em cinco ou seis grupos, que por sinal, como temos observado, padronizam e achatam o ensino, continuam captando recursos na Bolsa, demitem centenas de docentes, divulgam parcialmente seus resultados nos exames nacionais, enquanto nós, as pequenas IES, em grave crise, ninguém discute. Afinal de contas, para que servem as pequenas IES, professor?
Corremos o risco iminente de esquecer a poesia de Cora Coralina. E, sinceramente, não sei mais onde encontrar forças para mudar este cenário…
Simon,
eu gostaria de te fazer as perguntas que deixaste no ar em teu comentário. E mais: tu vislumbrarias algum meio de essas pequenas faculdades conseguirem se diferenciar dessas universidades de massa? O que elas poderiam fazer?
Um forte abraço!
V.
Acredito que a única possibilidade é que elas encontrem seus nichos especiais, o que não é facil. Um destes nichos pode ser o de proporcionar uma educaçao de melhor qualidade (e por isto mais cara), ou mais ajustada a um determinado público, enfatizando por exemplo a formação profissional técnica, ou voltada para um segmento especifico. No geral, é dificil, como sabemos, enfrentar a concorrência da Wall Mart.