Internacionalização dos doutorados brasileiros

University World News, uma publicação internacional sobre o ensino superior, publicou uma série três matérias de  sobre a mobilidade internacional dos estudantes de doutorado, cujo número  mais recente pode ser visto aqui.  Esta é a nota que preparei sobre a situação brasileira:

Os doutorados no exterior aumentam e diminuem, mas a maioria retorna

Com 190 milhões de habitantes e cerca de 592 mil residentes estrangeiros, o Brasil é uma sociedade relativamente fechada, apesar de uma longa história de comércio de escravos africanos até meados do século 19 e grandes fluxos de imigrantes portugueses, italianos e japoneses, alemães até a Primeira Guerra Mundial. Hoje, a maioria dos imigrantes vêm de Portugal, Japão, Itália, Espanha e países fronteiriços como Paraguai, Bolívia, Argentina e Uruguai. Cerca de um quinto – 140 mil – têm diplomas de ensino superior,e são principalmente de Portugal, Itália, Argentina e Espanha, de acordo com dados do Censo Demográfico de 2010.

Brasil tem formado cerca de 12.000 doutores por ano em suas universidades, ccomparado com 4.000 em 1998, que principalmente no sector do ensino superior e da pesquisa (77%). A maioria dos títulos são obtidos nas principais universidades do Brasil, incluindo as universidades estaduais de São Paulo e Campinas e as universidades federais do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, de acordo com dados do Ministério da Ciência e Tecnologia. Entre 1996 e 2006, de acordo com estudo publicado pela CGEE (CGEE 2010), as instituições brasileiras formaram cerca de  50.000 doutores. Destes, apenas 680 foram de pessoas nascidas fora do país, sendo o maior número da Argentina (126), Portugal (80) e Chile (59).

Estudantes brasileiros no exterior

Há também um constante fluxo de brasileiros indo obter seus diplomas no exterior, principalmente com bolsas de agências nacionais. No início de 1990, as agências brasileiras apoiavam cerca de 2.000 estudantes de doutorado por ano no exterior. Na medida em que o número de programas de doutorado no país aumentou, o número de bolsas de doutorado para estudos no exterior caiu, mas outros tipos de bolsas de estudo foram introduzidas. Em 2009, havia 3.760 brasileiros com bolsas de estudo no exterior, 783 deles em programas de doutoramento, 1910 em programas “sanduíche” – estudantes matriculados em cursos de doutorado no Brasil vão para o exterior por um ano ou mais – e 1067 em atividades de pós-doutorado.

Em 2011, o governo brasileiro anunciou o programa “Ciência Sem Fronteiras”, que pretendia enviar 100 mil estudantes ao exterior em quatro anos. A maioria dessas bolsas é para períodos de curta duração para estudantes de graduação, mas cerca de 10 mil era para programas de doutoramento – 2500 por ano – o que significa um retorno aos níveis do início da década de 1990 (Castro, Barros, Ito-Adler, e Schwartzman 2012). O programa é limitado às ciências naturais e tecnologia, partindo do princípio de que as ciências sociais e humanas continuariam a receber apoio de fora do programa.

Dados recentes mostraram que o ‘Ciência sem Fronteiras’ já tinha fornecido 22.000 bolsas, das quais 5.000 para o estudo nos EUA, 3.000 em Portugal e 2.500 em Espanha. Do total, apenas 825 eram para programas de doutorado completo, e 2.300 para pós-doutorados.

Dados do Instituto de Educação Internacional nos Estados Unidos mostram que, em 2011-12, havia cerca de 9.000 estudantes brasileiros nos EUA, marcando um aumento pequeno, mas constante, mas ainda muito aquém do número de estudantes da China, Índia, Coréia e até mesmo do México.

A fuga de cérebros não tem sido um problema

Em contraste com a Índia, China e, na América Latina, México e Argentina, o Brasil não sofre de um fluxo regular de cidadãos educados para o exterior. No passado, a maioria dos brasileiros que iam ao exterior para estudos de doutoramento com bolsas mantinham seus empregos e voltavam para melhores posições em suas instituições de origem (Glaser e Habers 1978). Na década de 1980, quando a economia estagnou, milhares de brasileiros se mudaram para os Estados Unidos, Portugal e Japão – os dekaseguis – para trabalho temporário em atividades não-qualificadas, e muitos voltaram como a economia melhorou a partir de década de 1990 (Carvalho, 2004).

A estimativa é que agora existem cerca de 1,5 milhões de brasileiros no exterior. Hoje, quem vai para o exterior com bolsas do governo têm que concordar em voltar ou pagar suas bolsas, e acordos internacionais impedem que eles obtenham status de residente nos países do estudo. No entanto, não há nenhuma garantia de que eles vão encontrar trabalho adequado ao voltar, embora haja bolsas de estudo que podem ser concedidas para recém doutores dispostos a trabalhar em universidades públicas.

Survey of Earned DoctoratesOs dados mais recentes do da Academia Nacional de Ciências dos EUA mostra que, dos 149 novos doutores brasileiros com vistos temporários em os EUA, 42% pretendiam ficar nos – uma proporção menor do que a de outros países latino-americanos (Argentina, México, Venezuela e Colômbia), todos com cerca de 60%, ou para a Índia ou a China, com cerca de 80% com a intenção de ficar. Não é certo que aqueles que estão pretendem ficar exterior vão realmente fazê-lo, mas, em újltima análise, não são sanções ou multas, mas a criação de oportunidades adequadas de trabalho, que vão trazer os que estudam no exterior de volta para casa.

Referências

Carvalho, José Alberto Magno (2004) “Migrações Internacionais do Brasil da nas Ultimas Duas Décadas do Século XX:. Algumas facetas de um Processo Complexo amplamente Desconhecido” Migrações Internacionais ea Previdência social: 11.

Castro, Claudio De Moura, Hélio Barros, James Ito-Adler e Simon Schwartzman (2012), “Cem Mil Bolsistas no exterior.” Interesse Nacional: 25-36.

CGEE (2010) “Doutores 2010: Estudos da Demografia da base de tecnico-scientifica brasileira”. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, em Brasília.

Glaser, William A e G Habers Christopher (1978), a fuga de cérebros: Emigração e Retorno; resultados de uma pesquisa comparativa multinacional UNITAR de profissionais de países em desenvolvimento que estudam no exterior. Oxford, New York: Pergamon Press

Universidades: nacionais, regionais?

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Dados do Censo do Ensino Superior 2011

Dados publicados recentemente pelo Ministério da Educação, e analisados em matéria do jornal O Globo, mostraram que São Paulo é o Estado que mais envia candidatos selecionados pelo sistema unificado de seleção (SISU, baseado no ENEM) para outras regiões do país.  Os dados mostram também que a área de medicina é a aquela em que mais estudantes migram de estado, 46%, o triplo da média geral (O Globo  17 e  25/5/2013).

 Interpretei isto como podendo significar que, ao invés de facilitar a mobilidade de estudantes de regiões mais pobres para outras mais desenvolvidas, tornando o ensino superior mais equânime deste ponto de vista, o SISU poderia estar tendo o efeito oposto, ao permitir que estudantes do Estado mais rico ocupassem as vagas nas universidades regionais, reduzindo assim as oportunidades de estudo da população local.

Esta conjectura levantou uma série de questões que precisam ser mais aprofundadas, algumas das quais estão analisadas em texto disponível  aqui.

Primeiro, qual é ou deveria a função das universidades públicas e, mais especificamente, das universidades federais?  Elas devem ser entendidas como instituições nacionais ou mesmo globais, abertas a estudantes de todas as origens e desenvolvendo trabalhos de pesquisa de valor universal, e neste sentido sua localização geográfica não seria relevante? Ou elas deveriam ser entendidas como instituições voltadas, pelo menos em parte, a atender às demandas de acesso à educação da população local, assim como realizar pesquisas e atividade de extensão de relevância também local ou regional?

A análise sugere que, embora o sistema de seleção unificada do SISU possa estar contribuindo para nacionalizar em certa medida as universidades federais, isto não chega a alterar o fato de que as instituições de ensino superior brasileiras sejam predominantemente locais, do ponto de vista da mobilidade dos estudantes, que é o que estes dados permitem ver. Existem diferenças em relação aos estados menores e de fronteira, que recebem e enviam mais estudantes para outras partes, e também por áreas de conhecimento, com destaque para a área de medicina e odontologia, que tende a operar em um marco mais nacional na seleção dos estudantes, em prejuízo dos estudantes de origem local.

Seriam necessários dados sobre pesquisas, atividades de extensão e emprego dos alunos formados para saber se, além de atender predominantemente à população local, as instituições de ensino superior estão atendendo de outras formas as necessidades e temas regionais, e contribuindo ou não para fixar os estudantes nos locais em que se formam. É possível supor que, além do SISU, outros mecanismos estão atuando para nacionalizar as instituições de ensino superior, incluindo as avaliações do ENADE, idênticas para todo o país, e, no setor privado, a crescente integração das instituições em conglomerados que buscam padronizar os cursos que proporcionam e, assim, ganhar economias de escala.

É um processo que ocorreu também no setor das comunicações, em que os jornais, rádios e estações de TV se integraram a redes nacionais, assim como na área financeira, com os grandes bancos nacionais que absorveram e substituíram os bancos locais, e assim por diante. É um processo inevitável, mas que não elimina o fato de que as pessoas, na sua grande maioria, vivem e permanecem nos locais em que nascem. A pergunta que fica é se, neste processo, a vida local não se esvazia, a capacidade de lidar com as questões do quotidiano, que são também em grande parte locais, se reduz, e se as instituições de ensino superior não deveriam ter alguma responsabilidade em lidar com isto.

Paulino Motter: IDEB Campeão

Escreve Paulino Motter (*):

IDEB campeão: as 10 lições de Foz do Iguaçu

Conhecida nacional e internacionalmente pelos seus atrativos turísticos, especialmente as cataratas e Itaipu, Foz do Iguaçu ganhou na última semana notoriedade pelo bom desempenho das suas escolas municipais no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). A sua rede de escolas municipais emplacou os cinco primeiros lugares entre as melhores do Paraná nos anos iniciais do ensino fundamental. Entre as 20 escolas paranaenses com maior IDEB, dez são de Foz.

O município também ganhou destaque na mídia nacional ao classificar três entre as dez melhores escolas públicas do Brasil. Se isso não bastasse, emplacou o primeiro lugar com a Escola Municipal Santa Rita de Cássia, que alcançou 8,6 no IDEB, mesma nota obtida pela Escola Carmelita Dramis Malaguti, do município de Itaú de Minas (MG).

Mas o que mais impressiona não é o fato de Foz concentrar o maior número de escolas entre as melhores do Paraná e do Brasil. Seu feito mais notável e digno de reconhecimento foi ter conseguido um IDEB médio de 7,0 para todas as 51 escolas da sua rede – bem acima das médias do Paraná e do Brasil para o primeiro ciclo do ensino fundamental, de 5,6 e 5,0, respectivamente.

O menor IDEB da rede municipal de Foz do Iguaçu foi de 6,2, nota superior à meta fixada pelo Ministério da Educação (MEC) para ser atingida em 2021. Partindo de um patamar relativamente baixo, em 2005, quando o IDEB médio da sua rede foi de 4,2, o município deu o primeiro salto em 2009, alcançando a nota média de 6,2. O IDEB 2011 veio confirmar a tendência, mostrando que todas as escolas da rede melhoraram significativamente.

Segundo dados da Secretaria Municipal de Educação, a taxa de evasão foi zero em 2011, resultado que evoca o delicado filme chinês “Nenhum a menos” (1999), dirigido por Zhang Yimou, sobre a jornada extraordinária uma professora de uma precaríssima escola rural que parte à procura de um aluno que havia abandonado a escola para buscar trabalho num grande centro urbano. Sem tanto heroísmo, mas com atendimento individualizado e multidisciplinar, as escolas municipais de Foz conseguiram a proeza de não perder nenhum aluno.

Muitos devem estar se perguntando qual é a fórmula utilizada pelo município para alcançar, num prazo relativamente curto, um aumento tão expressivo e uniforme no IDEB. É possível que nos próximos meses a cidade receba dirigentes municipais de educação de todo o país interessados em conhecer in loco experiência tão exitosa. O prefeito municipal, Paulo Mac Donald Ghisi, que encerra o segundo mandato no dia 31 de dezembro próximo, poderá tornar-se um requisitado palestrante em eventos sobre reformas educacionais.

Antes que gestores municipais de todo o país se disponham a pagar caras consultorias para fazer um estudo de caso sobre o projeto educacional que transformou Foz do Iguaçu em celeiro de escolas de excelência, segundo o IDEB, creio que vale a pena apresentar, ainda que de forma preliminar, os principais ingredientes da receita aplicada com sucesso pela rede municipal. Quem vier a Foz em busca de um modelo inovador de reforma educacional corre o sério risco de ficar desapontado, pois todas as políticas adotadas pelo município já fazem parte de receitas consagradas e testadas com sucesso em outros lugares.

A maior novidade talvez esteja na aposta em medidas convencionais, de eficácia já comprovada, ao invés de inventar projetos mirabolantes e caros. Foz do Iguaçu está demonstrando que é possível universalizar o atendimento e garantir ensino de qualidade investindo apenas 25% das receitas municipais na Educação. Basta uma gestão municipal séria e competente que aplique bem os recursos escassos da educação.

Resumimos aqui 10 lições que podem ser aprendidas com a política educacional que colocou as escolas municipais de Foz do Iguaçu em primeiro lugar no Paraná e entre as melhores escolas públicas do País.

Lição nº 1: Prefeito comprometido com educação de qualidade

A obstinação do prefeito de Foz do Iguaçu, Paulo Mac Donald Ghisi, em promover a melhoria da rede municipal de ensino foi determinante para criar as condições que catapultaram o IDEB. Influenciado pelas idéias de Leonel Brizola, ele transformou a educação na prioridade dos seus dois mandatos consecutivos como prefeito. Trombou até com MEC para criar um modelo próprio de creche. Conseguiu provar que com os mesmos recursos liberados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para construir uma unidade padrão para atender 120 crianças, era possível construir um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) com capacidade para atender mais 300 de crianças. Com a lógica cartesiana de engenheiro, privilegiou soluções práticas e baratas, calculando na ponta do lápis todos os custos da educação. Por exemplo, a merenda escolar servida para as cerca de 30 mil crianças atendidas nas escolas e CMEIs tem um custo unitário de cerca de R$ 0,60, sem incluir mão-de-obra, um quarto do custo de merenda fornecida por terceirizados em outros municípios da região. Quando chegam nas escolas do município pela manhã, nos bairros mais pobres da cidade, as crianças são recebidas com um desjejum básico: pão, goiabada e leite de soja. É assim que começa uma jornada típica de aprendizagem nas escolas da rede municipal que foi o grande destaque do IDEB 2011.

Lição nº 2: Investimentos na melhoria da infraestrutura escolar

A melhoria da infraestrutura da rede municipal de Foz do Iguaçu foi notável nos últimos oito anos. Além de reformar os prédios depreciados herdados das administrações anteriores, o atual prefeito, construtor por profissão, empreendeu um ambicioso plano de ampliação da rede municipal, criando um novo padrão de escola pública, com instalações funcionais e espaços para atividades no contraturno escolar. Nos últimos oito anos, 21 escolas passaram por reformas e ampliações que, em muitas delas, incluiu a construção de quadra poliesportiva. Mas a “menina dos olhos” do alcaide são as cinco novas escolas construídas pela sua administração. Todas as novas escolas são equipadas com piscinas, ginásio de esportes coberto, refeitório e espaços para atividades culturais no contraturno escolar. Igualmente significativos foram os investimentos realizados na ampliação e melhoria da rede de CMEIs: cinco deles passaram por pequenas reformas e 15 foram reformados e ampliados para aumentar a sua capacidade de atendimento. A ampliação da rede de CMEIs contabiliza a construção de quatro novas unidades já em funcionamento, outras três em fase final de construção e outras quatro com recursos já garantidos para início da construção ainda neste ano. Estão planejados outros cinco CMEIs que dependem ainda da liberação de recursos do FNDE.

Lição nº 3: Profissionalização da gestão educacional

A Secretaria Municipal de Educação de Foz do Iguaçu ganhou uma gestão profissional na atual administração, com autonomia para implementar a reforma da rede municipal de ensino. A Secretária Municipal de Educação, Joane Vilela, no cargo desde o início de 2008, é professora da rede municipal e ex-diretora da escola. Com esta experiência, sabia exatamente quais eram as queixas mais comuns das escolas em relação ao órgão central do sistema e tratou logo mudar a sua forma de atuação. Uma das suas primeiras iniciativas foi formar uma equipe multidisciplinar comprometida com o projeto de melhoria da qualidade da educação para prestar apoio às escolas. O segundo passo foi criar uma nova cultura de gestão escolar, baseada no estabelecimento de metas de desempenho para cada escola da rede municipal. O IDEB, criado a partir de 2005, serviu como indicador para mensurar os progressos obtidos. Mas a própria secretária se apressa em esclarecer que as metas vão muito além das melhorias captadas por esse índice: “Os professores estão motivados e dispostos não só a melhorar o índice do IDEB, mas também a qualidade do ensino.”(1) O que ninguém discute é que a Secretaria Municipal de Educação conseguiu mobilizar todas as escolas e seus agentes (diretores, professores, estudantes e pais) para mudar o panorama da educação no município. Os resultados estão aí para o país ver.

Lição nº 4: Autonomia da escola

Um mantra repetido pelos advogados de reformas educacionais é autonomia escolar.
Os sistemas públicos de ensino, sejam estaduais ou municipais, são, em geral, altamente centralizados e burocratizados, o que parece contribuir para o fracasso de muitas tentativas bem intencionadas de reformas de cima para baixo. Em Foz do Iguaçu, as escolas municipais devem seguir as diretrizes da Secretaria Municipal da Educação, mas gozam de autonomia para propor e implementar estratégias e métodos próprios de ensino. Trata-se, obviamente, de uma autonomia limitada, mas suficiente para incentivar duas coisas muito positivas: a liderança proativa das diretoras das escolas e o envolvimento efetivo dos professores no planejamento escolar. A Secretaria Municipal de Educação, por sua vez, atua como facilitadora e provedora de apoio pedagógico às escolas, disponibilizando para isso uma equipe multidisciplinar, com participação de profissionais da área de saúde (psicólogos, assistentes sociais e fonoaudiólogos), para cada uma das cinco regiões da cidade. Este trabalho integrado entre as áreas de educação, saúde e assistência social, viabilizando por meio do Projeto “Construindo a Cidadania”, implantando desde 2009, com verbas federais, tem sido fundamental para manter na escola e garantir a aprendizagem de crianças em situação de vulnerabilidade social. Outra iniciativa importante é o Prêmio Paulo Freire, que já está na sua sexta edição. Idealizado pela Secretaria Municipal de Educação, este prêmio incentiva, reconhece e valoriza o envolvimento dos professores em projetos inovadores orientados para o objetivo de criar novas situações de aprendizagem para os estudantes no desenvolvimento do currículo escolar.

Lição nº 5: Formação e valorização dos professores

Este é o lugar-comum mais repetido por educadores de todos os naipes ideológicos: sem professores bem preparados e motivados não haverá escola de qualidade. O difícil é passar do discurso para uma política efetiva de qualificação e valorização dos professores. Foz do Iguaçu parece ter encontrado o caminho, sem projetos mirabolantes. “Não há como falar de desenvolvimento do aluno sem citar os esforços dos professores, que tiveram iniciativa e boa vontade”, atesta a diretora da Escola Municipal Santa Rita de Cássia, Shirlei Ormenese de Carvalho, ao explicar o primeiro lugar nacional no IDEB. A Secretária Municipal de Educação concorda: “O grande destaque sem dúvida foi a motivação dos professores, a tomada de decisão, fizeram trabalho diferenciado no trabalho coletivo. Tivemos apostilas, realizamos simulados, reforço e equipe multidisciplinar, avaliação por desempenho, nada teria acontecido se não fosse o empenho dos professores”. O reconhecimento dos pais vem na mesma direção, criando um poderoso incentivo ao trabalho docente. Finalmente, não pode ser negligenciada a importância da valorização salarial. Neste quesito, os avanços foram modestos, reconhece a secretária. A principal inovação foi a instituição por lei municipal do 14º salário como prêmio pelo resultado no IDEB. A premiação é dada por escola, o que constitui um poderoso incentivo ao esforço coletivo. Mais um acerto, pois muitas políticas de pagamento por mérito derrapam justamente por pretender premiar o desempenho individual, não levando em conta que uma boa escola é resultado de trabalho em equipe.

Lição nº 6: Engajamento dos pais na vida escolar

Promover a participação dos pais na vida escolar é outra recomendação repetida à exaustão pelas cartilhas sobre reformas educacionais que deram certo em outros países. Como fazer é outros quinhentos. O bom desempenho das escolas municipais de Foz do Iguaçu parece confirmar que o apoio dos pais faz toda a diferença. Com a palavra mais uma vez a diretora da escola campeã nacional do IDEB: “A [nossa] escola é pequena e contamos com muitos alunos de outros bairros, e vemos que os pais motivam, trazendo os alunos em outros horários para as aulas de reforço. É um tratamento recíproco [entre a escola e os pais].” A percepção dos pais também mudou, conforme atesta o depoimento da mãe de uma aluna que passou pela Escola Santa Rita de Cássia: “A gente percebe que os professores são bastante empenhados e isso reflete nos alunos. Minha filha estudou desde cedo na escola e sempre foi muito bem atendida. A escola merece esse prêmio.” Os próprios alunos reconhecem o empenho da escola em atender as suas necessidades e as expectativas dos pais, formando um círculo virtuoso: “Os professores e a diretora trabalhavam muito bem com a gente e queriam nossa melhoria”, recorda uma ex-aluna da Escola Santa Rita de Cássia, que fez a Prova Brasil de 2011.

Lição nº 7: Educação é essencialmente um trabalho coletivo

Uma andorinha só não faz verão, ensina o provérbio popular, que também se aplica com perfeição à educação. Como no futebol, para usar outra metáfora, na educação também não se ganha o jogo sozinho. Uma tentação comum que acomete os políticos demagogos é prometer solução fácil para problema complexo. Definitivamente, melhorar a escola pública não é um problema dos mais fáceis de resolver. Por isso, é melhor desconfiar de promessas milagrosas. Foz do Iguaçu fez o dever de casa, com persistência e obstinação, e agora está começando a colher os resultados. A política educacional adotada no município parte da premissa que uma boa escola se faz mediante esforço e trabalho de equipe. A premiação pelo desempenho no IDEB, na forma de um 14º salário, é para a escola, beneficiando todos os que nela trabalham, da diretora à merendeira. Os professores são estimulados a desenvolver soluções coletivas e criativas. Uma das estratégias mais bem-sucedidas adotada pela Escola Santa Ria de Cássia foi colocar duas professoras para dividir a tarefa de ensinar os alunos do 5º ano, aproveitando melhor as competências de cada uma em disciplinas e áreas específicas do currículo. “Duas professoras vieram com a idéia de dividir as aulas da 4ª série (5º ano), porque tinham mais afinidades com matérias diferentes. Aceitamos o desafio e as turmas responderam muito bem”, relata a diretora, atribuindo a esta iniciativa adotada há três anos os bons resultados que estão sendo colhidos agora.

Lição nº 8: Aulas de reforço no contraturno escolar

Visto com desconfiança por muitos educadores como uma medida paliativa para corrigir deficiência do ensino, o reforço escolar pode ser uma medida eficaz para prevenir atraso na aprendizagem e evitar a reprovação. Uma das características distintivas da Escola Santa Rita de Cássia é a oferta regular de aulas de reforço no contraturno escolar. “Os alunos com dificuldade [de aprendizagem] vinham à escola durante toda a semana receber aulas [de reforço] no contraturno, e os que estavam bem, vinham apenas uma vez, para que ficassem ainda melhor”, repete a diretora, assustada com o súbito estrelado. “Viramos celebridade e ainda bem que é por uma notícia boa”, orgulha-se. Com a oferta regular de aulas de reforço, a taxa de reprovação caiu dramaticamente. “Temos 200 alunos e apena um deles reprovou no ano passado, acho que isso também refletiu na média, que era para ter sido maior ainda”. De fato, o IDEB é um índice composto que leva em conta a taxa de aprovação e a nota obtida pelos alunos na Prova Brasil. Ao derrubar as taxas de reprovação com medidas simples, como aulas de reforço, as escolas municipais de Foz do Iguaçu somaram pontos preciosos no IDEB. E m 2011, a taxa de aprovação no 5º ano foi de 100% em 44 das 51 escolas da rede, sem promoção automática.

Lição nº 9: Uma boa educação começa pela base

A pequena revolução educacional realizada pela atual administração de Foz do Iguaçu tem sido comandada por um prefeito que às vezes insiste em ser turrão e teimoso, sobretudo quando se trata de defender sua convicção férrea de que as desvantagens iniciais de crianças pobres não são um obstáculo intransponível para a aprendizagem e o sucesso escolar. Os resultados alcançados pelas 51 escolas municipais no IDEB 2011 parecem confirmar sua tese. Para prová-la, ele investiu pesadamente na expansão da rede de CMEIs, que hoje atende cerca de 11 mil crianças de 0 a 6 anos. Com excelente infraestrutura física e bom atendimento, as creches do município deixaram de ser “depósito de criança”, para assumir sua função educativa. “Nossas crianças estão sendo alfabetizadas a partir dos dois anos”, exagera o prefeito, um entusiasta do método fônico de alfabetização. Aliás, a ênfase na alfabetização é uma das suas obsessões, a tal ponto que o fundo das piscinas das escolas é decorado com as letras do alfabeto para que as crianças possam ir se familiarizando com elas ludicamente. O que não dá para negar é que este trabalho de base está mudando a trajetória de milhares de crianças de famílias de baixa renda, mitigando desde a primeira infância os impactos que as gritantes desigualdades sociais têm na trajetória escolar. Imodesto com os resultados do IDEB, o prefeito promete desconstruir as “teses acadêmicas” que insistem em mostrar a forte correlação existente entre rendimento escolar e condições socioeconômicas. Na realidade, sua reforma já está demonstrando que uma escola pública de qualidade é o melhor antídoto para o fracasso escolar e a exclusão social.

Lição n 10: O aluno deve ser o centro do processo de ensino-aprendizagem

Parece óbvio ululante que toda escola que se preze deve colocar o aluno no centro do processo de ensino-aprendizagem. Afinal, a missão da escola é educar. O que varia é o que se compreende por uma boa educação. Um risco comum associado a sistemas centralizados de avaliação, como a Prova Brasil, aplicada a cada dois anos para alunos do 5º e do 9º ano do ensino fundamental, é incentivar as escolas a “ensinar para o teste”. As escolas municipais de Foz do Iguaçu sucumbiram a esta tentação e, por incentivo da Secretaria Municipal de Educação, passaram a utilizar apostilas e aplicar simulados da Prova Brasil. A preparação para este teste que – combinado com a taxa de aprovação – serve para calcular o IDEB, pode acarretar o empobrecimento do currículo e resultar numa educação mecanicista que não preparar os estudantes adequadamente para as etapas subsequentes da sua trajetória escolar. A melhor maneira de evitar que isso ocorra é seguindo à risca a posição defendida pela Secretária Municipal de Educação, Joane Vilela, para quem os esforços devem ser direcionados “não só a melhorar os índices do IDEB, mas também a qualidade do ensino”. O próprio MEC reconhece as limitações da metodologia do IDEB para aferir a qualidade do ensino. Portanto, o aumento do IDEB deve vir como reflexo de uma política educacional que coloca o aluno no centro do processo de ensino-aprendizagem e não como finalidade última de uma política que privilegia a preparação para o teste, numa imitação grotesca de cursinhos pré-vestibulares.

O próximo desafio

Os mesmos resultados do IDEB 2011 que trouxeram excelentes notícias para os pais cujos filhos freqüentam as 51 escolas municipais de Foz do Iguaçu, também trazem motivos de grande preocupação. Afinal, o segundo ciclo do ensino fundamental (do 6º ao 9º ano), está a cargo de escolas estaduais que tiveram desempenho sofrível no IDEB. O contraste entre as notas obtidas pelas escolas municipais e estaduais não poderia ser mais alarmante. Enquanto o IDEB das escolas municipais de Foz variou entre 6,2 e 8,6, nas 27 escolas estaduais de ensino fundamental as notas se distribuíram entre 2,4 e 5,8, com a maioria delas situando-se abaixo de 4,0. Uma calamidade!

Um aluno que neste ano está matriculado no 5º ano do ensino fundamental numa escola municipal de Foz do Iguaçu, em 2013 irá obrigatoriamente para uma escola estadual, onde encontrará um nível de ensino significativamente inferior ao que vem recebendo. É o que mostra o IDEB, de forma consistente e contundente. Todo esforço realizado pelas escolas municipais para formar uma base sólida na primeira etapa do ensino fundamental poderá ser perdido, caso seja mantido o brutal desnível entre as duas redes revelado pelo IDEB. O que acontecerá com os alunos que sairão de boas escolas municipais para prosseguir seus estudos em escolas estaduais ruins? Já dá para prever os resultados: aumento das taxas de reprovação e evasão e, como corolário, fracasso escolar. É o que já acontece. No ensino médio, a situação só piora.

O abismo revelado pelo IDEB entre a qualidade de ensino oferecido pelas escolas das redes municipal e estadual de Foz do Iguaçu chama a atenção para um problema que terá que ser enfrentado. A municipalização completa do ensino fundamental é a melhor solução. Uma emenda constitucional poderá facilitar o caminho para esta transição, já que hoje a oferta do ensino fundamental público é responsabilidade compartilhada de Estados e Municípios.

O IDEB pode servir como “medida” da capacidade e competência dos municípios para assumir integralmente o ensino fundamental. Municípios cujas escolas alcancem níveis de desempenho satisfatório no IDEB, como é o caso notório de Foz do Iguaçu, estariam aptos a assumir a gestão das escolas estaduais de ensino fundamental. Obviamente, a transferência de responsabilidade deve vir acompanhada da transferência correspondente de recursos. Com o Fundo de Desenvolvimento de Manutenção da Educação Básica (FUNDEB), os repasses de recursos estão assegurados. Mais complexa será a negociação para cessão em comodato de prédios escolares e transferência de pessoas. Nada que não possa ser resolvido com bom senso e regras claras, que preservem os direitos dos trabalhadores em educação.

O que não dá é para fingir que a situação atual atende aos interesses dos alunos e da sociedade. O Estado deveria se ocupar exclusivamente do Ensino Médio, que vai muito mal, segundo o IDEB, facilitando a transferência das escolas de ensino fundamental para os municípios que, como Foz do Iguaçu, já provaram que sabem gerir melhor as escolas públicas. Este é o desafio que a próxima administração municipal terá que enfrentar. Se o controle das escolas públicas virar objeto de disputa política, os alunos serão as principais vítimas.

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(*) Paulino Motter, especialista em políticas públicas e gestão governamental, atualmente cedido à ITAIPU Binacional, onde exerce o cargo de consultor do Diretor-Geral Brasileiro. É mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e doutor em Educação pela Universidade de Wisconsin-Madison (EUA). Foi chefe de gabinete do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), instituição vinculada ao Ministério de Educação, responsável pelo IDEB.

Todas as declarações reproduzidas neste artigo foram extraídas de reportagens publicadas pelos jornais Gazeta do Iguaçu e Gazeta do Povo na edição de 15/08/12, exceto as declarações do prefeito de Foz do Iguaçu, Paulo Mac Donald Ghisi, dadas em conversa pessoal com o autor.

Ensino Médio: escolher e aprofundar, e não diluir

Comentando os resultados desastrosos do ensino médio brasileiro, confirmados pelos dados recém divulgados do IDEB, o Ministro da Educação, Aloísio Mercadante, falou do absurdo que é exigir que os todos os alunos tenham que estudar 13 matérias diferentes neste nível, e o jornal Folha de São Paulo anunciou que “o Ministério da Educação prepara um novo currículo do ensino médio em que as atuais 13 disciplinas sejam distribuídas em apenas quatro áreas (ciências humanas, ciências da natureza, linguagem e matemática). A mudança prevê que alunos de escolas públicas e privadas passem a ter, em vez de aulas específicas de biologia, física e química, atividades que integrem estes conteúdos (em ciências da natureza). A proposta deve ser fechada ainda neste ano e encaminhada para discussão no Conselho Nacional de Educação, conforme a Folha informou ontem. Se aprovada, vai se tornar diretriz para todo o país”. O modelo a seguir seria o do ENEM, que se divide em quatro áreas, “ciências humanas”, “linguagens e códigos”, matemática e “ciências da natureza”, cada qual com as respectivas tecnologias.

A preocupação do Ministro é correta e muito oportuna, ainda mais se pensamos que hoje os jovens que queiram ter uma formação técnica de nível médio precisam fazer todas estas disciplinas obrigatórias mais as de sua especialização técnica. No entanto, a solução proposta pode levar a uma situação pior do que a atual. A razão é que não existe, como as vezes se pensa, alguma coisa que se chame “ciências sociais” ou “ciências naturais” em geral, e sim ciências e áreas de formação específicas, cada qual com seus métodos, tradição de trabalho, autores centrais e cultura própria, da mesma maneira que não existe um “método científico” em geral, mas abordagens experimentais, analíticas e interpretativas próprias das diversas áreas de conhecimento. Esta é uma discussão filosófica complicada que não caberia aprofundar aqui, mas o que significa, na prática, é que a única maneira de realmente entrar no mundo da cultura e do conhecimento é escolher uma ou poucas áreas de estudo e se aprofundar nelas, e não tentar entender o conjunto em sua generalidade. O mesmo vale para quem opte por uma via mais prática e profissional, a partir da qual os conhecimentos de natureza mais geral podem ser ampliados e aprofundados.

Para o ensino médio, isto significa que os estudantes precisam poder optar por poucas disciplinas e se aprofundar nelas, e não tentar aprender generalidades ou um pouquinho de cada coisa. Se o interesse for física, economia, inglês ou eletrônica, então ele deve poder se dedicar a isto e deixar de lado todo o resto, e não se preocupar com “ciências na natureza”, “ciências sociais” ou “linguagem” de maneira geral, coisas que poderão vir depois a partir destas escolhas. Uma vez escolhidos os temas, é necessário aprofundar os estudos com autonomia, buscando recursos didáticos disponíveis, experimentando, escrevendo e tendo seu progresso estimulado e acompanhado por professores competentes.

A outra observação é que o currículo do ensino médio brasileiro, embora muito detalhista e extenso, não inclui áreas de grande importância no mundo contemporâneo como a estatística, a economia, direito, ciência política e computação, ao mesmo tempo em que exige disciplinas como filosofia e sociologia que, embora possam ser muito interessantes e produtivas, correm o risco sério de serem dadas de forma extremamente rasa e preconceituosa quando tornadas obrigatórias.

Mas será que, além disto, não existem algumas coisas mais gerais que todos deveriam saber? O consenso é que todos deveriam desenvolver bem o domínio da língua e da matemática, e que isto deve ser trabalhado até o fim da educação fundamental, para que os estudantes já cheguem ao ensino médio com esta formação pronta. Mesmo aqui, no entanto, temos muito que avançar no entendimento sobre o que, realmente, todos os estudantes precisariam aprender. Em um artigo recente no The New York Times, o conhecido cientista social Andrew Hacker critica a exigência, nos Estados Unidos, de que todos os estudantes aprendam álgebra, e mostra como esta exigência faz pouco sentido, porque é pouco demandada no mercado de trabalho e é responsável por grande parte dos problemas de fracasso escolar que ocorrem nos Estados Unidos.

Diz ele: “Of course, people should learn basic numerical skills: decimals, ratios and estimating, sharpened by a good grounding in arithmetic. But a definitive analysis by the Georgetown Center on Education and the Workforce forecasts that in the decade ahead a mere 5 percent of entry-level workers will need to be proficient in algebra or above. And if there is a shortage of STEM graduates, an equally crucial issue is how many available positions there are for men and women with these skills. A January 2012 analysis from the Georgetown center found 7.5 percent unemployment for engineering graduates and 8.2 percent among computer scientists.”

E conclui dizendo que  “Instead of investing so much of our academic energy in a subject that blocks further attainment for much of our population, I propose that we start thinking about alternatives. Thus mathematics teachers at every level could create exciting courses in what I call “citizen statistics.” This would not be a backdoor version of algebra, as in the Advanced Placement syllabus. Nor would it focus on equations used by scholars when they write for one another. Instead, it would familiarize students with the kinds of numbers that describe and delineate our personal and public lives. It could, for example, teach students how the Consumer Price Index is computed, what is included and how each item in the index is weighted — and include discussion about which items should be included and what weights they should be given. This need not involve dumbing down. Researching the reliability of numbers can be as demanding as geometry. More and more colleges are requiring courses in “quantitative reasoning.” In fact, we should be starting that in kindergarten.”

Esperemos que, ao levar à frente a indispensável reforma do ensino médio, o Ministério da Educação não recaia nos equívocos do ENEM, trocando os conhecimentos retalhados de hoje por generalidades sem conteúdo, e opte por dar aos estudantes possibilidades reais de escolha, aprofundamento e melhor formação.

Quanto vale um título?

A comparação que apresentei ontem  dos rendimentos de todos os trabalhos entre professores universitários e outras pessoas com educação superior foi criticada porque ela não tomou em conta as diferenças de titulação entre os dois grupos. De fato, a renda do trabalho de pessoas com títulos de mestrado e doutorado é bem maior do que a dos que têm somente graduação, e isto ocorre tanto no setor público quanto no privado. Quando controlamos a renda pelo nível de formação, encontramos que os níveis de renda são muito próximos entre os setores público e privado, tanto para a população geral quanto para os professores, com uma pequena vantagem para os que trabalham no setor  privado. Estes dados se referem a pessoas empregadas, e não incluem os que trabalham como empregadores ou por conta própria.

Os dados mostram também que, dos cerca de 80 mil doutores identificados pelo Censo Demográfico, 60 mil trabalham no setor público e, destes, 33 mil trabalham como professores de nível superior.   Foi possível observar que muitos médicos aparecem no censo como doutores, mas provavelmente não têm títulos formais de doutorado, o que significa que a proporção de doutores empregados pelas universidades públicas deve ser ainda maior.

A pequena vantagem salarial do setor privado é compensada pelos benefícios associados ao emprego público e, mais especialmente, ao trabalho como professor (estabilidade, férias prolongadas, aposentadorias de serviço público, etc), permitindo que se conclua que a renda dos professores do ensino superior público é bem competitiva em relação à renda do setor privado.

Professores universitários ganham bem?

Quase ninguém está contente com próprio salário, e o conceito de “ganhar bem”  ou mal depende muito de com quem nos comparamos e quanto achamos que vale nosso trabalho. O Censo Populacional de 2010 dá informações sobre diversos tipos de renda declarada das pessoas,  sendo uma delas a renda de todos os trabalhos que representa razoavelmente o nível  vida alcançado pelas pessoas, embora se saiba que existe uma tendência para as pessoas declararem renda mais baixa do que as que de fato têm. O que observamos, de qualquer maneira, é que a renda média de todos os trabalhos dos professores universitários do setor público (incluindo aí tanto as universidades federais como as estaduais) era de cerca de 5.700 reais, comparado com a média de 3.800 reais para o conjunto de funcionários públicos de nível superior, e um pouco acima da média dos mesmos profissionais no setor privado. Também no setor privado, a renda média dos professores universitários é significativamente maior do que a renda média do total de pessoas de nível superior. Nesta comparação, os professores universitários ganham bem.

Comparações internacionais são mais difíceis de fazer, pelas grandes diferenças entre regimes de trabalho, taxas de câmbio, tipos de contrato, benefícios adicionais, categorias profissionais, etc.  Uma das poucas comparações que existem é a de “Paying the Professoriate – A Global Comparison of Compensation and Contracts”, editado por Philip Altbach, Liz Reisberg, Maria Yudkevich, Gregory Androushchak e Iván Pacheco, Routledge, 2012), do qual consta a tabela abaixo.  A origem dos dados sobre o Brasil é o capítulo que preparei para o Brasil que está disponível aqui, e a comparação internacional, baseada nas tabelas de vencimento dos professores das universidades federais (que não incluem gratificações de diferentes tipos) foi feita em termos de poder de compra do dólar (PPP), e não pela taxa de câmbio corrente. É não mais do que uma aproximação, que mostra que os salários de professores universitários do setor público no Brasil estão abaixo dos países mais desenvolvidos, e acima dos países em desenvolvimento  e do antigo bloco comunista.

Published April 3rd 2012 by

 

Naercio Menezes Filho: Mais Gastos com Educação?

Reproduzo abaixo a lúcida análise de Naercio Menezes Filho sobre a meta do Plano Nacional de Educação de gastar 10% do PIB no setor, publicada no Valor Econoômico de 25/07/2012  O autor é  Professor titular – Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e  Professor associado da FEA-USP.

 Mais gastos com educação?

A Câmara dos Deputados aprovou recentemente o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece, entre outras metas, que os gastos com Educação deverão atingir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2020. O plano vai agora para o Senado e, depois, para a presidência da República. Devemos ficar felizes ou tristes? Será que o problema da Educação no Brasil é mesmo a falta de recursos?

Em primeiro lugar, deve ficar claro que o PNE é somente uma carta de intenções. Nada garante que as metas serão efetivamente atingidas. Basta verificar o que aconteceu com as metas do PNE anterior (aprovado em 2000). O plano previa, por exemplo, que 50% das crianças de 0 a 3 anos de idade seriam atendidas em Creches em 2010. Os últimos dados disponíveis mostram que apenas 19% das crianças brasileiras nessa idade estão em Creches. Mas, nada irá acontecer com os municípios que não cumpriram a meta. O mesmo aconteceu com praticamente todas as outras metas do plano anterior.

Vale notar também que, apesar de ser apenas uma carta de intenções, algumas das metas do plano anterior, aprovado pelo Congresso, foram vetadas pelo então presidente, Fernando Henrique Cardoso. Entre elas estava justamente o aumento progressivo dos gastos com Educação para 7% do PIB em 2010. O argumento utilizado foi o de que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) impedia que fossem colocados em lei programas que implicassem novas despesas sem as respectivas indicações das receitas. Como a LRF continua em vigor, espera-se que o Senado ou a presidente Dilma também retirem essa meta do plano.

Uma das saídas seria redistribuir recursos do Ensino superior para o Ensino básico, em especial o infantil

Além disso, pelo menos três fatores não foram levados em conta pelos formuladores das metas do PNE: a virada demográfica, a distribuição de recursos entre os níveis de Ensino e a relação entre gastos e qualidade da Educação. Com relação ao primeiro ponto, sabe-se que a taxa de fecundidade está declinando rapidamente no Brasil, tendo passado de seis filhos por mulher em 1970 para apenas 1,8 em 2010, abaixo da taxa de reposição da nossa população. Isso significa que o número de crianças em idade Escolar irá diminuir continuamente nas próximas décadas. As projeções do IBGE indicam, por exemplo, que o número de brasileiros de 5 a 19 anos de idade passará de 50 milhões em 2010 para 38 milhões em 2030, ou seja, uma redução de 25% em apenas 20 anos.

Quais serão os efeitos dessa virada demográfica para os gastos com Educação? Atualmente o gasto direto com Educação equivale a 5,1% do PIB, ou seja, R$ 187 bilhões, em valores de 2010. Desse total, 85% são gastos com Educação básica, o que significa que cada Aluno do Ensino básico recebe um investimento médio de R$ 4 mil, equivalente a 20% do nosso PIB per capita. Países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) gastam em média 26% do seu PIB per capita com Educação básica; a Coreia, 30%; o Chile, 18%; e o México, 15%.

Simulações indicam que com a virada demográfica, se o PIB crescer a uma média de 3% ao ano, o gasto por Aluno aumentaria para R$ 6 mil em 2020 e R$ 10 mil em 2030, mesmo que os gastos não se alterem com relação ao PIB. Assim, o gasto por Aluno da Educação básica passaria para 24% do PIB per capita em 2020 e 29% em 2030, atingindo o nível da Coreia do Sul.

Se, além da virada demográfica, os gastos com Educação aumentassem para 8% do PIB, as despesas por Aluno aumentariam para R$ 9 mil já em 2020, atingindo 33% do PIB per capita daquele ano, maiores do que em todos os países da OCDE. Nesse caso, os gastos com Educação básica passariam de R$ 390 bilhões, já em 2020. Não se sabe de onde viriam os recursos para esse aumento de gastos, uma vez que a carga tributária no país já atingiu o limite do suportável. Imagine o que aconteceria caso a meta de 10% do PIB fosse de fato atingida!

O segundo ponto importante diz respeito à distribuição dos recursos educacionais. Hoje em dia, o Ensino superior apropria 15% dos gastos públicos com Educação, mas tem apenas 3% do total de Alunos. Assim, enquanto o Ensino fundamental gasta 20% do PIB per capita por Aluno, o Ensino superior gasta 100%. Poderíamos argumentar que os gastos com Educação superior incluem os gastos com pesquisas, mas em nenhum país do mundo essa discrepância de gastos entre o Ensino básico e o superior é tão grande. Na média da OCDE, o gasto por Aluno no Ensino superior é somente duas vezes maior do que no Ensino básico, na Coreia é pouco mais de uma vez e meia e nos EUA, maior gerador de pesquisas no planeta, chega a três vezes. Sem contar que muitos dos Alunos que hoje frequentam o Ensino superior público teriam condições de pagar mensalidades, o que não ocorre no Ensino básico.

Por fim, vale a pena ressaltar que aumento de gastos não significam aumento da qualidade da Educação. Várias pesquisas, inclusive da OCDE, mostram esse fato de forma inequívoca. Sem melhorar a formação dos Professores, a seleção dos diretores e sem demitir os piores Professores ainda em estado probatório, nada vai mudar, mesmo que gastássemos os 10% do PIB com Educação. Haveria somente uma maior transferência de recursos da sociedade para os Professores, sem melhoria do aprendizado dos Alunos. Assim, a melhor estratégia para a Educação brasileira seria manter os gastos como proporção do PIB e aproveitar o crescimento do PIB e a virada demográfica dos próximos anos para manter apenas os melhores Professores no sistema educacional e redistribuir recursos do Ensino superior para o Ensino básico, especialmente o Ensino infantil, que é a base de tudo.

 

André Urani

Perdemos André Urani em plena juventude, depois de enfrentar bravamente uma doença implacável. Deixa com os amigos a lembrança do otimismo, da inteligência, da afetividade e do amor pelo Rio. E tristeza.

Entre mil atividades, André foi o criador e presença permanente no IETS,  e parte das coisas que fazia e das quais participava pode ser vista aqui.

 

Brésil(s). Sciences humaines et sociales

Comparto com todos a publicação de Brésil(s). Sciences humaines et sociales,  a única revista francesa e em francês sobre o Brasil. Editada pelo Centre de Recherches sur le Brésil Contemporain (CRBC-EHESS), ela é publicada pelas Éditions de la Maison des Sciences de l’Homme e toma o lugar dos Cahiers du Brésil Contemporain.

O sumário do primeiro número é:

Ouverture
Peter Fry, “Race”, savonnettes et crèmes de beauté
Walnice Nogueira Galvão, Sauvetages d’archives : le cas Edgard Leuenroth
Carlos Fico, Les régimes autoritaires au Brésil durant l’ère républicaine

Cahiers du Brésil Contemporain
Michel Agier, Le sexe de la pauvreté : hommes, femmes et familles dans une “avenida” à Salvador de Bahia
Christine Douxami, Abdias Nascimento et Solano Trindade : deux conceptions pionnières du théâtre noir brésilien
Rogério Dezem, Nuances de “jaune” : éléments formateurs de l’imaginaire brésilien sur les Japonais

Hommages
Ignacy Sachs, Ressources, emploi et financement du développement : produire sans détruire. Le cas du Brésil
Marion Aubrée, L’œuvre en français de M. I. Pereira de Queiroz
Anita Clémens Saboia, Du poète au romancier : Blaise Cendrars et le Brésil

Informações e assinaturas: Dominique Duchanel, tél.(33) (1) 49 54 22 19 e-mail : bresils-revue@ehess.fr

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