Indo além da polêmica sobre o uso da Internet na educação, uma pesquisa recente do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais mostra como, de fato, a Internet está chegando às escolas, e como está sendo usada pelos professores. O texto, “Internet nas Escolas Públicas: Políticas além da Política”, assinado por Bernardo Sorj e Mauricio Lisssovsky, está disponível aqui. Destaco, em primeiro lugar, o fato de que as tecnologias ainda estão longe de terem se tornado “transparentes” para os professores, que enfrentam problemas constantes de acesso e funcionamento dos equipamentos. Depois, embora os professores e a professoras sejam em grande maioria usuários de computadores, seu uso efetivo como instrumento pedagógico ainda está longe de ocorrer como se esperaria. Alguns trechos:
Quando aproximamos o foco dos laboratórios de informática das escolas, cuja implantação iniciou-se há dez anos, mas que todavia não alcança toda a rede pública municipal, percebemos que as variáveis mais determinantes para seu uso rotineiro, deixando de lado o tema de conteúdo disponível e pedagogias adequadas, segundo a opinião e as atitudes de professores e dirigentes pesquisados, são o acesso à Internet, as condições de manutenção dos equipamentos e a existência de um professor “responsável”. Se esse professor não for capaz de gerenciar a apropriação destes recursos pela escola (como “especialista em informática educativa”) que, ao menos tome conta da sala, mantendo-a aberta aos interessados e auxiliando seus colegas nas atividades ali realizadas. A ausência de um destes três fatores tende a condenar o laboratório à ociosidade. A insatisfação da ampla maioria dos professores em relação aos recursos disponíveis (cujas razões ainda incluem a quantidade dos equipamentos e o tamanho das salas destinadas aos laboratórios) reflete a dificuldade, por parte das autoridades educacionais, de alinhar estes fatores.
Ao contrário do que sugere o senso comum, em função do perfil etário do grupo e da esmagadora maioria feminina, os professores do Rio mostram-se relativamente familiarizados com o uso dos computadores e da Internet. No entanto, e é exatamente neste ponto que a questão torna-se interessante, essa familiaridade não se traduz imediatamente em uso regular e/ou apropriação sistemática da informática educativa nas escolas, e nem, tampouco, em utilização eficiente desta mídia para sua comunicação profissional, seja com alunos, seja com dirigentes e superiores hierárquicos.
Um desafio central é representado por uma parte considerável dos professores que vêm nas novas tecnologias uma fonte de questionamento de seu papel pedagógico. Alem de conservadorismo e interesses corporativos, estes professores expressam uma preocupação relevante: o da redefinição de seu papel numa sala de aula na qual o computador (alem dos SMS enviados pelos telefones celulares) “rouba” a atenção do aluno. Redefinir o papel do professor nesse novo ambiente tecnológico é um desafio que exige repensar o papel do pedagogo, de modo a que continue a ocupar uma função relevante. Parte considerável dos cursos de atualização dos professores concentra-se em questões tecnológicas, necessárias, mas que não enfrentam o cerne da questão: boa parte da geração nascida no mundo digital está à frente da maioria dos professores em habilidades técnicas.
A introdução sistemática de computadores no ensino público, como está sendo projetado pelo governo federal no programa Pro-Uca, ou por governos estaduais e municipais, deve ser acompanhada da criação de uma capacidade de avaliação e monitoramento contínuos, bem como da produção e avaliação de ferramentas educativas. Estas, sabidamente, abrem as portas aos lobbies empresariais que atuam na área, e que costumam reduzir o desafio da introdução de novas tecnologias à questão de criar o software adequado. Sem duvida, empresas privadas têm um papel a jogar neste domínio, mas certamente existe uma enorme quantidade de produtos de domínio público, disponíveis no Brasil e no exterior, que podem ser aproveitados e exigem catalogação e avaliação permanentes. Em uma área onde os recursos são insuficientes, a transição digital gera dilemas na sua alocação que deveriam ser previstos. A criação de um novo sistema pedagógico implica em investimentos enormes, onde, voltamos a insistir, enquanto continuam a existir carências básicas na formação e motivação dos professores, a distribuição de computadores é o menor deles.
Boas intenções não são suficientes. Se estiverem associadas a objetivos e a um plano pedagógico pré-determinados, os efeitos benéficos da distribuição de computadores (e certamente os haverão) poderão ser menores que seus efeitos disruptivos. Se as injunções políticas obrigam a agir sem ter clareza inicial dos objetivos e custos envolvidos, nunca é tarde para assumir a responsabilidade e aumentar a transparência sobre o que está sendo feito.
temos tantos problemas com educação que, essa idéia de um pc por aluno na região onde moro é um futuro tão distante, precisamos antes construir escolas que atendam nossas crianças com qualidade(que saia do papel e torne-se realidade a qualidade no atendimeto educacional), os investimentos em educação e/ou saúde deveriam estar a frente de qualquer AUMENTO SALARIAL DE MAIS DE 60%. Antes de atendermos nossos alunos com a ilusão de um pc, deveriamos dá-lhes espaços infra-estrutural real, COM ENERGIA, salas de aulas que de fato atendam as normas de qualidade para se ter uma educação decente.
Simon,
Excelente texto e parabens ao Bernardo Sorj ao ter avaliado a questão no Rio de Janeiro. Temas como o corporativismo e a falta de incentivos para que os professores utilizem as ferramentas da informática em sala de aula serão durante muito tempo impecilhos para que o uso de computadores desde a idade mais tenra deslanche.
Não sei como a iniciativa de computadores em sala de aula se complementaria com a idéia de um computador por aluno. Algo que o aluno possa levar para casa para trabalhar. O grande problema nas comunidades mais pobres continua a ser o acesso a rede. No entanto, em vários locais o uso de banda larga gratuito pode trazer grandes benefícios. Por exemplo, em muitas universidades americanas (University of Maryland, por exemplo) os campus já tem banda larga. O Projeto Rio-Orla criou acesso a banda larga. Creio que seria interessante que as comunidades mais pobres começassem a estruturar acesso a Banda Larga, para que parte dos deveres de casa dos alunos pudessem ser cobrados através de pesquisas na internet.
Ou seja, do meu ponto de vista, não basta ter computadores na escola e ter um computador por aluno, se o acesso à rede continua sendo limitado. Projetos integrados deveriam passar pel acesso amplo e gratuito à banda larga em comunidades pobres. Creio que essa é a melhor forma de criar um caminho sólido para a alfabetização digital.