Vou participar, no dia 1 de abril, de audiência pública da Comissão de Constituição, Justiça e Cidanania do Senado sobre o projeto de lei de cotas para as universidades federais. Os pontos principais da apresentação que pretendo fazer são os seguintes:
- A legislação proposta só beneficia um número pequeno de pessoas, prejudicando outras, e não altera o quadro de desigualdade social no ensino superior.
- Na medida em que o ensino superior se amplia, a inclusão por renda, cor e escola de origem vem crescendo, sem precisar de políticas de cotas para isto.
- Para haver uma política de inclusão efetiva, ela deveria se basear em critério de renda, que é socialmente o mais justo, e não de raça ou de escola do ensino médio, que discriminam contra brancos pobres e famílias pobres que investiram na educação média particular.
- Forçar a inclusão, sem saber se o estudante vai concluir o curso, é uma política populista e demagógica. Uma política adequada de inclusão deveria garantir que os estudantes terminem seus cursos, e dar recursos de manutenção a quem necessite.
- Ao forçar a inclusão de estudantes sem qualificação prévia, a lei pode criar grandes problemas para os cursos superiores públicos de melhor qualidade.
- Comparado com o projeto de cotas, o PROUNI é um sistema muito mais adequado e efetivo de inclusão, por incluir critérios de renda, desempenho, qualidade das instituições e não discriminar por raça, e por ser muito mais barato
- O foco quase exclusivo da atenção sobre política de cotas desvia a atenção sobre os problemas reais da educação brasileira.
Um powerpoint com os principais dados e estimativas que devo apresentar está disponível aqui.
A propósito do tema, recebi um comentário da estudante Joyce Cristina de Morais que antecipa vários destes pontos, e que também estou incluindo abaixo como comentário.
Boa noite, Sou negro, e creio que o sistema de cotas é uma jogada política para beneficiar alguns políticos. Precisamos de ensino de qualidade para as crianças e jovens do país e infelizmente mater a cota, baseada em renda social, para que os alunos em idades avançadas possam obter o tão sonhado canudo. Porém se faz necess]ario acompanhar o intelecto deste aluno no periodo de 03 meses no intuito de verificar se o mesmo está capacitado a ingressar na faculdade.
Alexandre Cruz/Recife
A minha pergunta é a seguinte: se já temos cota para escola pública (pelo menos na ufpr), se temos cotas por renda (Reuni, como admite o professor), por que não cotas para negros? Eu não tenho dados para avaliar o desempenho da política de cotas raciais (e sou dos que, assim como o professor, acham que política pública não pode ser discutida só com base em princípios), mas desconfio que as críticas às cotas têm mais a ver com seu aspecto racial do que meramente com seu desempenho. Sugere-se que a política de cotas criará um problema que não temos. Não sei, não. Mas acho que temos o problema sim. A diferença é que se começou a falar nele abertamente e, como de praxe, os que sempre ganharam vêem nisso uma ameaça. Por fim, me parece óbvio que o vestibular, em si mesmo, não promove nenhuma discriminação aberta contra negros e pardos. A discriminação é anterior, funciona regularmente e muito bem (como mostram as séries históricas do IPEA). As cotas apenas explicitam a existência desses mecanismos e surgem como uma forma de atenuar (e não resolver) o problema. Podemos e devemos, sim, discutir se as políticas de cotas são ou não eficientes, se cumprem o que prometem etc., mas criticar as cotas, como fazem alguns, porque elas violam o critério do mérito é abandonar muito rapidamente o raciocínio sociológico em benefício da ideologia meritocrática.
Não sei se entendo bem o raciocínio. Se os cotistas têm desempenho igual ou melhor do que os não cotistas, não seria de se esperar que eles tivessem iguais ou melhores condiçoes de disputar vagas nos vestbulares, sem precisar de cotas? Ou será que existe algo nos vestibulares das universidades federais que discrimina candidatos de escolas públicas, pardos ou pretos, seja qual for seu desempenho?
Não é a primeira vez que ouço falar disto, e gostaria de ter acesso aos dados, para poder entenderr melhor do que se trata. Imagino, no entanto, que estes resultados dependerão muito dos cursos dos quais estamos falando, e do número de cotistas. Os dados do ENADE mostram que, em muitas faculdades, os alunos que concluem os cursos não sabem muito mais do que os que entram, e, nestes cursos, o desempenho dos alunos não deve ter mesmo muita relação com sua formação anterior. Em cursos mais bem estruturados, em que os alunos têm que manejar conceitos e conhecimentos prévios das ciências naturais e d matemática, me parece inverossímil, até prova em contrário, que o desempenho escolar não tenha nada que ver com a educação prévia.
O jornal Gazeta do Povo fez uma ampla matéria sobre o desempenho dos alunos cotistas da Universidade Federal do Paraná (edição de 16 de fevereiro de 2009).
Os dados preliminares da universidade convergem com os de outras instituições de ensino superior que adotaram as cotas: o rendimento dos estudantes que ingressam pelas cotas não é inferior ao dos demais ingressantes nas universidades (e, não raro, é superior). Aqui uma matéria similar sobre várias universidades brasileiras.
Não obstante os dados serem de origem das universidades que implementaram e têm interesse em defender o mecanismo de seleção, são alguns indícios iniciais que combatem frontalmente o argumento de que as cotas prejudicariam a qualidade das universidades públicas. Na maioria dos casos, os dados estão circunscritos ao ensino e ao desempenho escolar dos alunos, não permitindo avaliações sobre a produção científica e demais atividades acadêmicas. Avaliar a produção científica, participação em projetos externos às universidades, bem como a qualidade profissional ainda demandará tempo para que os padrões se cristalizem, além de estudos externos às instituições patrocinadoras da medida.
Por enquanto, pelo menos, o ensino (que atrai a maior atenção da sociedade) não sofreu perda de qualidade em função das cotas, dos cotistas, dos jovens que não estudaram em grandes colégios e não possuíram a melhor formação. Se confirmados, estes dados colocam em xeque a afirmação da diminuição da qualidade e ainda lançam mais e poderosos contra-argumentos sobre a noção de mérito corrente na classe média.
Para visualizar os links, o texto de origem está aqui: http://gac-nusp-conjuntura.blogspot.com/search?updated-max=2009-02-20T04%3A22%3A00-03%3A00&max-results=6
Saudações, Luiz Domingos
Prezado Prof.Simon:
Acredito que sua apresentação focaliza os pontos fundamentais do tema em estudo.
Há, contudo, alguns pontos que me parecem mais fundamentais que outros:
1.sistema de cotas versus garantia da integridade/qualidade do ensino superior brasileiro;
2.garantia da integridade/qualidade do ensino superior versus estratégias para corrigir o défict histórico de acesso oa ensino superior de ponta por parte das minorias, sobretudo negros.
Atenciosamente,
Ana Maria de Rezende Pinto
Posiciono-me muito proximamente aos seus pontos. Acrescento que qualquer
que seja a política de cotas (e considero a estabelecida por renda a
mais justa) tem que partir de um piso de qualidade – nota mínima de entrada.
Poderia ser um índice construído a partir das notas das escolaspúblicas e
as privadas (p. ex.).
Cátia Lubambo
Pesquisadora da Fundaj Recife PE
Docente da UFPE -Gestão Pública
José Militão está certo, O programa PROUNI também tem uma clausula racial, que não aparece diretamente na página do MEC que descreve o programa, e, como como ele argumenta, seria totalmente dispensável, já que o critério de renda seria suficiente.
Prezado Prof. Simon,
certo que vossa performance há de abalar convicções de Senadores que, sem maior avaliação, tendem a aprovar as perversas leis em bases raciais, observo que, na lei do ProUni, tem também a previsão de ´corte racial´ embora totalmente desnecessária.
Em relação aos beneficiários de cotas raciais, o que afirmo é que dos 18.000 atuais, cerca de 90% ingressariam apenas com o corte social da renda familiar per capita. Portanto, a quantidade dos beneficiários é ainda menor, ou seja, apenas 10%, cerca de 1800 a 2000.
Entretanto, para beneficiar estes poucos dependentes do corte racial, que com um bom cursinho em apenas um ou dois anos também ingressariam 08 desistiriam – as leis raciais condenam a nação a uma identidade jurídica racial e, condenam-se os afrobrasileiros, todos, cotistas ou não, ao estigma de uma presumida ´raça negra´ inferior.
Abraços e boa sorte!
José Roberto F. Militão, advogado, ativista contra a crença em ´raças´ a favor do conceito da única espécie humana.
Prezado Prof. Simon,
certo que vossa performance há de abalar convicções de Senadores que, sem maior avaliação, tendem a aprovar as perversas leis em bases raciais, observo que, na lei do ProUni, tem também a previsão de ´corte racial´ embora totalmente desnecessária.
Em relação aos beneficiários de cotas raciais, o que afirmo é que dos 18.000 atuais, cerca de 90% ingressariam apenas com o corte social da renda familiar per capita. Portanto, a quantidade dos beneficiários é ainda maior, ou seja, apenas 10%, cerca de 1800 a 2000.
Entretanto, para beneficiar estes poucos dependentes do corte racial, que com um bom cursinho em apenas um ou dois anos também ingressariam 08 desistiriam – as leis raciais condenam a nação a uma identidade jurídica racial e, condenam-se os afrobrasileiros, todos, cotistas ou não, ao estigma de uma presumida ´raça negra´ inferior.
Abraços e boa sorte!
José Roberto F. Militão, advogado, ativista contra a crença em ´raças´ a favor do conceito da única espécie humana.
Sou estudante, e escrevo representando centenas de colegas que serão prejudicados com a proposta que será julgada nesta quarta feira. Encontramo-nos desesperados em relação a incabível proposta da deputada Nice Lobão. Admito que enquanto a sociedade for desigual deverá existir uma impulsão aos menos favorecidos, mas creio que 50% das vagas de universidades públicas seja um número altíssimo.
A grande maioria dos estudantes de escola pública não almejam cursar uma faculdade no momento. Os jovens de famílias realmente pobres procurarão trabalhar para aumentar o poder aquisitivo e proporcionar melhor qualidade de vida para a família. Além disso, tais famílias não conseguirão manter seus filhos em faculdades longínquas, o que irá ocasionar ainda maior número de desistências.
Conheço a existência de moradias universitárias gratuitas, porém sabemos que elas não comportarão tantos alunos desprovidos de condições para se manterem em outro local. Sem contar com a maior procura pelos benefícios como vale alimentação, transporte…
Juntamente com as questões financeiras que o governo não conseguirá suprir, há o fato do rendimento das grandes universidades tenderem a cair. Pois, por melhores que sejam as intenções, as dificuldades e a defasagem do aluno de escola pública, em geral, irá atravancar o progresso dos cursos e pesquisas.
Entretanto, creio e conheço alunos oriundos de escolas públicas que conquistaram vagas em universidades federais e estaduais, sendo, portanto, possível o ingresso destes. Assim como qualquer vestibulando consciente, estes estudaram e se esforçaram, conquistando vagas em cursos pré-vestibulares gratuitos e de suma qualidade, como os proporcionados pelas próprias universidades públicas; UNESP, por exemplo.
Portanto gostaria que essa atitude fosse repensada, pois irá prejudicar os alunos que não atendem a todos os requisitos presentes nas cotas, e nem por isso são menos merecedores das vagas. E, não obstante, fará com que vagas de grandes universidades sejam dissipadas, por meio da não manutenção de grande parte dos alunos detentores das cotas; os quais não conseguirão se manter financeiramente e nem conseguirão acompanhar com êxito o curso.