Qual deve ser a política federal para o ensino superior?

A pedido da Folha de São Paulo, escrevi uma nota sobre a expansão recente das universidades federais, como pode ser visto abaixo (clique na imagem para ampliar)

Eu certamente não defendi que o docente não seja concursado, mas que não seja funcionário público, que é muito diferente. O que provocou o pedido da Folha foi o levantamento felito pelo jornal de que , “de janeiro a agosto, 4.204 professores e outros 6.669 funcionários ingressaram nos quadros das instituições de ensino superior mantidas pela União.  As universidades já puxavam o crescimento do funcionalismo no governo passado, mas as proporções nunca foram tão altas como agora. Até o lançamento do programa de expansão do ensino superior, batizado de Reuni, professores e técnicos respondiam por um quarto das contratações do Executivo em 2007. No ano passado, pela metade. O programa se tornou uma das principais bandeiras da propaganda política petista. Lula se gabava de ter sido o presidente que mais criou universidades na história, embora, das 14 mencionadas, nove sejam resultado de mera fusão, desmembramento ou ampliação de instituições preexistentes”.

A questão de fundo é discutir qual deveria ser a política federal para o ensino superior, e como melhor usar os recursos públicos para isto.  Os dados recentes da OECD indicam que o Brasil gasta 11 mil dólares por ano por estudante de nível superior, próximo da Suécia, 13 mil, e mais do que Portugal 7 mil. Este custo tão alto explica porque o setor público não tem conseguido crescer nem responder de forma adequada à demanda crescente por ensino superior da sociedade, que tem sido atendida, bem ou mal, pelo setor privado.  O que faz nosso sistema tão caro é que todas as instituições públicas estão organizadas em um formato único, o da “universidade da pesquisa”,  que supõe que os professores tenham contratos integrais e de dedicação exclusiva, ainda que de fato a pesquisa esteja concentrada em umas poucas instituições. Isto não ocorre em outros países. Na Suécia, por exemplo, o governo gasta 20 mil dólares por estudante nas universidades de excelência e com pesquisa de alto nível, e 6 a 7  mil em instituições de ensino superior de tipo tecnológico ou “pos-secundárias”, trazendo assim a média geral para 13 mil.  Se a opção brasileira é usar os recursos públicos para massificar a educacão superior pública, deveria haver um formato muito mais barato, com ênfase no ensino e programas mais curtos adaptados às características da maioria dos nossos estudantes – em grande parte provenientes de escolas públicas de má qualidade, que precisam trabalhar e estudar à noite.  Se a opção é desenvolver o ensino superior de alto nível  e de qualidade, então os custos por aluno deveriam aumentar , assim como as exigências de desempenho acadêmico e científico por parte destas instituições. Se a opção é fazer as duas coisas, então seria necessário fazer como a Suécia e a maioria de outros países, e criar um sistema público altamente diferenciado. Em qualquer dos casos, o ensino superior público no Brasil continuará sendo caro, não dispensando a colaboração do setor privado e, cedo ou tarde, tendo que enfrentar a questão da cobrança de anuidades para os estudantes que podem pagar.

Author: Simon Schwartzman

Simon Schwartzman é sociólogo, falso mineiro e brasileiro. Vive no Rio de Janeiro

9 thoughts on “Qual deve ser a política federal para o ensino superior?”

  1. Prezado Simon,

    Desculpe-me por prolongar um pouco mais o assunto.

    Obrigado por sua resposta. Estou lendo o artigo que você recomendou, tentando seguir as referências e encontrar algumas resposta para minhas dúvidas. Apesar do interesse que tenho, como cidadão e como professor de uma instituição pública, não sou estudioso do assunto. Tenho certeza, por experiência própria, que há muita ineficiência e desperdício nas instituições públicas. Com certeza o custo por aluno no Brasil é bem mais alto do que poderia e deveria ser. Mas me espanta como é difícil conseguir clareza nos dados.

    Na minha humilde opinião, é difícil aceitar comparações de custo por aluno com outros países sem saber ao certo se esse custo está sendo contabilizado do mesmo modo em cada país comparado. Para usar apenas um exemplo: se o custo no Brasil inclui os hospitais universitários e na Suécia não, fica complicado comparar os dois países. Outro exemplo, tirado da página 12 do artigo que você “linkou” acima, “gastos com inativos representam despesas previdenciárias e não gastos com a manutenção de ensino, provocando sérias distorções em análises comparativas com os orçamentos de instituições privadas, nacionais e estrangeiras”.

    Como leigo me espanta a dificuldade em conseguir uma informação tão básica quanto as despesas que estão ou não sendo computadas! Detalhes que podem fazer a diferença entre ter um custo inflado em 20% ou em 100%!

    Concordo com relação à importância em fiscalizar o uso de nosso dinheiro em instituições públicas. Não questiono isso de modo algum. A questão da adequação dos cursos e da diferenciação entre tipos de universidade é corretíssima, assim como questionar a baixa produtividade dessas instituições. Assino em baixo da crítica ao ENADE. Mas sinto falta de mais profundidade nessa discussão. Não especificamente de sua parte, mas no debate em geral no país. Falta explicitar claramente qual modelo que queremos implantar, em detalhes e não apenas em geral: quantos alunos por professor, custo anual, como escolher as instituições de pesquisa, quantas elas devem ser, etc… E como migrar do que temos hoje para o que queremos. Eu (mero leigo no assunto) não vejo ninguém discutindo isso de forma aberta para que eu possa ter uma opinião contra ou a favor!

    Com relação à questão das instituições privadas, não vejo problema que elas atendam 78% dos alunos do ensino superior e é muito bom que ofereçam cursos de curta duração. Mas o “bem ou mal” já me incomoda muito pois atualmente o “mal” está muito abaixo daquilo que seria aceitável. E não, não estou falando em formar alunos tipo Unicamp ou algo do gênero, mas um aluno de exatas que não se atrapalhe com a soma de frações.

    Afinal, não há nenhuma vantagem em oferecer cursos de curta duração, supostamente mais adequados aos alunos com baixa qualificação, se os seus alunos ingressantes são tão mal preparados que não sabem interpretar uma receita de bolo ou resolver uma equação de segundo grau. Não vai ser ensino superior! Você acaba com um aluno com diploma de Tecnólogo em Administração (2 anos) que não sabe juros compostos.

    É claro que o problema é a baixíssima qualidade do aluno ingressante. Mas nenhuma faculdade recusa aluno por baixa qualificação: os “processos seletivos” são concebidos para que ninguém deixe de passar, mesmo analfabeto funcional. Depois ele tem que ser aprovado a qualquer custo para manter a faculdade rentável.

    Como você mesmo disse, as exigências do MEC são meramente formais (os programas nunca são cumpridos de verdade) e as curvas de distribuição do ENADE não permitem avaliar de verdade as instituições. Só uma prova como a da OAB para mostrar o tamanho do buraco: uma faculdade com 11% de aprovação na OAB pode conseguir o mesmo CPC 4 de uma faculdade com 50% de aprovação na OAB. Ou seja: o ENADE é quase inútil como método de avaliação e perfeito para esconder essas discrepâncias.

    O problema existe nas universidades públicas também, mas não na escala em que existe nas instituições privadas. E deveria ser questionado tanto na rede pública quanto particular. A minha crítica, não especificamente ao seu artigo mas à abordagem geral dessa questão, é que só há repercussão entre os especialistas se o problema for no ensino público. Se o aluno estiver pagando mensalidade está tudo bem: o direito à “ruindade” é até defendido com unhas e dentes por colunistas de renomadas revistas semanais.

    Na minha humilde opinião os “méritos” da maior parte das instituições particulares são muito questionáveis e elas são tratadas de forma muito complacente pela mídia especializada.

    Estaria tudo bem se fosse apenas uma prestação de serviço mal feita: só caberia ao cliente reclamar. O problema é que os “clientes” estão recebendo diplomas que atestam que eles têm um nível de conhecimento que na verdade não tem.

    E a meu ver ninguém está debatendo o processo de “faz de conta” no ensino superior. Mesmo que seja para assumir de forma que é só isso que dá para fazer com os alunos que hoje chegam ao ensino superior no Brasil. Ao menos seria honesto.

    Saudações.

  2. Prezado Simon:

    Entendo a sua posição e acho fundamental a questão de fundo de seu argumento, qual seja procurar respostas sobre o que pretendemos com e para o ensino superior brasileiro; isto se supõe, tendo em vista o papel estratégico do conhecimento nos dias atuais. A China pensou, estrategicamente, esta questão, com muita antecedência, e agora está em condições de competir, no plano internacional, em várias frentes, inclusive no campo da ciência e da tecnologia. Há de se pensar na expansão de um sistema de ensino público altamente diferenciado em padrões de qualidade universais.

    Esta é, a meu ver, uma questão de princípio. Conhecimento de qualidade gera conhecimento de qualidade, aprendizagem de qualidade gera aprendizagem de qualidade. Quanto mais se democratiza o conhecimento de qualidade mais qualidade se tem no cotidiano da sociedade. Diferentemente do capital material, o capital cultural não se esgota com sua distribuição.

    O ensino público é orientado, no processo e no produto, por princípios de qualidade de natureza mais universal, não se aprisionando aos ditames de interesses localizados. Lembro-me do educador Comenius, autor do primeiro compêndio sobre didática: “Didática Magna: a arte de ensinar tudo a todos.” Escrito por volta de 1630, no contexto de grandes transformações no campo do conhecimento e no alargamento da compreensão sobre as coisas mundo, época de acirrados conflitos tais como A Guerra dos Trinta Anos (religiosa). Ele propõe uma educação universal voltada para a paz. Educação esta concebida em âmbito internacional e coordenada por conselho qualificado.

    Lembremos, que a expansão do ensino superior público retroalimenta a pós- graduação de pesquisa, uma vez que os novos postos de trabalho no ensino público são um mercado para jovens doutores, qualificados em instituições credenciadas pela Capes e submetidos a concurso público de abrangência nacional.

    Ana Maria de Rezende Pinto
    Doutora em Educação pela PUC de São Paulo –
    História e Filosofia da Educação

  3. Prezado Simon,

    Desculpe-me o comentário excessivamente longo, mas acaba sendo inevitável diante do tema.
    Não posso deixar de sentir falta de um maior detalhamento nesse artigo. Especialmente pelo fato de que, aqui em seu sítio, não existem nem a limitação de espaço nem a intermediação de uma entrevista a jornal.
    Na verdade não se trata apenas de seu artigo ou seu site: vejo muita gente argumentando sobre a questão de forma, diria eu, superficial, tanto nos dados como nas sugestões.

    Por exemplo, vejamos o custo por aluno do ensino superior público. Já vi todo tipo de dado até US$ 17.000,00! No seu artigo você menciona US$ 11.000,00 calculados pela OECD. Agora nunca vi ninguém explicar a metodologia desses números. Exemplos de dúvidas minhas a esse respeito:

    – Simplesmente divide-se o orçamento das universidades pelo número de alunos?
    – Os alunos de pós entram na conta?
    – As horas de pesquisa dos professores entram na conta ou são descontadas?
    – E os custos dos laboratórios e projetos de pesquisa não relacionados ao ensino nem mesmo de pós?
    – Os dados são fornecidos pelos governos ou computados de forma independente?
    – As regras contábeis são as mesmas em todos os países?
    – Como são tratadas as despesas que no Brasil estão nos orçamentos das universidades (como aposentadorias e hospitais universitários) e que lá fora não necessariamente entram na contabilidade como despesa universitária?
    – De quando são os dados e qual o peso da sobrevalorização do real?

    Na minha opinião, sem saber esses “detalhes” fica difícil saber se o ensino superior público brasileiro está realmente tão caro. Mas até hoje nunca vi ninguém fornecer de forma clara essas informações. Nem mesmo citar de forma precisa as fontes dos estudos que chegaram a esses valores.

    Assumindo que as universidades públicas brasileiras sejam realmente muito caras, não vejo nenhum diagnóstico quantitativo das causas! Há poucas vagas por turma? A evasão é alta? Os professores ganham muito? Dão poucas horas de aula? Há muitos professores desviados para funções administrativos?

    Por exemplo, em minha cidade (Vitória, ES) o salário de um professor da universidade federal só se torna maior que o salário das universidades privadas se o professor tiver doutorado ou mestrado e dedicação exclusiva (DE). E isso já levando em conta que o professor da universidade federal não dá 40 horas de aula: eu estou comparando com o salário das particulares para um tempo semelhante em sala de aula, já que as particulares não pagam por pesquisa e extensão. Se o professor estiver no regime de 40 ou 20 horas (sem DE) ele ganha um pouco mais ou um pouco menos nas particulares pelo mesmo tempo em sala de aula, dependendo do nível na carreira. Se não tiver mestrado ou doutorado sempre irá receber mais na rede particular.

    Então é o salário dos doutores com DE que encarece a universidade federal? Tudo bem que fiz uma conta aproximada com base nos casos que conheço em alguns departamentos da universidade. Mas gostaria de ver essa conta detalhada na ponta do lápis. Quanto custa a hora de aula efetivamente ministrada? Alguém já fez essa conta? Onde encontro os dados necessários para isso?

    Se o problema é a estabilidade e a necessidade de avaliações de desempenho (com as quais concordo) como isso deve ser implementado? Como fazer para evitar o uso político da “instabilidade” do professor? Como evitar que a avaliação de desempenho se transforme em mera premiação a quem não reprova o aluno, mesmo que ele não aprenda nada? Propostas objetivas, por favor!

    Se as instituições não devem ser governadas pelos seus funcionários e professores, como deve ser essa governança? Concordo, sem dúvida, com a necessidade de controle externo. Mas como? O presidente da república indica o gestor? Ou seria o congresso? Quem comporia os conselhos externos? Como implementar isso?

    Concordo também que nem toda instituição deve ser “universidade de pesquisa”. Mas não vejo discutir-se quantas e quais seriam “de pesquisa”. As que não são “de pesquisa” teriam bacharelados? E pós-graduação? Poderíamos ter estados/regiões sem nenhuma pós-graduação pública? Também não vejo nenhuma discussão objetiva sobre como conduzir essa “transição”.

    Além disso, não creio que essa separação seja tão clara mesmo lá fora: nem toda universidade americana é como Harvard, MIT ou Stanford mas as que não o são também não são necessariamente community colleges. Existem gradações aí: universidades com alguns departamentos voltados ao ensino enquanto outros mantêm (fortes) programas de pesquisa.

    E se a opção for pelos cursos “tecnológicos” essa opção tem que ser clara e honesta: parar de vender cursos de “tecnólogos” de dois anos como “equivalentes” aos bacharelados de 4 ou 5 anos, tratando-se de mera questão de foco no mercado, pois não são.

    Por fim não posso deixar de achar interessante como tem sido comum na mídia críticas à expansão das universidades federais com base na preocupação em relação à falta de estrutura das novas unidades. Também se questiona muito a qualidade dos alunos que ingressam nos novos campi e que não teriam base acadêmica para acompanhar os estudos. Concordo com essas preocupações, mas não posso deixar de notar que a mesma preocupação não existe em relação às instituições privadas. Apesar das conhecidas deficiências de estrutura e da baixa qualificação dos alunos ingressantes na maioria delas, essas instituições são saudadas por diversos meios de comunicação como um avanço que permitiu o acesso ao ensino superior das camadas mais humildes da população, oriundas das escolas públicas. As deficiências de estrutura e as consequências da baixa qualificação dos alunos são um pequeno detalhe que não incomoda quem defende o grande serviço social prestado pelas faculdades particulares. Essas questões só se tornam problemas graves nas universidades públicas. Interessante…

    Da mesma maneira, nunca vi ninguém na mídia questionando porque as universidades particulares brasileiras não são como as suas semelhantes nos países que levam a educação superior a sério. Afinal, onde está a Havard brasileira?

    Resumindo, vejo as críticas atuais ao crescimento da rede federal sendo justificadas com dados pouco detalhados e “receitas” genéricas e superficiais baseadas em um “como é lá fora” que nunca é realmente explicado. Faltam dados devidamente contextualizados e propostas objetivas. Acabo tendo a impressão de estar diante de chavões equivalentes aos tradicionais “ensino público, gratuito e de qualidade” e “indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão” que normalmente vemos serem usados para rebater qualquer crítica às universidades públicas.

    Saudações.

    1. Prezado Teixeira,

      Existe uma literatura crescente sobre o ensino superior no Brasil e no mundo que trata das questões que voce coloca, e que eu não teria como resumir em um pequeno artigo de jornal ou uma nota de blog. No entanto, se você entrar na parte de artigos e livros no meu site, vai encontrar muitos textos meus com extenso uso de dados e referencias bibliográficas.
      Em relacão a custos das universidades públicas, existem controvérsias sobre a maneira com que eles são calculados, sobretudo em relação à inclusão ou não dos custos dos hospitais universitários na conta. De qualquer maneira, não há dúvida que o custo por aluno das universidades federais é o mais alto da América Latina, e se aproxima ao da OECD. Voce pode encontrar uma discussão detalhada e os dados principais entre outras fontes no trabalho de Jacques Schwartman “O Financiamento das Instituições de Ensino Superior no Brasil”, disponível em http://proyecto.unlam.edu.ar/espec/htdocs1/%5Cprogramas%5CFinanciamiento%5CInforme%20Financiamiento%20-%20Brasil.pdf .
      Em relação ao ensino privado, ele tem inúmeros problemas, que no entanto não podem ser usados para justificar os problemas das instiituições públicas. As razões pelas quais me parece importante examinar criticamente o que ocorre nas instituições públicas são, primeiro, porque elas são financiadas com impostos pagos por toda a população, e por isto devem fazer bom uso destes recursos; e, segundo, porque elas reunem uma parte importante do talento e da competencia cientíifica e profissional que existe no país, e por isto mesmo não podem se acomodar aos padrões medíocres de desempenho que existe em grande parte delas. As avaliaçoes do Ministério da Educação não mostram a situação real, porque trabalham com curvas de distribuição dos conceitos no ENADE e não adotam critérios de referência explícitos sobre o que é ou não aceitável, mas existem outros indicadores, como fracasso de grande parte dos formados em direito no exame da OAB, ou o fato de que não mais do que 5 universidades brasileiras, das quais as três paulistas e duas ou três federais (UFMG, UFRJ, UFRGS), aparecem nos rankings internacionais de ensino superior.
      O problema da má formaçao dos alunos que entram no ensino superior não ocorre só no setor público, mas tambem no privado. O setor privado tem o mérito, em relação a isto, de estar avançando mais do que o público na criaçao de cursos tecnológicos de curta duração, e também por ter sempre resistido, embora sem muito sucesso, às exigências formais do Ministério da Educaçao para que eles se conformem ao modelo da “universidade de pesquisa” que claramente não se aplica à grande maioria das instituiçoes do setor privado.
      O outro mérito do setor privado é ter atendido, bem ou mal, à demanda por educaçao superior no Brasil (78% das matrículas), coisa coisa que o setor público não conseguiu até hoje fazer, e não vai conseguir enquanto não levar a sério a questão da diferenciaçao de suas instituiçoes.
      A última questão, também controversa, é a dos sistemas de gerenciamento interno das universidades. Existe uma grande variedade de formas de gerenciamento interno, que combinam participação de professores, representaçao de alunos e representantes externos do governo, do setor empresarial e da sociedade civil. Na maioria dos países, os reitores tendem a ser contratados de fora das universidades, para evitar que fiquem prisioneiros dos grupos de interesse internos que os elegem. Em relaçao a isto o Brasil, como a maioria dos países latinoamericanos, ocupa uma posicao extrema de controle corporativo das instituiçoes, que tem sido apontado por muitos autores como uma das razões de sua imobilidade e dificuldade de inovar.

  4. O tema vai e volta e nada muda na política federal para o ES, que se cristaliza na própria avaliação (Sinaes/Enade). O modelo de universidade “research intensive”, onde todos são tempo integral, boa parte dos recursos vão para PG stricto sensu e para infraestrutura de pesquisa, e a carreira é unicamente avaliada por resultados de pesquisa, é aquele que se aplica a todo o sistema, mesmo às Fatecs e instituições voltadas à formação profissional. Universidade, no Brasil, é sinônimo (formal) desse tipo de instutição, e isso é valorizado pelos atributos legais de que se beneficiam as assim classificadas pelo MEC.
    Quem não quereria ser uma então? Estamos vendo os institutos federais se tornarem universidades. Não se consegue estabelecer um grupo de instituições públicas dedicadas à formação de graduação, por exemplo, de professores para a educação básica. Aqui formamos cientistas da educação nas IES públicas para serem professores de crianças: resulta em que 90% dos professores das crianças são formados por instituições privadas. E por aí vai, o que você e a Eunice falam e escrevem há mais de 20 anos não sensibiliza nem nossos educadores, nem nossos dirigentes universitários, nem os governos que vem e vão (com algumas excessões honrosas).

  5. Simon, concordo com quase todo o diagnóstico que vc faz sobre o ensino público superior no Brasil, mas discordo da solução que propõe. Em primeiro lugar, hoje o sistema de controle por resultados, via CAPES, e uma certa competição no mercado acadêmico tem obrigado os cursos de pós-graduação a estabelecerem metas e padrões de produtividade acadêmica de forma bem clara. De outro lado, no nível de graduação o sistema tem expandido de forma significativa. O problema maior da expansão do sistema público federal, e que ele se dá através de reprodução burocrática sem qualquer processo de diferenciação funcional. Ora, isto estrangulará o sistema federal de ensino em termos financeiros, em pouco tempo. É bom lembrar que universidades de pesquisa são realmente caras e não são, especialmente por esta razão, adequadas para sustentar a expansão do sistema de ensino superior. Nos US e Europa, as universidades de pesquisa que se transformaram em ensino de massa, o fizeram via diferenciação de cursos em profissionalizantes, acadêmicos, técnicos e de extensão. O modelo de expansão do sistema público federal brasileiro, via reprodução burocrática e isonômica, de universidades de pesquisa simplesmente será incapaz de manter o financiamento atual para continuar crescendo em qualidade e desempenho técnico-científico. É bom lembrar que o grosso da pesquisa científica no país é feita nas federais. Com o esgotamento financeiro, haverá, certamente, ( como ocorreu com o ensino básico) esvaziamento e até sucateamento das instituições federais. Deste ponto de vista, a política atual de expansão do sistema federal de ensino superior via o modelo de universidade de pesquisa, ou é totalmente ingênuo ou totalmente irresponsável.

    Antonio Augusto Prates

    1. Antonio Augusto, eu não vejo qual a discordância, acho que estamos dizendo a mesma coisa. Quanto à pos graduacão, é verdade que ela tem incentivos bastante razoáveis para o desempenho, embora demasiado burocráticos e acadêmicos (mas este é um outro assunto).

  6. Não tiro a razão do prof.Schwartzman, principalmente quanto a falta de controle externo nas universidaes publicas. Mas na minha opinião quanto mais Universidades públicas melhor . Nao havera desenvolvimento e nem seremos o pais do futuro sem pesquisa e investimento do dinheiro publico em ensino e pesquisa superior. Se deixarmos com o mercado ( 99% da pesquisa morre e 100% da pesquisa em humanas ). Me parece facil , depois da carreira feita, depois de uma vida intelectual em boa parte financiada por dinheiro publico , criticar a expansao das universidades federais . Sera que o Sr. Schwartzman , se tivesse 30 anos , completando seu doutorado agora , será que ele escreveria os comentários que escreveu ?

    1. Eu creio que não critiquei a expansão das universidades federais de forma geral, mas sim da maneira em que ela está sendo feita. Eu acredito que o setor público tem um papel importante a desempenhar em relação ao ensino superior, mas isto deve ser feito com clareza de objetivos, ponderando o custo relatio e as necessidades de investimento em outros setores (como da educação fundamental e técnica) e tomando em conta tambem os problemas de equidade social (não gastar dinheiro de impostos pagos por toda a sociedade para beneficiar quem não necessita).

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