Versão 15/6/01

Notas sobre o paradoxo da desigualdade no Brasil

Simon Schwartzman

Apresentado no Rio Workshop on Inequality, Rio de Janeiro, 3 a 6 de julho, 2001

As causas da pobreza

Pobres dignos e indignos

Pobreza e escravidão no Brasil

O Welfare State brasileiro

Hierarquia, paternalismo e direitos sociais

Os paradoxos da desigualdade

Notas


As causas da pobreza

"As causas da pobreza", dizia meu antigo professor de direito, "são duas: as voluntárias e as involuntárias". Para nós, estudantes de ciências sociais, as causas da pobreza não podiam ser individuais, mas estruturais: a exploração do trabalho pelo capital, o poder das elites que parasitavam o trabalho alheio e saqueavam os recursos públicos, e a alienação das pessoas, criada pelo sistema de exploração, que impedia que elas tivessem consciência de seus próprios problemas e necessidades. Quando a TV ainda engatinhava em Belo Horizonte, participei de um programa ao vivo com uma senhora da tradicional família mineira que organizava bailes beneficentes, e fiquei chocado quando percebi que não conseguiria convencer ao apresentador, e muito menos ao público, que o que ela fazia era cínico e nocivo, mantendo os pobres iludidos pelas migalhas que sobravam das festas da alta sociedade. Como ousava este garoto, de mineiridade incerta, duvidar do espírito caridoso da elegante dama? Falar com os pobres não adiantava muito. Visitando um barraco de favela, comentei com o morador sobre as péssimas condições em que ele vivia, tentando estimular sua consciência de classe. A resposta foi de indignação. Ele era pobre, sim, mas tinha orgulho de seu barraco limpo e arrumado. Que direito tinha eu de dizer que ele vivia uma vida miserável?

A pobreza e a desigualdade são tão antigas quanto a humanidade, e sempre vieram acompanhadas de forte sentimentos morais. Menos ingênuo do que imaginávamos, o velho professor participava de uma corrente de pensamento que se tornou famosa na época de Thomas Malthus, na Inglaterra, mas que ainda hoje tem seus fortes adeptos: a de que uma parte, talvez a maior, dos problemas da pobreza, é culpa dos próprios pobres, que não têm determinação e força de vontade para trabalhar(1). Para Malthus, a causa principal da pobreza era a grande velocidade com que as pessoas se multiplicavam, em contraste com a pouca velocidade em que crescia a produção de alimentos. O problema se resolveria facilmente se os pobres controlassem seus impulsos sexuais e deixassem de ter tantos filhos. Minorar sua miséria só agravaria o problema, porque, alimentados, eles se reproduziriam mais ainda. A melhor solução seria educá-los, para que aprendessem a se comportar; ou então deixá-los à própria sorte, para que a natureza se encarregasse de restabelecer o equilíbrio natural das coisas. Uma outra versão desta associação entre pobreza e indignidade era dada pelo protestantismo, que via na riqueza material um sinal do reconhecimento, por Deus, das virtudes das pessoas, e na pobreza uma marca clara de sua condenação.

A visão maltusiana da pobreza era extrema, e colidia com o valor da caridade, tão presente na tradição judaica, cristã e de outras religiões. Em todas as sociedades, sempre se reconheceu a virtude de ajudar aos pobres, ao mesmo tempo em que aceitava a inevitabilidade das diferenças sociais e da miséria humana. Michael Katz, um historiador norte-americano que trata do tema das ideologias da pobreza em seu país, observa que, "antes do século XIX teria sido absurdo imaginar a abolição da pobreza. Os recursos eram finitos, e a vida era dura. A maioria das pessoas nasciam, viviam e morriam na pobreza. As questões eram, então, quem, entre os necessitados, deveria receber ajuda? De que maneira a caridade deveria ser administrada?" (2)

Para responder a estas questões era necessário classificar as pessoas. Katz mostra como na Inglaterra, através das "poor laws" do século XIX(3), assim como nos Estados Unidos na mesma época, dois tipos de classificação foram tentadas. Havia, primeiro, um critério de proximidade - a prioridade deveria ser dada aos parentes, vizinhos e concidadãos, e não aos desconhecidos, estranhos ou estrangeiros. Esta classificação, em si, não tinha um sentido moral, e podia refletir, simplesmente, uma visão realista sobre os recursos finitos disponíveis e as necessidades infinitas dos pobres. Mas sabemos que, na prática, as distinções entre "nós" e "os outros" costumam vir carregadas de preconceitos - os "outros" são vistos não somente como distantes, mas também como desprovidos das qualidades que mais apreciamos, as nossas. A outra classificação distinguia claramente entre a pobreza involuntária - e por isto digna - dos órfãos, doentes e viuvas, da pobreza voluntária - e por isto indigna - das pessoas saudáveis que não queriam trabalhar para se manter. Katz fala da diferença que os autores americanos e ingleses da época estabeleciam entre "poverty" e "pauperism", cuja melhor tradução para o português talvez seja como "pobreza" e "mendicância". A pobreza era entendida como uma condição natural das pessoas, que, em situações especiais, ficavam desvalidas, e merecedoras de amparo; a mendicância, por outro lado, era uma deformação de caráter, e por isto indigna de apoio e ajuda.

Existe no entanto outra maneira, também antiga, de tratar o problema. A idéia de que as causas da pobreza e os caminhos para sua solução não dependem da vontade ou do caráter dos indivíduos, mas das relações entre as pessoas, sempre esteve presente nas formas mais radicais do cristianismo, e, na época moderna, nos escritos e movimentos políticos socialistas e comunistas. Para uns, a solução dependia ainda de uma regeneração moral, não mais dos pobres, mas dos ricos, cujo egoísmo e acaricia deveriam ser transformados em verdadeira caridade e sentimento de justiça.

Para os marxistas, esta crença no poder transformador das convicções e da força moral era o que caracterizava o "socialismo utópico", que deveria ceder lugar a um "socialismo científico", que entendesse a verdadeira natureza dos conflitos sociais, e os levasse à sua conclusão natural. A história da humanidade, dizia o Manifesto Comunista, era a história da luta de classes, e era através dela que os problemas da pobreza encontrariam sua solução. "Homens livres e escravos, patrícios e plebeus, lordes e servos, mestres e empregados, em uma palavra, opressores e oprimidos, sempre tiveram em oposição, em uma guerra sem fim, às vezes oculta, as vezes aberta, que levava seja a uma reconstituição revolucionária da sociedade como um todo, seja à ruína das classes em conflito."(4) Com o capitalismo, as antigas classes estavam desaparecendo, restando apenas a burguesia e o proletariado, que se confrontariam na luta final pelo fim da pobreza e da desigualdade social.

Pobres dignos e indignos

O problema era com os que ficavam fora, à margem das classes em conflito. Os proletários, no capitalismo, são pobres, mas nem todos os pobres têm o lugar de honra de parteiros do futuro que Marx atribuía ao proletariado. "De todas as classes que se confrontam hoje com a burguesia", dizia Marx, "só o proletariado é realmente a classe revolucionária. As outras classes decaem e finalmente desaparecem ante a Indústria Moderna; o proletariado é seu produto especial e essencial". O que dava aos proletários este lugar especial era seu papel na divisão social do trabalho, como os que efetivamente trabalhavam, como grandes exércitos, na produção da riqueza, que os burgueses expropriavam. Ao lado destes pobres virtuosos, portadores do futuro, estavam os marginais, os decaídos, vítimas da dissolução das antigas classes sociais em decadência: Eram, segundo Marx, "a 'classe perigosa', a escória social, as massas que apodreciam ao serem expelidas pelas camadas mais baixas da sociedade antiga". Estes grupos poderiam, eventualmente, participar dos movimentos revolucionários do proletariado, mas o mais provável é que fossem corrompidos e manipulados pela "intriga reacionária" da burguesia. É desta forma que Marx traz de volta, pela porta dos fundos, a distinção moral entre a pobreza digna, revolucionária, do proletariado, e a pobreza indigna, reacionária, corrompida e corruptível, a escória do lumpenproletariat, os marginais.

Ao longo do século XX, o ímpeto revolucionário do Manifesto passou por transformações inesperadas, com os camponeses e soldados da Rússia e da China tomando a bandeira do proletariado industrial, enquanto o que o proletariado nos países industrializados se aburguesava. Na Europa, a social democracia suplantou, em quase toda parte, os antigos partidos comunistas, e os conflitos e negociações entre o capital e o trabalho redundaram na criação de uma nova ordem social que garantia uma melhor distribuição da riqueza entre burgueses e proletários. Era o Welfare State, ou o Estado do Bem Estar social. Esta nova forma de organização social, que parecia reunir o melhor dos mundos, reduzindo a pobreza sem afetar a riqueza dos burgueses e capitalistas, passou a ser copiada em outras partes, inclusive no Brasil, onde, no entanto, os proletários e burgueses eram poucos, e os pobres, indignos vivendo às margens e ao lado da sociedade criada pelo império comercial português, eram a maioria.

Pobreza e escravidão no Brasil

Ninguém parece ter pensado, no Brasil do século XIX, em criar leis e instituições para ajudar aos pobres, como se tentou fazer na Inglaterra ou nos Estados Unidos. Uma possível razão foi que o Brasil não assistiu aos grandes deslocamentos, destruição de postos de trabalho e explosão populacional que acompanharam a revolução industrial na Europa, nem as grandes maciças que inundaram os Estados Unidos naqueles anos, e que acabaram sensibilizando os ricos e remediados.. A pobreza brasileira no século passado não era muito diferente da pobreza dos séculos anteriores, e nossas elites tampouco eram muito distintas.

Mais ainda, enquanto que na Europa e nos Estados Unidos, ao longo do século XIX, crescia a noção de que todas as pessoas tinham direitos iguais, a sociedade e a economia brasileiras mantinham a escravidão como um componente central. Existe uma grande discussão, entre os especialistas, sobre a natureza e as características da escravidão brasileira, que parece girar ao redor de dois grandes temas. A primeira era se a escravidão brasileira teria sido mais ou menos cruel e opressiva do que a que existia nos Estados Unidos e na região do Caribe(5). O tema implícito, aqui, é o da irredutibilidade ou não do preconceito e dos conflitos raciais, e a questão de se o Brasil poderia aspirar a ser ou não, no futuro, uma sociedade racialmente integrada. A segunda é a questão, colocada sobretudo por autores marxistas brasileiros, de se os escravos teriam ou não sido uma "classe virtuosa" e digna, de alguma maneira similar ao proletariado europeu, que seria também portadora do futuro e da igualdade, quando o país evoluísse do escravismo para as formas mais modernas de exploração econômica. Os dois temas correspondem às duas maneiras diferentes de entender os problemas da pobreza e da desigualdade que destacamos a princípio. No primeiro, as explicações são de tipo moral, cultural ou religioso. As diferenças no relacionamento entre senhores e escravos no Brasil e Estados Unidos seriam explicadas, por exemplo, pelas diferenças entre as tradições e instituições católicas e protestantes de cada país.(6) No segundo, as explicações são de natureza aparentemente econômica, mas a questão ética continua presente, ainda que de outra forma - a de entender porque a escravidão brasileira, e o proletariado que surgiria depois dela, não eram entendidos por suas vítimas com a clareza que deveriam. Nesta perspectiva, o grande problema teria sido o da "falsa consciência" - os escravos que não entendiam que eram realmente escravos, e os proletários, depois, que não entenderiam que eram verdadeiros proletários, e por isto não se organizavam para defender seus interesses e acabar com a exploração.

Jacob Gorender, historiador marxista que se dedicou ao tema da escravidão(7), não tem dúvida de que a escravidão foi o "modo de produção" que caracterizou a economia e sociedade brasileira até o século XIX, e não se deixa abalar pelas grandes variações nas condições de vida e de trabalho dos escravos e libertos que conviviam lado a lado. Historiadores que olharam mais de perto a sociedade brasileira daqueles anos, como Gilberto Freyre, Maria Sylvia de Carvalho Franco e, mais recentemente, Kátia Mattoso, encontraram, primeiro, que ser escravo podia ser coisas muito distintas - desde o escravo da lavoura, das "plantations" de açúcar, até ser "escravo de ganho", artesãos e operários semi-independentes, que conseguiam, muitas vezes, reunir dinheiro para comprar sua própria liberdade.(8) Depois, haviam possivelmente mais pobres que não eram escravos do que escravos propriamente, sobretudo ao longo do século XIX. Na Bahia, em 1808, segundo as estimativas de Kátia Mattoso, haviam 144 mil negros e mulatos livres, comparados com 118 mil negros e mulatos escravos, para uma população de 356 mil pessoas. Ao final do século, no Censo de 1872, o número de negros e mulatos livres havia aumentado quase seis vezes, para 830 mil, enquanto que o de escravos havia aumentado em 40%, para 167 mil, em uma população total de 1,380 mil.(9) Kátia Mattoso faz uma distinção entre regiões de "dominante branca", em que a população negra é minoria, e permanece confinada econômica e socialmente (como em São Paulo e nos estados sulinos), e uma região de "dominante negra", como a Bahia, aonde a ordem escravocrata tradicional não consegue se manter da mesma forma. Mais importante parece ter sido o fato de que, no século XIX, a maioria da população brasileira, mesmo os que viviam no campo, não participava mais da economia de "plantation", ou seja, das grandes fazendas para a produção de açúcar e café, estruturadas a partir do trabalho escravo. A antiga economia do açúcar havia há muito entrado em decadência, a escravidão nas antigas áreas de mineração em Minas Gerais havia se transformado profundamente(10), e as grandes plantações de café, baseadas inicialmente no trabalho escravo, começavam a buscar outras formas de resolver seus problemas de mão de obra, através, sobretudo, da imigração.

A situação da Bahia não era isolada. Um quadro mais completo, elaborado em 1875 pelo senador Joaquim Floriano de Godoy, considerado bastante fidedigno, é apresentado por Alberto Passos Guimarães, como a primeira estatística dos "braços livres" no Brasil.(11) Em todas as províncias, exceto Minas Gerais, o número de trabalhadores livres na lavoura era superior ao de escravos; e, em todas as províncias, e especialmente em Minas Gerais, o número de desocupados era superior ao de trabalhadores, escravos ou não.

  Braços livres empregados na lavoura Braços escravos empregados na lavoura Braços livres desocupados (de 13 a 45 anos de idade)
Minas Gerais 278.588 288.767 1.032.314
Ceará (antes da seca) 174.482 7.767 227.139
São Paulo 252.579 60.612 308.581
Bahia 376.548 82.957 526.528
Pernambuco 229.769 38.714 400.583
Rio de Janeiro 131.204 141.723 327.438
Total 1.434.179 650.540 2.822.583

Maria Sylvia de Carvalho Franco, apesar de marxista como Gorender(12), prefere tratar a escravidão não como um modo de produção, mas como uma instituição. A diferença é importante, porque a idéia de um "modo de produção" supõe uma divisão do trabalho com cada grupo desempenhando um certo papel e ocupando um certo lugar, enquanto que a noção de "instituição" não traz a mesma idéia. Para a autora, uma escravidão imperfeita como a brasileira só poderia resultar em uma classe operária também imperfeita:
"Ao lado do latifúndio, a presença da escravidão freiou a constituição de uma sociedade de classes, não tanto porque excluiu delas os homens livres e pobres e deixou incompleto o processo de sua expropriação. Ficando marginalizada nas realizações essenciais da sociedade e guardando a posse dos meios de produção, a população que poderia ser transformada em mão de obra livre esteve a salvo das pressões econômicas que transformariam sua força de trabalho em mercadoria".(13)
O Welfare State brasileiro.

Com a República, a idéia de que algo deveria ser feito com a pobreza e a miséria em que viviam grande parte da população brasileira começa a ganhar força, por vários caminhos distintos. Para os positivistas, que participaram da campanha republicana e conseguiram entronizar seu lema da "Ordem e Progresso" na bandeira, o país necessitava de um governo forte, centralizado, que fizesse uso dos conhecimentos científicos para educar o proletariado, planejar a economia. e livrar o país da ignorância e da superstição das elites tradicionais. Esta ideologia autoritária e modernizadora fascinava os estudantes, intelectuais e os militares, ainda que não tivesse muito sucesso entre os outros e mais importantes parceiros do movimento republicano, as oligarquias que comandavam o Partido Republicano Paulista e Mineiro.(14) Em outros círculos intelectuais, prevalecia a noção de que os problemas do país tinham a ver com as características raciais e culturais da população brasileira, que impediam que a população desenvolvesse hábitos adequados de higiene e trabalho. Tratar das doenças tropicais, primeiro; estabelecer políticas eugênicas que pudessem assegurar, depois, o progressivo "branqueamento" da população; e, ao mesmo tempo, ajustar as instituições políticas e sociais do país às características culturais e sociais de seu povo, eram as maneiras de ir reduzindo os problemas do país, sem, naturalmente, esperar que a pobreza e da miséria desaparecessem de um dia para outro.(15)

A partir dos anos 30, estas diferentes concepções convergiram na visão de que a sociedade deveria ser organizada como um grande organismo onde cada parte desempenhasse suas funções, e que todos vivessem harmonia, sob a tutela de um poder magnânimo e protetor - a doutrina corporativista, inspirada nos textos da Igreja Católica daqueles anos, tingida pelos modelos autoritários da Itália e da Alemanha. Nesta concepção, a sociedade deveria ser pensada não como um conjunto de indivíduos agindo autonomamente, conforme os interesses de cada um, mas como um organismo pré-ordenado, no qual cada qual ocuparia um lugar previsto e determinado. Não se trataria de um sistema igualitário - diferenças e hierarquias continuariam existindo, associadas à divisão do trabalho, da autoridade e da responsabilidade entre os diversos grupos sociais. As instituições políticas - o executivo, o legislativo e o judiciário - teriam a responsabilidade de manter os diversos segmentos da sociedade trabalhando em harmonia, garantindo que os interesses privados não prevalecessem sobre os interesses coletivos, e o poder executivo garantiria, verticalmente, a integração e o bom funcionamento dos demais poderes.

Oliveira Viana, um dos intelectuais responsáveis pela montagem deste sistema, em uma conferência feita em 1939, apresenta um quadro idílico do corporativismo brasileiro, que, segundo ele, colocaria o país no mesmo nível das nações mais modernas daqueles anos, que ele cita - Estados Unidos, França, Itália, Alemanha(16). Segundo ele, o corporativismo seria a resposta tanto para a ganância e o egoísmo dos patrões quanto para a hostilidade dos trabalhadores em relação a estes, resolvendo, desta forma, o conflito entre as classes sociais. Haveriam cinco grandes problemas que o corporativismo deveria resolver: primeiro, modificar a mentalidade da classe patronal, no sentido de "fazê-la melhor sentir os seus deveres de solidariedade e fraternidade com a classe trabalhadora". Segundo, modificar a mentalidade do operariado, fazendo com que eles abandonasse o "espírito anti-patronal" e o "sentimento de inferioridade" típicos dos trabalhadores. Terceiro, constituir o "ambiente material e social" para que os trabalhadores aumentassem seu sentimento de dignidade humana e elevação social". É aqui que entrariam todos os serviços de atendimento às necessidades dos trabalhadores - "casas higiênicas e confortáveis, vilas operárias, cidades-jardins; instituições recreativas; instituições culturais; instituições sanitárias, clínicas domiciliares hospitalares, ambulatórios e preventórios; cooperativas e bancos populares; instituições de previdência; agências de colocação; tribunais do trabalho, acessíveis e gratuitos". O quarto problema era o da "organização da capitalidade social da classe trabalhadora", dando aos trabalhadores possibilidade de melhorar sua condição individual através da educação, mas sobretudo pela criação de lideranças que pudessem participar, em pé de igualdade com os empresários, das decisões de interesse comum. O quinto, finalmente, era o da "oficialização da assistência social, elevando-a à condição de um serviço público, mesmo quando realizada pela iniciativa privada". Para isto, diz Oliveira Viana, "o Estado procura dar uma articulação mais perfeita a todos os serviços organizados pela caridade e pela filantropia, no sentido de submetê-los à sua disciplina, ao seu controle e à sua orientação, entrosando-os na engrenagem de suas instituições oficiais e administrativas e estabelecendo a progressiva identificação da assistência social privada com a assistência social pública".

Tão eloqüente quanto o que diz são os silêncios desta extraordinária conferência: quem a lê, pode não se lembrar que o mundo estava em guerra, que o Brasil vivia sob a ditadura da Constituição de 1937, e que a "classe operária" brasileira era uma pequena fração da população do país naqueles anos. Alguns anos depois, o Brasil entra na guerra do lado dos aliados, e, com a queda de Getúlio Vargas, a defesa explícita e entusiasmada da ordem corporativista já não poderia ser feita. No entanto, as instituições criadas naqueles anos continuariam existindo até os dias de hoje, e, mais ainda, sua inspiração mais central continuaria sendo aceita - a idéia de caberia às elites, modernizadas pela ciência e pela educação, e através do controle do Estado, ordenar a sociedade, cuidar do bem estar dos brasileiros, e transformar o país na grande nação que deveria ser o seu destino.

Esta não era, no entanto, a única alternativa possível. Enquanto, positivistas eugenistas e corporativistas, cada qual à sua maneira, buscavam respostas para os problemas da população brasileira como um todo, desde o inicio do século imigrantes italianos e espanhóis, principalmente, começavam a se organizar em cooperativas de ajuda mútua, sindicatos e até mesmo partidos políticos e organizações de esquerda, comunistas ou anarquistas, e ensaiavam as primeiras greves, sem esperar os benefícios ou a caridade das elites. Em 1906 se organiza o Primeiro Congresso Operário do Brasil, que é o embrião de um movimento sindical que terminaria sendo absorvido e "domesticado" pela legislação corporativa criada nos anos 30.(17)

O governo Vargas, influenciado pela Igreja Católica em tudo que se referia à educação e ao trabalho, começa já em 1930 a montar o Estado Corporativista, pela criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, e logo em seguida aparecem as primeiras leis trabalhistas: a lei dos dois terços, de 1930, que limita o número de estrangeiros que poderiam trabalhar em cada estabelecimento; e a lei sindical, de 1931, que cria o sistema de sindicatos de patrões e empregados coordenados pelo Ministério do Trabalho. Logo a seguir vêm o código de menores e a lei de férias, que colocam limites à exploração do trabalho do menor e garantem o direito a férias remuneradas(18). Os diferentes autores que têm tratado do tema coincidem em que esta legislação foi, em grande parte, copiada da "carta del lavoro" adotada pelo regime fascista italiano, e que ela encontrou grande resistência entre os empresários brasileiros, que viam nesta ação de governo uma interferência indevida em sua liberdade empresarial. Os autores coincidem também em que a legislação trabalhista teve como uma de suas conseqüências terminar com o movimento sindical autônomo que havia se constituído no Brasil nas décadas anteriores. Agora, os sindicatos passavam a ser parte da estrutura corporativa comandada pelo Ministério do Trabalho, e as antigas lideranças, ou aceitavam o novo sistema, ou eram reprimidas ou suprimidas. O próprio Partido Comunista, que havia se organizado nas décadas anteriores como um movimento político de base sindical e operária, se transformou em uma espécie de extrema esquerda do movimento tenentista, liderada pelo Capitão Luís Carlos Prestes.

A organização e "domesticação" do movimento sindical, e o estabelecimento de legislação colocando limites à exploração dos trabalhadores, foram acompanhadas de um terceiro elemento, que foi a criação de um sistema de previdência e proteção ao trabalhador, para situações de doença, acidentes de trabalho e aposentadoria. Celso Barroso Leite, que participou diretamente destes processos, faz menção à Lei Eloy Chaves, de 1923, como a primeira ação governamental brasileira na área da previdência social, criando uma Caixa de Aposentadoria e Pensões para os trabalhadores de empresas ferroviárias (19). Antes dela, existiram muitas associações de ajuda mútua de trabalhadores, organizadas muitas vezes por nacionalidade, mas eram entidades totalmente privadas. Outras caixas foram criadas até o início dos anos 30, quando são formados os Institutos de Aposentadoria e Pensão de diversas categorias - industriários, marítimos, comerciários, bancários, etc.

Com os institutos, os sistemas previdenciários deixam de estar associados a empresas específicas, e passam a estar associados a categorias profissionais. A segunda mudança importante é que o Estado assume a gerência das instituições de previdência, que antes eram geridas pelo setor privado. Com a promulgação de leis de proteção aos trabalhadores, a organização dos sindicatos patronais e de trabalhadores, a fundação dos institutos previdenciários, e a criação da justiça do trabalho, que deveria administrar as relações de classe na sociedade brasileira, fica formada a base do nosso Estado do Bem Estar social, dentro de uma concepção bastante específica, que é a organização corporativa da sociedade brasileira.

Hierarquia, paternalismo e direitos sociais.

Seria possível seguir esta história em detalhe, e ver como o sistema corporativo dos anos trinta e quarenta se desenvolveu e se transformou no sistema previdenciário e de saúde pública do Brasil de hoje. A história mostraria que, apesar de grandes mudanças no escopo e na organização do sistema, suas principais características continuam inalteradas.

As duas principais características deste sistema são a hierarquia e o paternalismo, dois princípios que sempre coexistiram em conflito. A hierarquia era vista, pelos teóricos do corporativismo, como uma característica normal de todas as sociedades, e correspondia à força política e capacidade de organização distintas de diferentes setores sociais. Banqueiros e bancários, industrialistas e industriários, comerciantes e comerciários, governantes e funcionários, cada setor gerava seus recursos e assegurava seu próprio sistema de previdência e benefícios, que eram gerenciados pelo Estado e garantidos pelos princípio legal dos direitos adquiridos. Com o regime democrático que se estabelece no país em 1945, a segmentação do welfare state brasileiro pelos respectivos grupos sociais organizados se acentua, ainda que sem chegar ao extremo, por exemplo, da Argentina peronista, aonde os sindicatos controlavam, diretamente, os recursos da previdência, e se transformaram em grandes centros de poder político e mesmo financeiro.

O princípio igualitário, tal como expresso por Oliveira Vianna, e que surgiria mais tarde na imagem trabalhada de Getúlio Vargas como "pai dos pobres", era o de que o Estado teria a função de cuidar do bem estar da população que permanecia fora do sistema produtivo e da sociedade organizada, que era a mais necessitada, como os pais cuidam dos filhos menores ou as famílias tratam os deficientes, incapazes e os velhos. Uma expressão deste princípio foi a política brasileira para as populações indígenas, corporificado do "Serviço de Proteção aos Índios", que tinha a tutela legal dos povos indígenas, considerados legalmente incapazes e irresponsáveis. Em um regime democrático e aberto, tal como o que se existiu no Brasil entre 1945 e 1964, este princípio era de difícil implementação, pela necessidade de atender às demandas diárias dos setores mais organizados da sociedade. Com a retomada do poder pelos militares em 1964, o grupo de especialistas em questões previdenciárias e trabalhistas, que havia montado o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários nos anos 30, volta a assumir o comando do sistema previdenciário do país, e implanta duas inovações importantes, que são a unificação dos antigos institutos em um sistema único, e a extensão dos benefícios da previdência para a população rural.(20)

O outro lado da moeda do paternalismo, naturalmente, é submissão e a subserviência. Nos anos da guerra fria, o governo militar brasileiro, enquanto que ampliava a cobertura do sistema previdenciário e de assistência social, reprimia com violência as tentativas de organização política no campo e nas cidades, que buscavam respaldo e inspiração, por sua vez, nos ideais e no apoio da revolução cubana e dos setores da Igreja Católica que desenvolviam e propagavam o que ficou conhecido como a "Teologia da Libertação".

Com o fim do governo militar, em 1985, a unificação do sistema previdenciário e sua extensão para o campo não seriam revertidos, mas tampouco seriam ampliados. Na prática, a antiga divisão entre diferentes sistemas previdenciários seria substituída por uma nova, entre os funcionários públicos e os empregados do sistema privado. Enquanto que os benefícios do setor privado se mantinham estagnados, ou eram minados pela inflação, o sistema de benefícios públicos inchava. Nas empresas estatais, fundos de pensão foram estabelecidos, com participação financeira forte do setor público, garantindo aos funcionários benefícios de aposentadoria e atendimento médico inacessíveis para o resto da população. A Constituição de 1988 faz rever o processo de descentralização administrativa dos anos anteriores (promovido por Hélio Beltrão, um antigo quadro do IAPI), trazendo de volta ao setor público funcionários de fundações e autarquias que haviam sido transferidas para fora do sistema público. A Constituição entroniza os direitos especiais dos funcionários públicos, garantindo as altas aposentadorias, as aposentadorias precoces e a estabilidade no emprego, e o sistema judicial, autônomo, garante estes direitos ante tentativas de reduzí-os por parte do poder executivo.

A Constituição de 1988 consagra a noção de que, além dos direitos políticos, os cidadãos brasileiros também tinham direitos sociais, que vão deste o direito ao emprego e à educação até o direito ao atendimento, pelo setor público, de suas necessidades na área da saúde e do seguro social.(21)

Os resultados problemáticos desta legislação extremamente generosa, do ponto de vista econômico e financeiro, já tem sido amplamente debatidos.(22) O que tem sido menos examinado são as conseqüências políticas e ideológicas deste desenvolvimento. Na percepção da maioria da população, os direitos sociais lhes são devidos independentemente da existência ou não de recursos e condições adequadas para satisfazê-los. Por isto, as grandes desigualdades que existem hoje entre diferentes grupos sociais - por exemplo, as aposentadorias generosas dos funcionários públicos, ou a educação superior gratuita para os filhos das classes mais ricas - não são vistos como uma injustiça social, mas como uma limitação que deveria ser superada pela expansão dos direitos já conquistados de uns aos direitos ainda a conquistar dos demais.

Os paradoxos da desigualdade

O paradoxo desta situação é que, enquanto que os especialistas que trabalham com números, dentro e fora do governo, apontam para as grandes iniqüidades na distribuição de benefícios sociais no Brasil, e defendem a necessidade de uma reforma que distribua melhor os recursos existentes e atenda de preferência aos mais necessitados, muitos políticos, e a opinião pública como um todo, não considera este problema como central, preferindo colocar ênfase na necessidade de ampliar os benefícios de poucos para todos. Nesta visão, os recursos públicos seriam ilimitados, mas, mesmo se existem limites, estes limites se explicam pela corrupção, ou pelo atendimento privilegiado a interesses privados, ou internacionais.

Creio que esta visão está associada à maneira pela qual, no Brasil, costuma ser interpretada a questão da formação da sociedade brasileira, e que ilustramos mais acima com a referência à questão da escravidão. Em essência, esta interpretação tende a não ver, ou não tomar em devida conta, a história de exclusão social e marginalidade que sempre existiu no país. Assim, a sociedade brasileira no século XIX era escravocrata, e, a partir do século XX, se transforma em capitalista moderna. Os negros livres, os mulatos dos campos e cidades, vivendo em favelas e mocambos, a população deslocada pela decadência das antigas plantations e pela miséria no campo, todos estes seriam frutos de um capitalismo defeituoso, que não teria se completado, e que por isto não teria permitido a constituição de uma classe de trabalhadores virtuosos, potencialmente imbuídos dos ideiais revolucionários, para os da esquerda, ou das virtudes do trabalho e da perseverança, para os mais conservadores.

Enquanto este "capitalismo defeituoso" não se corrige, o paternalismo, em suas diversas manifestações, aparece como a única alternativa de atendimento às necessidades sociais cada vez mais prementes, ou pelo menos cada vez mais presentes nos meios de comunicação de massas: a distribuição de cestas de alimentos, as campanhas de cobertores e outros bens para o Natal, os apelos ao trabalho voluntário. Mas, em um regime democrático, com os meios de comunicação abertos e livres, e uma Constituição que consagra os direitos sociais, é fácil transformar o paternalismo, que é uma dádiva voluntária e não requerida, de cima para baixo, em demandas articuladas por direitos e benefícios, de baixo para cima, que encontram o apoio fácil de políticos interessados em se manter sintonizados com as demandas populares.

Esta situação se torna especialmente difícil por duas circunstâncias. A primeira é que a percepção crescente da iniquidade do sistema de distribuição de benefícios sociais, e da necessidade de corrigir os desequilíbrios existentes, ocorre em um momento em que as restrições aos gastos públicos e a compressão dos gastos das empresas pressionam no sentido de uma redução global dos gastos sociais, e não, simplesmente, por sua redistribuição. Assim, torna-se difícil separar as proposições de agências internacionais de modificações nos sistemas de distribuição de benefícios, em nome da equidade, pelas demandas destas mesmas agências por ajuste fiscal e contenção de gastos públicos.

A segunda dificuldade, mais grave, é que não há nenhuma certeza de que este "capitalismo defeituoso" possa ser efetivamente consertado e corrigido no futuro previsível. A questão do desemprego estrutural, gerado pelos níveis crescentes de competitividade da economia internacional e pelos avanços da tecnologia, está longe de ser claramente entendida e equacionada, e se torna particularmente grave em países como o Brasil, que têm que confrontar os problemas de modernização e ajuste com uma população pouco educada, e sem experiência prévia de inserção profissional em um mercado de trabalho moderno. Até aqui, todas as propostas que têm surgido no Brasil, tanto por parte do governo quanto da oposição, são no sentido de "consertar" o capitalismo - pela qualificação da mão de obra, pelo aumento do salário mínimo, pela simplificação da legislação trabalhista, e por tantos outros meios. A idéia de que existe uma população imensa, que provavelmente não vai ser integrada de forma satisfatória a uma economia moderna, e cuja situação não pode ser resolvida, simplesmente, pela distribuição de alguns benefícios, ou pela conquista política de outros, ainda não parece ter chegado com a força suficiente.

A explicação talvez seja, simplesmente, de que se trata de um problema sem solução a médio prazo, dado o fracasso (em parte por razões semelhantes) da alternativa socialista. A solução antiga, de classificar os pobres entre dignos e indignos, e dedicar os recursos da proteção social somente aos primeiros (ou, em ideologias simétricas, para os últimos), já não se sustenta, nem política, nem ideologicamente. Assim, o caminho a ser percorrido será longo, e sem soluções e saídas falsas. Ao lado do trabalho permanente de entender melhor e de fato "consertar" o sistema capitalista (sem aceitar a noção fácil e panglossiana de que o mercado é sempre o melhor dos mundos possíveis), é necessário ir abandonando as grandes retóricas e examinar, caso a caso, que opções de política pública maximizam ou não a equidade, e fazem melhor uso dos recursos disponíveis. Parece óbvio, mas ainda estamos longe de começar esta jornada...



Notas

1. Thomas R. Malthus, An essay on the principle of population as it affects the future improvement of society with remarks on the speculations of Mr. Godwin, M. Condorcet and other writers. London: J. Johnson; 1798.

2. Michael B. Katz. The undeserving poor from the war on poverty to the war on welfare. New York: Pantheon Books., 1990, p. 1989, p.11.

3. As "Poor laws" inglesas eram um conjunto de provisões legais estabelecidas na Inglaterra na época da revolução industrial para reduzir os efeitos mais extremos da pobreza. A análise das polêmicas relativas a estas leis, no contexto do capitalismo "selvagem" daqueles anos, é feita por Karl Polanyi, em A grande transformação - as origens da nossa época. (Rio de Janeiro: Campus; 1980.) Roberto daMatta, em um texto recente, reconstrói um pouco da história das idéias da pobreza na Europa e no mundo ibérico. Cf. Roberto DaMatta, e Christopher Dunn, On the Brazilian urban poor an anthropological report. Notre Dame, Indiana: University of Notre Dame, Helen Kellogg Institute for International Studies; 1995. 60 p (Democracy and social policy series; working paper #10).

4. Extraído do Manifesto Comunista de Karl Marx e F. Engels.

5. Veja por exemplo Gilberto Freyre, Os Escravos nos Anúncios dos jornais brasileiros no século XIX, São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1979. Para uma discussão mais recente, ver Anthony W. Marx, Making Race and Nation: A Comparison of the United States, South Africa, and Brazil, Cambridge University Press, 1998; e o comentário crítico de George M. Fredrickson, "The Strange Death of Segregation", New York Review of Books, 6 de maio, 1999. A referência clássica para esta discussão é Frank Tannembaum, Slave and citizen, the Negro in the Americas, New York, A. A. Knopf, 1947

6. Veja por exemplo Herbert S Klein, Slavery in the America: a comparative study of Virginia and Cuba. London, Oxford Universithy Press 1967.

7. Jacob Gorender, O escravismo colonial, São Paulo, Ed. Ática, 1980 (3ª Edição)

8. Maria Sylvia de Carvalho Franco, Homens livres na sociedade escravocrata, São Paulo, Instituto de Estudos Brasileiros, Universidade de São Paulo, 1969; e Kátia M. de Queirós Mattoso, Ser Escravo no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1982. Para uma defesa da interpretação marxista ortodoxa, Jacob Gorender, A Escravidão Reabilitada, São Paulo, Editora Ática, 1990.

9. Kátia M. de Queirós Mattoso. Bahia, século XIX uma província no Império. Rio de Janeiro, RJ: Editora Nova Fronteira. 1992.

10. Sobre a escravidão em Minas Gerais, veja Roberto Martins e Amílcar Martins Filho, "Slavery in a nonexport economy - nineteenth century Minas Gerais revisited," Hispanic American Historical Review, 63, 3, 537 - 568.

11. Alberto Passos Guimarães. As classes perigosas - banditismo rural e urbano. Rio de Janeiro, RJ: Graal; 1982, p. 139. A fonte original parece ser Joaquim Floriano de Godoy. A Província de S. Paulo trabalho, estatístico, histórico e noticioso. 2. ed., facsimilada ed. São Paulo: Governo do Estado de São Paulo; 1978.

12. Luis Pereira, no entanto, considera a autora como "weberiana". Cf. Luis Pereira, Classe Operária, Situação e Reprodução, São Paulo, Duas Cidades, 1978.

13. op. cit., p. 231.

14. Para uma a discussão sobre as duas vertentes do movimento republicano, cf. Simon Schwartzman, Bases do Autoritarismo Brasileiro, Rio de Janeiro, ed. Campus, 1981.

15. Sobre as ideologías modernizadoras das elites intelectuais brasileiras, ver S. Schwartzman, "A força do novo: por uma sociologia dos conhecimentos modernos no Brasil", em A Redescoberta da Cultura, S. Paulo, EDUSP, 1997.A literatura sobre as propostas e teorias de natureza racista e eugênica no Brasil é bastante ampla. Ver, por exemplo, Thomas E. Skidmore Black into white race and nationality in Brazilian thought: with a preface to the 1993 edition and bibliography. Durham: Duke University Press. 1993; Nancy Stepan, The hour of eugenics: race, gender, and nation in Latin America, Ithaca : Cornell University Press, 199; Vera Regina Beltrão Marques. A medicalização da raça : médicos, educadores e discurso eugênico, Campinas, Editora da Unicamp, 1994.

16. Oliveira Vianna, As Novas Diretrizes da Política Social, conferência pronunciada na Escola de Serviço Social em 20 de agosto de 1939. Rio de Janeiro, Serviço de Estatística da Previdência e Trabalho, Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, 1939.

17. A literatura sobre as origens e evolução do sindicalismo brasileiro é muito extensa. Veja, entre outros, Azis Simão, Sindicato e Estado - suas relações na formação do proletariado de São Paulo. São Paulo: Dominus; 1966; Edgard Carone, Movimento operário no Brasil. São Paulo: DIFEL; 3 v, 1979-1984; Sheldon L. Maram, Anarquistas, imigrantes e o movimento operário brasileiro, 1890-1920, Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1979, (Coleção Estudos brasileiros ; v. 34); Edgar Rodrigues, Socialismo e Sindicalismo no Brasil -1875-1913, Rio, Laemert, 1969; e Edgar Rodrigues, Os anarquistas : trabalhadores italianos no Brasil, São Paulo, Global Editora, 1984; Heloisa Helena Teixeira de Souza Martins, O estado e a burocratização do sindicato no Brasil. São Paulo: Editora Hucitec. 1979; Barbara Weinstein. For social peace in Brazil - industrialists and the remaking of the working class in São Paulo, 1920-1964. Chapel Hill: University of North Carolina Press. 1996; e, Kenneth Paul Erickson. Sindicalismo no processo politico no Brasil. São Paulo, Brasil: Brasiliense. 1979. Sobre as origens do Partido Comunista no Brasil, Ronald H. Chilcote, The Brazilian Communist Party: conflict and integration 1922-1972, New York, Oxford University Press, 1974.

18. Warren Warren. A industrialização de São Paulo, 1880-1945. São Paulo: Difusão Européia do Livro, Editora da Universidade de S. Paulo; 1971. Angela Maria de Castro Gomes. Burguesia e trabalho: política e legislação social no Brasil, 1917-1937. Rio de Janeiro: Editora Campus. 1979. Ver também Zélia Lopes da Silva, A domesticação dos trabalhadores nos anos 30. São Paulo, SP: Editora Marco Zero e MCT-CNPq, 1990, para um histórico destas leis e da forma pela qual foram recebidas pelos empresários e pelas organizações dos trabalhadores.

19. Celso Barroso Leite, Um século de Previdência Social - balanço e perspectivas no Brasil e no mundo, Rio de Janeiro, Zahar, 1983; Clóvis de Faro e Hélio O. Portocarrero de Castro. 1993. Previdência social no Brasil diagnósticos e sugestões de reforma. Rio de Janeiro, RJ, Brasil: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1993. Para uma visão abrangente do desenvolvimento do sistema previdenciário brasileiro, ver Amélia Cohn, Previdência Social e Processo Politico no Brasil, São Paulo, ed. Moderna, 1980.

20. Esta história é narrada em detalhe por James Malloy, em The Politics of Social Security in Brazil, University of Pittsburgh Press, 1979. A lista dos "tecnocratas do IAPI" que participou dos governos militares brasileiros, após 1964, inclui João Paulo dos Reis Velloso, Hélio Beltrão, Celso Barroso Leite, e inúmeros assessores do Ministério da Previdência, e Luis Gonzaga do Nascimento Silva, Ministro do Trabalho a partir de julho de 1966, e mais tarde Ministro da Previdência e Assistência social, ele também ligado ao grupo de antigos técnicos do IAPI (Malloy, pp. 126-130).

21. O artigo 7 da Constituição lista 34 direitos, entre os quais: I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho; VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei; XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; VII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XXIV - aposentadoria; XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas; XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei; XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos. O artigo 194 assegura "os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social", baseados na "universalidade da cobertura e do atendimento".

22. Veja por exemplo José Pastore, Encargos sociais implicações para o salário, emprego e competitividade. São Paulo: Editora LTr, 1997; e André Cezar Médici, A Economia Política das Reformas em Saúde. Porto Alegre: Instituto de Administração Hospitalar e Ciências da Saúde. 1997. <